Taças e talheres: a corte, contudo, não comentou a repetição da maior parte dos itens que aparecem nos dos editais de 2013 e 2014 (kapulya/Thinkstock)
Da Redação
Publicado em 19 de novembro de 2015 às 12h21.
São Paulo - Antes de pedir salmão e filé mignon para os lanches de juízes e desembargadores, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais destinou R$ 277,1 mil no ano passado, que corrigidos pela inflação chegam a R$ 304,6 mil, para comprar utensílios de cozinha e copa como pratos de sobremesa, talheres, xícaras de porcelana, garrafas térmicas, copos e até taças para oito edifícios do Judiciário mineiro, além dos sete Juizados especiais, em Belo Horizonte.
O valor é maior que a soma do gasto pelas duas gestões anteriores (2010-2012 e 2013-2014) com os mesmos tipos de utensílios, reajustando todos os preços pela inflação, e foi licitado três meses após a posse da atual gestão, em junho de 2014, e quase um ano antes da licitação de 2015 que previa salmão e filé mignon para o lanche dos magistrados mineiros, cancelada após o jornal O Estado de S.Paulo revelar a polêmica.
Questionado, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais afirma que está fazendo uma substituição gradativa dos produtos não descartáveis e que não se pode comparar valores homologados de anos anteriores, em virtude das diferenças dos itens licitados e especificidades de cada edital.
A corte, contudo, não comentou a repetição da maior parte dos itens que aparecem nos dos editais de 2013 e 2014.
Somente com garrafas térmicas - um total de 2.220 de diferentes tipos e tamanhos - a Corte mineira, presidida pelo desembargador Pedro Bitencourt, gastou no ano passado R$ 149 mil, que corrigidos pela inflação equivaleriam hoje a R$ 163 mil.
O valor é maior que toda a licitação para utensílios de cozinha de 2013, que saiu por R$ 134,9 mil corrigidos pela inflação atual.
Além disso, é a primeira vez desde 2008, considerando todos os editais disponibilizados na página do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (que só disponibiliza os documentos até 2008), que o edital prevê o uso de "tintas importadas específicas para porcelana, vidro e cristal", para pintar o brasão da corte mineira em alguns utensílios.
A tintura importada nas cores "verde bandeira, preto, vermelho, azul claro, marrom, cinza, dourado e rosa bebê" foi aplicada nos 2,2 mil copos de vidro, 350 taças de cristal, 1,8 mil xícaras de porcelana para café, com pires, e 168 xícaras de porcelana para chá, com pires, solicitados em 2014.
Questionado se há uma previsão legal que demande a identificação dos utensílios, a assessoria de imprensa do TJMG informou, por meio de nota, que a iniciativa "é comum" nos três Poderes da União e que visa "preservar o patrimônio público, vinculando-o à instituição", afirma o texto.
A corte, contudo, não respondeu por que a pintura do brasão não estava prevista nos editais anteriores.
Repetidos
De 2008 até este ano ocorreram um total de cinco licitações do tipo para equipar as cozinhas do Judiciário mineiro em Belo Horizonte.
Em 2013, último ano da gestão anterior, foram gastos um total de R$ 134,9 mil para a compra de 48 itens, desde talheres, bandejas e assadeiras, até geladeira, forno micro-ondas e sanduicheira.
Na licitação do ano passado, foram adquiridos um total de 46 itens, número menor que o comprado na gestão anterior, mas que custou aos cofres públicos R$ 304,6 mil corrigidos pela inflação.
Somente o lote de xícaras e copos com o brasão do TJMG saiu por R$ 77,8 mil, em valores corrigidos, ante R$ 44,7 mil.
Os números surpreenderam os próprios servidores do TJMG, que questionam o fato de terem sido licitados em 2014 itens que já existiam nas cozinhas da corte mineira e, em tese, não precisariam ser substituídos.
Mesmo tendo adquirido 1,5 mil xícaras para café, com pires, 600 para chá, com pires, 1,8 mil taças de vidro liso, 350 copos de vidro, 100 jarras para água e 750 pratos de sobremesa, em 2013, no ano passado o Tribunal licitou mais 2,2 mil copos longos de vidro, 350 copos de cristal, 70 jarras para água, 260 pratos de sobremesa, 1,8 mil xícaras para café de porcelana, com pires, e 168 xícaras de porcelana para chá, com pires.
