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Vitória de Biden pressiona Bolsonaro a encarar nova realidade

Com seu principal aliado prestes a deixar a Casa Branca, Bolsonaro terá que decidir até onde está disposto a seguir na contramão de grande parte do mundo

 (Ueslei Marcelino/Reuters)

(Ueslei Marcelino/Reuters)

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Bloomberg

Publicado em 16 de dezembro de 2020 às 14h21.

O presidente Jair Bolsonaro passou dois anos ignorando críticas à sua política ambiental, desdenhando de cientistas do clima e minimizando queimadas na Amazônia.

Mas com seu principal aliado internacional prestes a deixar a Casa Branca, Bolsonaro terá que decidir até onde está disposto a seguir na contramão de uma grande parte do mundo em matéria de meio ambiente.

As opiniões polêmicas de Bolsonaro sobre clima e seu fervor por Donald Trump preocupam cada vez mais até mesmo membros do governo brasileiro devido aos danos de longo prazo, segundo duas pessoas com conhecimento direto do assunto. Na terça-feira, Bolsonaro foi um dos últimos líderes mundiais a parabenizar o presidente eleito dos EUA, Joe Biden, e isso ocorreu somente após sua vitória ser confirmada pelo Colégio Eleitoral.

Deborah Vieitas, CEO da Amcham Brasil, se disse preocupada com a possibilidade de o Brasil acabar sem “nenhuma agenda substancial com os EUA” caso Bolsonaro não adote certo pragmatismo para administrar sua relação com a Casa Branca sob Biden. Sem estímulo para manter contatos regulares entre autoridades e a comunidade empresarial, pode haver impacto no comércio e nos investimentos, afirma Vieitas.

Deixar a Amazônia aberta para negócios tem sido uma bandeira de Bolsonaro, que vê a floresta como um ativo a serviço dos interesses soberanos do Brasil. No entanto, seus esforços para flexibilizar as restrições ambientais provocaram críticas de investidores, ameaçando acordos comerciais que são necessários para impulsionar as exportações de commodities e manufaturados após a Covid-19. A economia brasileira se recupera lentamente da pandemia: o PIB deve crescer 3,5% no próximo ano, após queda estimada de 4,4% em 2020.

Vieitas, a CEO da Amcham Brasil, diz que Brasil e EUA ainda precisam resolver questões comerciais pendentes sobre aço, alumínio, etanol e açúcar. Apesar de Bolsonaro emular Trump - ao minimizar a pandemia de coronavírus, por exemplo -, o presidente brasileiro obteve poucas conquistas concretas ao se aliar aos EUA em seus dois anos no poder.

Agora, de acordo com duas pessoas a par dos planos do presidente eleito dos EUA, o governo Biden colocará duas questões que Bolsonaro frequentemente minimiza no topo da agenda Brasil-EUA: mudança climática e direitos humanos.

Nova realidade

Até agora, Bolsonaro não deu nenhuma indicação de que está disposto a se ajustar às novas circunstâncias.

“Bolsonaro tinha certo grau de proteção enquanto Trump fazia a mesma coisa, mas o novo governo será diferente”, disse em relação à política ambiental do Brasil Thomas Shannon, ex-embaixador dos Estados Unidos em Brasília e consultor político do escritório de advocacia Arnold & Porter Kaye Scholer, com sede em Washington. “Bolsonaro estará exposto, e este é um momento para a sociedade brasileira se manifestar.”

Após a posse de Biden, em 20 de janeiro, o Brasil enfrentará uma frente mais forte e organizada em favor do meio ambiente, já que os EUA provavelmente se unirão à Europa para pressionar Bolsonaro. No início do ano, a Alemanha disse que a destruição da Amazônia põe em xeque o acordo comercial fechado em 2019 entre a União Europeia e o Mercosul.

“Os países que não abordarem a mudança climática terão menos capacidade de vender seus produtos no exterior”, disse Sherri Goodman, secretária-geral do Conselho Militar Internacional sobre Clima e Segurança, que publicou relatório no mês passado recomendando que o Brasil passe a valorizar políticas contra a mudança climática.

Em debate em setembro, Biden disse que seu governo voltaria a aderir ao Acordo de Paris e convocaria países ricos para proteger a Amazônia como parte de um esforço maior de combate à mudança climática. O democrata ameaçou o governo brasileiro com “consequências econômicas significativas” caso medidas não sejam tomadas. Bolsonaro rebateu a fala, disse que o Brasil defenderá sua soberania.

Daniel Tenengauzer, responsável de estratégia de mercado no Bank of New York Mellon, disse que a ameaça de Biden provavelmente foi apenas retórica de campanha, mas prevê uma relação tensa, mesmo sem um sério risco de sanções econômicas.

“Perseguir o Brasil com sanções seria extremo”, disse. “Você quer trazer o establishment para o Brasil e tentar tirar o foco de Bolsonaro. Não quer dar a impressão de que está se intrometendo demais.”

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