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A empresa pode impedir que empregados divulguem seus candidatos nas redes?

Em ano eleitoral, as redes sociais ficam bastante ativas, e liberdade de expressão, eleições, doações a partidos e contrato de trabalho são temas de debate fundamentais

O limite de todos, empregados ou não, decorre da lei. (AFP/AFP)

O limite de todos, empregados ou não, decorre da lei. (AFP/AFP)

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Publicado em 22 de maio de 2022 às 12h33.

Por Cibelle Linero e Anna Carolina Malta Spilborghs*

A liberdade de expressão e pensamento, como direito fundamental, garantido constitucionalmente, inclui a liberdade de opinião, convicção, comentário, julgamento, avaliações, crenças, conhecimento, sentimento, críticas, juízos, concepções de mundo. A exteriorização dos pensamentos pode ocorrer das mais diversas formas, o que inclui, atualmente, as redes sociais, sejam elas de conotação mais pessoal, como o Facebook, Instagram, TikTok, Twitter como aquelas tidas como profissionais, como o Linkedin, além dos sistemas de comunicação online como o Whatsapp, WeChat e outros.

Nas relações profissionais, a liberdade de expressão também deve ser tutelada, não cabendo ao empregador restringir o direito de seus empregados. Assim, o teor de quaisquer publicações em redes sociais, como regra, não atrai qualquer direito ao empregador de interferir ou de tolher a liberdade do empregado. Exceção à regra pode ser verificada se o empregado valer-se do seu direito de expressão para cometer atos ilícitos, bem como na hipótese de o empregado, por meio de suas publicações, ferir a imagem e a honra do empregador. Nesse caso, haverá quebra de confiança, a qual pode, inclusive, levar à rescisão do contrato de trabalho.

Além das hipóteses acima, pode o empregador impor restrições aos empregados quando estes falam em nome da empresa de forma desautorizada. Isto porque, faz parte do poder diretivo do empregador determinar quem tem poderes de representação e quem tem legitimidade para falar em nome da empresa. Assim, claramente cabe ao empregador determinar, por exemplo, qual o conteúdo de sua rede social corporativa, quem pode dar entrevistas e/ou prestar quaisquer esclarecimentos a terceiros (órgãos públicos, autoridades, imprensa, etc) sobre qualquer tema.

Nessa linha, se um empregado expõe qualquer opinião, coincidente ou não com os valores de seu empregador, e vincula tal opinião à empresa , sem autorização prévia para tanto, ele acaba por legitimar medidas de restrição de sua liberdade, com a exigência, por exemplo, de que determinada manifestação seja retirada ou seja desvinculado o nome da empresa.

Em ano eleitoral é sabido que as redes sociais ficam bastante ativas com opiniões, críticas, manifestações e campanhas para um ou outro candidato. Formas mais contundentes ou até agressivas de exteriorizar opiniões não apenas sobre os candidatos como também sobre seus eleitores transformam as páginas de redes sociais em verdadeiros ringues, nem sempre tão respeitosos com a opinião alheia. Isso sem falar nos comentários pautados em notícias falsas, os quais acontecem tanto por má fé de quem divulga a notícia como por descuido ou desconhecimento daquele que a repassa sem confirmar a veracidade do seu conteúdo.

Pode o empregador impedir que seus empregados se manifestem livremente sobre suas convicções políticas ou divulguem seus candidatos nas próximas eleições em suas redes sociais? Há empregados que, dada a função que ocupam, representam a imagem da empresa e, portanto, têm seus comentários vinculados à imagem da empresa, ainda que não o façam de forma expressa? São válidas as cláusulas contratuais ou normas internas que limitam o direito de expressão dos empregados no tocante a questoes políticas e partidárias? Pode o empregador proibir um empregado ou um membro de sua administração de fazer doações a partidos políticos? Pode uma empresa restringir o direito de um empregado ou membro de sua administração de se candidatarem?

A verdade é que o limite de todos, empregados ou não, decorre da lei, ou seja, a liberdade de expressão não é ilimitada e cabe restrição sempre que violar direitos (por exemplo, quando constituir crime de injúria, calúnia ou difamação, quando violar confidencialidade de informações). Considerando que manifestar publicamente preferências partidárias, a rigor, não viola qualquer direito, as manifestações sobre questões políticas partidárias dos empregados, especialmente daqueles que não representam a empresa, não impactam o empregador e este não pode restringir o direito de expressão de seus empregados.

O limite da ingerência do empregador, portanto, consiste em instituir normas internas requerendo que os empregados não vinculem suas opiniões pessoais (de qualquer natureza e lícitas) e suas posições políticas partidárias à empresa, sem prévia e expressa autorização para tanto.

Por outro lado, o tema permite que um tratamento diferenciado seja dado as manifestações políticas feitas por membros da administração, considerando que estes — ao contrário dos demais empregados — representam a imagem da empresa. Muitas vezes, essas pessoas têm suas imagens vinculadas à imagem da empresa na qual participa de tomadas de decisão. Assim, nesses casos, desde que a restrição seja clara e divulgada previamente, será possível solicitar que os membros da administração não manifestem publicamente suas convicções políticas.

Esse pedido também pode ser feito com relação às doações para políticos — considerando que as pessoas jurídicas não mais podem fazer doações para partidos e candidatos e a doação feita por quem as representa pode levar a uma confusão de percepção da inclinação política da empresa. No entanto, tal restrição não se justifica para os demais empregados, não representantes da empresa, não podendo o empregador sequer pretender ter conhecimento de tal fato.

*Cibelle Linero e Anna Carolina Malta Spilborghs são, respectivamente, sócia da área Trabalhista e da área de Compliance, Investigação & Direito Sancionador do

BMA Advogados.

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