Michel Temer com Dilma Rousseff ao fundo: ele já está treinando discurso de vitória (Marcelo Camargo/Agência Brasil)
Talita Abrantes
Publicado em 11 de abril de 2016 às 18h15.
São Paulo — Em discurso de 14 minutos enviado a parlamentares do PMDB, o vice-presidente da República, Michel Temer, antecipa discurso para cenário em que Câmara dos Deputados aprova processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. A votação está prevista para acontecer no próximo domingo.
Na gravação revelada pelo jornal Folha de S. Paulo, o peemedebista afirma que este seria seu primeiro pronunciamento à nação — feito com “muita modéstia, cautela, moderação, mas também em face da minha condição de vice-presidente, naturalmente de substituto constitucional da senhora presidente da República”.
Segundo a assessoria de imprensa de Temer, o áudio seria um exercício que ele estaria fazendo no celular e que fora enviado por engano para a bancada do PMDB.
Na mensagem de voz, ele ressalta que não quer "avançar o sinal" e que respeita a decisão do Senado Federal, que ainda irá votar a matéria. "Evidentemente, quando houver a decisão definitiva, eu preciso estar preparado para enfrentar os graves problemas que hoje afligem nosso país", diz.
Ele afirma ainda que o Brasil precisa de um governo de "salvação nacional" e de que serão necessários "sacríficios" para superar a crise caso Dilma sofra, de fato, o impeachment.
"Sem sacrifícios, não conseguiremos reunir as condições para retomar o crescimento e o desenvolvimento”, afirmou. Por outro lado, ele diz que irá manter os direitos adquiridos pelos cidadãos, mas que serão necessárias reformas e que o essencial, neste momento, é a pacificação do país.
Comissão
A gravação vem à tona no meio da reunião da comissão especial de impeachment que vota parecer favorável à abertura do processo contra a presidente. Se aprovado, a expectativa é de que o texto comece a ser discutido no Plenário da Câmara dos Deputados na próxima sexta-feira. A votação deve terminar só no domingo, dia 17 de abril.
Caso passe pela Câmara, o caso segue para avaliação do Senado, que deve instalar uma comissão para analisar o processo. A expectativa é de que os senadores votem a abertura do processo de impeachment no início de maio. Se metade da Casa aceitar a denúncia, Dilma é afastada por 180 dias. Michel Temer, então, assumiria a presidência no período.
Datafolha
No entanto, pelo menos por ora, Temer tem sido visto com ressalvas por uma parte do eleitorado. Segundo levantamento Datafolha divulgado no sábado, a maior parte dos brasileiros prefere que tanto a presidente Dilma Rousseff quanto o vice Michel Temer deixem a chefia do Executivo Federal seja via impeachment ou renúncia.
De acordo com o levantamento, 6 em cada 10 brasileiros apoiam a renúncia de ambos. Já 61% defende o impeachment da presidente e 58% também torce para o de Temer.
Esta foi a primeira vez que o Datafolha questiona eleitores sobre o futuro de Temer no governo. Segundo o estudo, 28% dos entrevistados defendem a permanência do peemedebista no Executivo. Outros 5% se declararam indiferentes e 9% não opinaram.
Impeachment de Temer
Na semana passada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Marco Aurélio Mello, determinou que Cunha desse continuidade ao processo de abertura de impeachment do vice-presidente.
Em dezembro do ano passado, o advogado mineiro Mariel Márley Marra protocolou o pedido na Câmara dos Deputados, sob a justificativa de que Temer cometeu crime de responsabilidade ao assinar decretos que autorizam a abertura de crédito suplementar sem a autorização do Congresso. O pedido, no entanto, foi arquivado pelo presidente da Casa.
A prática é um dos argumentos do requerimento contra Dilma Rousseff, que tramita na Comissão Especial de Impeachment na Câmara.
Marra recorreu ao STF alegando que Cunha não poderia ter julgado sozinho a abertura do processo e que deveria abrir uma comissão para decidir sobre a abertura do processo contra Temer.
Marco Aurélio Mello concordou com esse argumento e determinou a formação de uma comissão especial, nos moldes da que analisa o processo de deposição da petista, para avaliar a denúncia contra o peemedebista.
Resistente à ideia no início, Cunha enviou, na semana passada, ofícios para os líderes partidários pedindo a indicação de nomes para a instauração de uma comissão especial para analisar o caso. Até a última sexta-feira, poucos tinham respondido ao pedido.
VEJA A ÍNTEGRA DA TRANSCRIÇÃO DA FALA DE TEMER:
"Eu quero neste momento, me dirigir ao povo brasileiro para dizer algumas das matérias que penso devam ser por mim agora enfrentadas. E eu o faço, naturalmente, com muita cautela porque, na verdade, sabem todos há mais de um mês eu me recolhi exata e precisamente para não aparentar que eu estaria cometendo algum ato, praticando algum gesto com vistas a ocupar o lugar da senhora presidenta da República. Recolhi-me o quanto pude, mas, evidentemente, fui procurado por muitos que estão aflitos com a situação do nosso país.