Questionado sobre a aquisição dos itens semelhantes aos do ano passado, a corte mineira informou que "a utilização de utensílios não recicláveis se deu em função da substituição gradativa dos produtos descartáveis, o que contribui para redução de resíduos, que gera diversos impactos ao meio ambiente".
Em nota, o Sindicato de Servidores da Justiça de 2ª Instância de Minas Gerais (SINJUS-MG) repudiou "quaisquer uso indevido do dinheiro público, seja em licitações para aquisição de materiais que ainda se encontram em bom estado ou de materiais luxuosos para a alta cúpula do Órgão", afirma o texto.
Como a licitação abrange apenas edifícios da capital mineira, os 906 juízes de primeira instância que atuam no interior do Estado não são contemplados com os utensílios.
Para 2015, a corte mineira não realizou nenhuma licitação do tipo. Os cálculos utilizados nesta matéria consideram a inflação pelo índice IPC-A de outubro de 2015, medido pelo IBGE.
TJMG
"A estrutura do Tribunal em Belo Horizonte abrange 41 edificações, com mais de 10.500 pessoas, considerando magistrados, servidores, estagiários, terceirizados e trabalhadores mirins, sem levar em conta o público externo.
A utilização de utensílios não recicláveis se deu em função da substituição gradativa dos produtos descartáveis, o que contribui para redução de resíduos, que gera diversos impactos ao meio ambiente.
É comum nos três Poderes do Estado, como também no Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça, entre outros, a identificação da instituição (brasão) no material de uso permanente. A medida visa preservar o patrimônio público, vinculando-o à instituição.
A utilização de tinta importada para a gravação do brasão identificador do TJMG nos utensílios se deu em virtude de análises técnicas, que levaram em consideração, além da faixa de temperatura ideal com queimas de teste, a existência de algumas cores que exigem mais atenção devido à saturação de pigmentos ou a tendência destas em desbotarem.
O desenvolvimento do trabalho do brasão no utensílio já está incorporado ao seu preço final, como se pode observar no Anexo I ao edital nº. 119/2014, para o lote 2, subitens 2.1, 2.2, 2.5 e 2.6.
Análises comparativas sobre a evolução de demanda a partir dos editais de 2010 a 2014 cujo objeto foi a aquisição de equipamentos e utensílios para copa e cozinha não podem se ater, exclusivamente, aos valores homologados, em virtude da grande diversidade, especificidade e quantitativos dos itens licitados em cada certame, o que pode ser verificado em cada Anexo I dos respectivos editais.
O lote 5 do edital 2014 foi homologado como frustrado e disponibilizado no DJe no dia 19/12/2014 (considerado como publicado no dia 07/01/2015, devido ao recesso de final de ano). Estes itens não vieram a ser licitados posteriormente.
O Tribunal já acionou o Banco do Brasil, órgão responsável pelo site http://www.licitacoes-e.com.br utilizado pelo TJMG, para a realização dos seus pregões eletrônicos, visando a implantação de melhorias no sistema de busca de editais antigos. Em virtude das dificuldades apresentadas, o editais seguem anexados".
SINJUS-MG
"O SINJUS-MG informa que repudia quaisquer uso indevido do dinheiro público, seja em licitações para aquisição de materiais que ainda se encontram em bom estado ou de materiais luxuosos para a alta cúpula do Órgão.
Especificamente sobre a substituição de copos comuns por taças de cristal informa que é impossível compreender a justificativa do TJMG.
A denúncia que o Estadão traz a conhecimento público desperta no Sindicato a necessidade de se profissionalizar ainda mais para fiscalizar tais ações.
Nos faz ainda questionar o argumento de crise apresentado o ano inteiro de 2015 pelo Tribunal mineiro para descumprir direitos previstos em lei para os servidores, como a reposição inflacionária que deveria ter sido paga em maio deste ano.
Mas é importante lembrar que este é também papel da população e que, voltamos a afirmar, enquanto não houver eleições diretas também para o Poder Judiciário, a fiscalização e cobrança junto a esses gestores fica fragilizada, pois não foram eleitos pelo povo. Diretas já no Judiciário! Essa é uma luta de todos os brasileiros."