Mariana: não bastasse o aumento repentino do desemprego, a população também enfrenta hotéis cada vez mais vazios, o comércio de portas fechadas e os restaurantes às moscas (Ricardo Moraes / Reuters)
Da Redação
Publicado em 1 de fevereiro de 2016 às 11h29.
Mariana - A lama da Samarco que, no dia 5 de novembro passado, arrasou o distrito de Bento Rodrigues, em Minas, não passou nem perto de Mariana, mas levou para longe da cidade histórica os turistas e, com eles, o dinheiro.
Não bastasse o aumento repentino do desemprego, a população também enfrenta hotéis cada vez mais vazios, o comércio de portas fechadas e os restaurantes às moscas.
Os rejeitos de minério que vazaram da Barragem de Fundão passaram a cerca de 20 km do centro histórico. Embora faça parte do município, o distrito ficava em uma área rural isolada.
Por ter sido construída em um planalto, Mariana é considerada segura pela Defesa Civil mesmo que as outras duas barragens, de Germano e de Santarém, se rompam.
A uma semana do carnaval, no entanto, enquanto faltam vagas nos hotéis da vizinha Ouro Preto, sobram quartos em Mariana. Até agora, o Providência, o maior da cidade, só conseguiu reservas para um terço dos leitos disponíveis, e a previsão é pouco otimista. "Nesse período, no ano passado, já estávamos lotados. A essa altura, todo mundo sabe onde vai pular o carnaval, e não vai ser em Mariana", disse o recepcionista Sidney Martins.
Desde que a barragem ruiu, a caixa de e-mail do hotel de Tane Oliveira enche de mensagens com cancelamento de reservas ou perguntas de turistas inseguros sobre a real situação de Mariana.
"As igrejas também foram interditadas?", questiona uma das mensagens. "Tem como chegar na cidade? Tem água para beber?", pergunta outra. De acordo com ela, o que ajudou a segurar as contas no fim do ano foram as diárias pagas pela Samarco em vários hotéis para hospedar os mais de 600 desabrigados por um mês.
Movimento fraco
Se o setor hoteleiro conseguiu tirar algum proveito do problema, o comércio não vê o momento com o mesmo otimismo. O restaurante de Celso Neves, voltado para os turistas, mas que também costumava receber moradores, viu a receita cair 70% nos últimos três meses.
"Os turistas sumiram, e o pessoal que trabalha na Samarco, e que agora não sabe se vai ou não ser demitido, também não aparece mais."
O empresário adotou medidas para economizar nas contas, mas, se o movimento continuar fraco por mais três meses, as demissões no restaurante serão inevitáveis.
Como mostrou o jornal O Estado de S. Paulo nesse domingo, 31, o desemprego na cidade aumentou dez vezes desde novembro. Girlei Rita, dona de uma loja de artesanato, não teve escolha e mandou embora duas funcionárias em dezembro. "Morador não compra artesanato. Minha renda vem toda dos turistas. Se eles não vêm, eu não vendo", diz.
Apesar da tragédia, a prefeitura do município espera que os turistas de Ouro Preto se interessem também por Mariana e visitem cidade no carnaval. Mesmo com os cofres desfalcados por causa da interrupção dos trabalhos de extração da Samarco, a cidade prevê festa com blocos e desfiles durante todo o feriado.
Os atrativos históricos, porém, deixam a desejar. A Igreja de São Francisco de Assis, do século 18, um dos principais cartões-postais de Minas que guarda obras de Aleijadinho, está interditada desde 2012 por risco de desabar. As obras para a recuperação do monumento ainda nem começaram.
Para os empresários da cidade ouvidos pela reportagem, se Mariana não investir no turismo poderá não superar a crise em que se encontra. "Isso aconteceu antes", lembra Neves. Em 1960, a cidade viu quase um terço dos moradores migrar para Brasília depois do fechamento de uma grande fábrica de tecidos. "Se essa dependência do minério não acabar, Mariana pode voltar a ficar abandonada."