Agora, quando a Câmara dos Deputados decide por uma votação significativa declarar a autorização para instalação de processo de impedimento contra a senhora presidente, muitos me procuraram para que eu desse pelo menos uma palavra preliminar à nação brasileira, o que faço com muita modéstia, cautela, com muita moderação, mas também em face da minha condição de vice-presidente, naturalmente de substituto constitucional da senhora presidente da República.
Desde logo eu quero afirmar que ainda temos um longo processo pela frente passando pelo Senado Federal. Todas as minhas palavras levarão em conta apenas a decisão da Câmara dos Deputados. Portanto, também as minhas palavras são provisórias já que temos que aguardar e respeitar a decisão soberana que o Senado Federal proferirá a respeito desse tema – seja quanto à admissibilidade da autorização, seja quanto ao final o julgamento propriamente dito.
Portanto, eu quero, neste momento, prestar uma homenagem ao Poder Legislativo, tanto à Câmara dos Deputados que já debateu amplamente este assunto, como ao Senado Federal que irá debater.
Desde logo eu quero comunicar aos meus amigos e colegas homens públicos, senadores da melhor cepa, da melhor sabedoria, que aguardarei respeitosamente a decisão do Senado Federal. Não quero avançar o sinal. Até imaginaria que eu poderia falar depois da decisão do Senado. Evidentemente, sabem todos que me ouvem, que quando houver a decisão definitiva, eu preciso estar preparado para enfrentar os graves problemas que hoje afligem nosso país.
Desde logo quero dizer aos que me ouvem, quero repetir, na verdade, o que tenho pregado ao longo do tempo. Os brasileiros sabem que há mais de oito, dez meses tenho feito pronunciamentos referentes à pacificação do país, à unificação do país.
É chocante, para não dizer tristíssimo, verificar os brasileiros controvertendo-se entre si, disputando ideias e espaços – até aí tudo bem, mas quando parte para uma coisa quase física, isso não pode acontecer em nosso país.
Ao dizer agora que a grande missão a partir desse momento é da pacificação do país, da reunificação do país, eu quero dizer que estou repetindo o que venho pregando há muito tempo como responsável por uma parcela da vida pública nacional.
Devo dizer também que isto fica para, aconteça o que acontecer no futuro, que é preciso um governo de salvação nacional. Portanto, de união nacional. É preciso que se reúnam todos os partidos políticos e que todos estejam dispostos a dar sua colaboração para tirar o país da crise. Sem esta unidade nacional, penso que será difícil tirar o país da crise que enfrentamos.
Para tanto é preciso diálogo. O fundamental agora é o diálogo. Em segundo lugar, a compreensão. E em terceiro lugar, para não enganar ninguém, a ideia de que vamos ter muitos sacrifícios pela frente. Sem sacrifícios, nós não conseguiremos avançar para retomar o crescimento e o desenvolvimento que pautaram a atividade do nosso país nos últimos tempos antes dessa última gestão.
É preciso retomar o crescimento e não quero que isso não fique em palavras vazias. Tenho absoluta convicção de que a mudança pode gerar esperança e que gerando esperança, isso gerará investimentos – não só nacionais, mas estrangeiros. Precisamos fazer restabelecer a crença no Estado brasileiro, nas potencialidades do Estado brasileiro.
Devo dizer aos que me ouvem, eu fiz muitas viagens internacionais no primeiro mandato e verifiquei o quanto os outros países que têm muito dinheiro em suas mãos, querem fazer aplicando no Brasil, ou seja, querem acreditar no Brasil.
O que aconteceu nos últimos tempos foi um descrédito no nosso país. E o descrédito é o que leva à ausência do crescimento, à ausência do desenvolvimento que faz retomar a inflação. Portanto, por um lado, nós temos absoluta convicção de que é preciso prestigiar a iniciativa privada, é preciso prestigiar os empresários do setor industrial, do setor serviços, do setor do agronegócio, dos vários setores se entusiasmem novamente com esses investimentos.
Mas ao dizer isso, eu estou pensando apenas naqueles que possam investir? Não. Diferentemente, estou pensando em manter as conquistas sociais obtidas nos últimos tempos. Por exemplo, o emprego é uma coisa fundamental para todos os brasileiros. Para que haja emprego é preciso uma conjugação dos empregadores com os trabalhadores. Você só tem emprego se a indútria, o comércio, as atividades de serviço todas estiverem caminhando bem. A partir daí que você tem emprego e, com isso, você pode retomar o emprego.
