Brasil

Vacinação retrocede no Brasil, antes considerado referência mundial

Médicos, governantes e até Unicef, alertaram para o colapso das taxas de imunização no país, onde a cobertura vacinal geral caiu de 95% em 2015 para 68% no ano passado, segundo dados oficiais

Vacinação: Brasil era referência mundial no assunto.  (Louis GENOT, Joshua Howat BERGER/AFP)

Vacinação: Brasil era referência mundial no assunto. (Louis GENOT, Joshua Howat BERGER/AFP)

Publicado em 10 de julho de 2023 às 10h08.

O Brasil emergiu da pandemia de covid-19 graças a uma bem-sucedida campanha de vacinação em massa. Mas dois anos depois se depara com um paradoxo: as taxas de imunização - e não apenas para a covid - despencaram, expondo milhões de pessoas a doenças que já haviam sido erradicadas.

Médicos, governantes e até o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), alertaram para o colapso das taxas de imunização no Brasil, onde a cobertura vacinal geral caiu de 95% em 2015 para 68% no ano passado, segundo dados oficiais.

Para a poliomielite, por exemplo, o número caiu de 85% para 68%, alertando para um possível ressurgimento da doença no país, que a erradicou em 1989. Os números são semelhantes para outras vacinas.

O sarampo, eliminado oficialmente do país em 2016, voltou dois anos depois. Também há temores de que a difteria esteja ressurgindo.

Especialistas dizem que a relutância em se vacinar é um problema crescente em todo o mundo, mas a situação é particularmente preocupante no Brasil, um país que até recentemente era aclamado como líder em vacinação.

"É muito triste observar um país que sempre teve excelência nos programas de vacinação e sempre foi um exemplo para o mundo de repente sofre um movimento antivacina", disse à AFP Natalia Pasternak, diretora do Instituto Questão de Ciência (IQC), um grupo de especialistas em políticas públicas.

A especialista lamentou "ver como 50 anos de trabalho podem ser tão facilmente destruídos em três".

História de sucesso destruída

A pandemia demonstrou a importância do sistema de saúde pública universal brasileiro, que, embora enfrente dificuldades, recebe muitos elogios.

Em 2020, foram registradas algumas das imagens mais duras da crise sanitária: valas comuns e corpos amontoados em caminhões refrigerados em lugares como Manaus, onde hospitais ficaram sem oxigênio.

No ano seguinte, surgiram imagens de esperança, como profissionais de saúde transformando o sambódromo do Rio de Janeiro em centro de imunização, ou embarcando na floresta amazônica para entregar vacinas aos povos indígenas.

Especialistas acreditam que a campanha ajudou a evitar uma tragédia muito maior no Brasil, onde mais de 700 mil pessoas já morreram de covid-19, número atrás apenas dos Estados Unidos.

Apesar de um certo atraso no início da campanha, no início de 2022 o Brasil havia vacinado 93% dos adultos contra a covid-19.

Depois, as taxas caíram, não apenas para essas vacinas, mas para todo o resto.

"Infodemia"

Segundo especialistas, vários fatores causam esse declínio: dificuldade em ficar em dia com as vacinas atrasadas durante a pandemia, falta de acesso a atendimento médico e menor conscientização sobre os perigos de doenças que afetavam a população no passado.

Mas há um novo elemento que agrava o cenário: uma mistura tóxica de política, polarização e desinformação que estourou durante a pandemia e se espalhou pelo mundo.

"As famílias estão sendo atacadas por desinformação e mentiras. Não é uma pessoa que postou uma besteira, uma fake news, é tudo muito estruturado", disse Isabella Ballalai, da Associação Brasileira de Imunizações.

"As consequências dessa 'infodemia' serão piores do que a própria pandemia de covid-19", alertou.

A ministra da Saúde, Nísia Trindade, afirmou que o governo está avaliando como punir os médicos que disseminam desinformação contra as vacinas.

"Fake news criminosas geram um ambiente de dúvida e contribuem para essa falta de adesão à vacinação", disse à AFP.

Influências locais

Em pesquisa recente, a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e o IQC constataram que, segundo os médicos, o medo dos efeitos colaterais e a desconfiança das vacinas são os principais motivos pelos quais os pais não vacinam os filhos.

Pasternak, cuja organização trabalha para produzir informações confiáveis para combater a enxurrada de desinformação, propõe convencer a população ao trabalhar com "líderes locais".

"As pessoas ouvem aqueles em quem confiam: pastores, líderes da comunidade", disse.

Mas inverter a tendência não será fácil, admitiu. "Temos muito trabalho a fazer".

(Da redação com AFP)

Acompanhe tudo sobre:Vacinas

Mais de Brasil

Após 99, Uber volta a oferecer serviço de mototáxi em SP

Após prever reforma ministerial até dia 21, Rui Costa diz que Lula ainda começará conversas

Fuvest antecipa divulgação da lista de aprovados na 1ª chamada do vestibular para esta quarta

Governo Lula se preocupa com o tom usado por Trump, mas adota cautela e aguarda ações práticas