Justiça de São Paulo: "o dano em questão é aquele que atingiu a esfera íntima da autora e seu falecido marido, seu sofrimento, sua humilhação" (Oxford/Getty Images)
Estadão Conteúdo
Publicado em 10 de novembro de 2020 às 15h36.
Em agosto de 1972, o ferramenteiro Antonio Torini, então funcionário da Volkswagen, foi preso na sede da montadora e levado ao Departamento de Ordem Pública e Social (DOPS) de São Paulo, onde passou 49 dias sob tortura. Dois anos depois, ao ser julgado pelo Superior Tribunal Militar (STM), acabou condenado a mais dois anos de detenção. Sua mulher, Livonete, ficou sozinha com os filhos. Após cumprir a pena, Torini foi libertado, mas estaria condenado ao desemprego permanente. Isso porque passou a constar nas "listas sujas" trocadas pela Volkswagen com empregadores. O ferramenteiro morreu em 1998 com problemas de saúde.
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Na última quarta-feira, dia 4, a Justiça de São Paulo decidiu que a União deve pagar uma indenização de R$ 150 mil aos Torini. A decisão do juiz José Denilson Branco, da 3ª Vara Federal de Santo André, atende a um pedido da viúva. Na sentença, o juiz considerou que a União deve ser responsabilizada pelo dano moral extrapatrimonial causado à família por agentes públicos no exercício da função e em nome do Estado. A Comissão de Anistia já havia se manifestado favorável ao pagamento em resposta a um requerimento apresentado pelo próprio Antonio antes de sua morte.
"O dano em questão é aquele que atingiu a esfera íntima da autora e seu falecido marido, seu sofrimento, sua humilhação", escreveu o magistrado. Em sua decisão, o juiz rejeitou o argumento apresentado pela União de que, após quase quatro décadas, o processo estaria prescrito. Para Branco, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça indica que o direito de postular indenização no caso é imprescritível.
"O dever do Estado indenizar objetivamente surge apenas com a prova do fato ensejador do dano, qual seja, a prisão por determinado período, por motivação política, onde o próprio Estado já reconheceu que tais prisões foram realizadas mediante arbítrio e tortura. Decorrente disto, o abalo moral é inquestionável, visto que Antonio teve sua dignidade humana violada por meios nefastos e arbitrários, qual seja, prisão, tortura e perseguição por motivações políticas, além de ter sido demitido e experimentado desemprego permanente após 1974, tudo por conta da perseguição política", diz um trecho da sentença.