De outro lado, devo dizer também que, de fora parte um projeto pela empregabilidade plena, é preciso manter certas matérias sociais. Nós todos sabemos que o Brasil é um país pobre e eu sei que dizem de vez em quando que se outrem assumir vamos acabar com o Bolsa Família, vamos acabar com o Pronatec, vamos acabar com o Fies. Isso é falso, é mentiroso e é fruto dessa política mais rasteira que tomou conta do país. Portanto, neste particular, digo que é preciso manter esses programas e, se possível, revalorizá-los e ampliá-los.
O Bolsa Família, por exemplo, há de ser um estágio do governo brasileiro. Daqui há alguns anos, é possível que a empregabilidade tenha atingido tal nível que não haja mais necessidade do Bolsa Família. Mas enquanto persistir a necessidade, nós manteremos – assim como Pronatec, Fies, Prouni, todos esses projetos que acabaram dando certo no país.
Portanto, eu lanço uma mensagem para aqueles que detém o capital e lanço àqueles que querem uma mensagem do trabalho e lanço para aqueles que sequer trabalham.
É claro que vamos incentivar enormemente as Parcerias Público-Privadas na medida que isso pode trazer emprego ao país. Nós temos absoluta convicção, mais do que nunca, que o Estado não pode tudo fazer. O Estado depende da atuação dos setores produtivos do país – empregadores, de um lado, trabalhadores, de outro. Esses setores produtivos que, aliançados, vão fazer a prosperidade do Estado brasileiro. O Estado brasileiro tem que cuidar da Saúde, da Educação, enfim, de alguns temas fundamentais que não podem sair da órbita pública, mas o mais que não pode ser entregue à iniciativa privada.
Tudo isso que estou a dizer significará sacrifícios iniciais para o povo brasileiro, em primeiro lugar. Em segundo lugar, não quero gerar nenhuma expectativa falsa. Não pensemos que, se mudarmos o governo, em três, quatro meses, estará tudo resolvido. Em três, quatro meses, pode começar a ser encaminhado para resolvermos a matéria ao longo do tempo.
Se houver esse governo de transição ou se não houver, fique essa sugestão que estou fazendo para o governo que vier a manter-se, ficam essas sugestões que reitero que não foram por mim formuladas neste momento, mas que foram feitas ao longo do tempo.
Há reformas que são fundamentais para o país. Toda e qualquer reforma não alterará os direitos já formatados e adquiridos pelos cidadãos. Mas temos que preparar o país do futuro. Muitas matérias até estão em tramitação no Congresso Nacional e nós queremos ter uma base parlamentar muito sólida, que nos permita conversar com a classe política, mas conversar também com a sociedade.
Os senhores sabem, que assistiram às minhas palestras nos últimos tempos, que eu faço uma distinção e uma conjugação entre governo, governança e governabilidade. Para dizer que o governo são os órgãos constituídos – Legislativo, Executivo e Judiciário. A governança vem pelo apoio político que o governo consegue dos partidos políticos e do Congresso Nacional. Mas é preciso mais do que isso: é preciso a governabilidade. A governabilidade exige que haja uma aprovação popular do próprio governo. Portanto, a classe política unida com o povo levará ao crescimento do país e, portanto, o apoio ao governo.
É claro que não vou falar aqui sobre reformas que são fundamentais porque isso será fruto de um desdobramento do tempo, mas como não falar de uma reforma política? Como não pensar numa reforma tributária? E evidentemente que a reforma tributária envolve um outro tema, que é a revisão do pacto federativo. Toda vez que você pensa numa reforma tributária, você está pensando na distribuição de competências e de recursos para as entidades federativas.
É preciso mais do que nunca que as entidades federativas tenham uma autonomia verdadeira, ou seja: que nós tenhamos uma federação real e não artificial, como tem acontecido nos últimos tempos.
Sei, por exemplo, da grande dificuldade dos estados e municípios nos dias atuais. Há estudos referentes à eventuais anistias ou perdão de uma parte das dívidas e até uma revisão dos juros que são pagos pelas unidades federadas. Nós vamos levar isso adiante. Nós vamos estudar isso com muita detença e vamos levar isso adiante porque a força da União deriva da força dos Estados e dos municípios. E a força dessas unidades federativas depende do apoio e da boa vontade da classe política e do povo brasileiro.
Há matérias controvertidas, como a matéria referente à legislação trabalhistas e previdenciária, que nós vamos fazer com grande diálogo nacional, onde nenhum setor será esquecido – nem trabalhadores, nem empresários, nem povo brasileiro. Mas qualquer modificação que venha a ser feita é para garantir o futuro mesmo daqueles que já recebem salário, que já recebem aposentadoria. É nesses termos que vamos trabalhar. Ou seja, o diálogo de um lado e a conjugação de esforços de outro lado serão os alicerces digamos assim do nosso trabalho. É esta manifestação que eu queria deixar ao povo brasileiro".