TCU: investigação começa em momento em que o governo do presidente interino Michel Temer dá sinais de que buscará privatizar muitas das distribuidoras (Divulgação/TCU)
Da Redação
Publicado em 28 de junho de 2016 às 16h59.
São Paulo - O Tribunal de Contas da União (TCU) começou a levantar informações sobre distribuidoras de energia elétrica estatais por preocupações quanto à ineficiência dessas empresas, que chegaram a ser descritas como "cabide de empregos para apadrinhados políticos" por auditores em reunião na Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
A investigação começa em momento em que o governo do presidente interino Michel Temer dá sinais de que buscará privatizar muitas das distribuidoras, em um processo visto por técnicos da Aneel como fundamental para resolver questões de má gestão e interferência política. Os problemas identificados, inclusive, podem pesar na definição do valor dos ativos, segundo especialistas.
No alvo do TCU deverão estar principalmente as distribuidoras do grupo Eletrobras que atendem Estados do Norte e Nordeste e empresas estaduais, como a gaúcha CEEE-D, a CEA, do Amapá, e a CERR, de Roraima, segundo documentos vistos pela Reuters.
O tribunal pediu à Aneel dados sobre a composição do quadro de funcionários das empresas, bem como informações sobre o desempenho financeiro das elétricas, que sofrem prejuízos recorrentes. O material precisa ser enviado até 1° de julho.
Em reunião entre servidores do tribunal e técnicos da Aneel neste mês, cuja ata foi vista pela Reuters, foram apontados problemas de influência política na nomeação de funcionários para estatais elétricas.
"Os servidores do TCU demonstraram a preocupação com o excesso de pessoal nessas distribuidoras estatais, além da falta de critérios técnicos para admissão de funcionários", segundo a descrição da reunião.
No encontro, representantes da Aneel também foram duros ao analisar a situação das empresas e chegaram a dizer que elas enfrentam até mesmo falta de profissionais qualificados e precisariam ser vendidas ou passar por uma grande reorganização.
"A única solução na opinião dos representantes da agência, exceto a privatização, seria um choque de gestão nessas empresas, retirando todo viés político que hoje está arraigado nessas distribuidoras estatais, que deixa a meritocracia e tecnicidade em segundo plano", diz a ata.
Procuradas, as empresas não comentaram imediatamente a investigação.
NÍVEL DE GOVERNANÇA
O presidente do centro de estudos em energia Acende Brasil, Claudio Sales, concorda com a avaliação dos técnicos do TCU e da Aneel.
"O primeiro problema é o uso político de que essas empresas são alvo, que se traduz na total falta de meritocracia na escolha de seus dirigentes. E o baixíssimo nível de governança corporativa delas", afirmou.
Ele também apontou a venda do controle dessas elétricas como uma possível solução, com uma posterior revisão na gestão para recuperá-las, o que passaria inevitavelmente por desligamentos de pessoas em cargos comissionados e planos de demissão voluntária para reduzir eventuais inchaços nas empresas.
Procurado, o TCU afirmou em nota que "está levantando informações preliminares" para propor uma "metodologia de acompanhamento" das estatais, mas ressaltou que ainda não deu início a uma fiscalização.
No encontro com a Aneel, os auditores do TCU afirmaram estar preocupados com a "precariedade dos serviços oferecidos" por algumas dessas elétricas, que estão em processo de renovação de suas concessões, que venceram em 2015.
Os técnicos da Aneel ressaltaram, no entanto, que as elétricas estaduais Cemig, Copel, CEB e Celesc "estavam em melhores condições de gestão" frente às demais estatais.
VENDA EM PREPARAÇÃO
As distribuidoras da Eletrobras já estão sendo preparadas para a venda. A estatal convocou uma assembleia de acionistas para aprovar junto à União um plano para vender seis dessas subsidiárias que atuam no Norte e Nordeste até o final de 2017.
O especialista Fernando Maia, da consultoria Bench, avalia que a apuração do TCU não interferiria em uma eventual venda.
"O TCU está fazendo seu papel, são empresas estatais e ele tem essa obrigação de avaliar e sugerir melhorias... agora, se o caminho for a privatização, talvez essa trajetória seja encurtada, não precisa esperar uma auditoria", afirmou.
Ele disse, no entanto, que os resultados dessas concessionárias são bastante fracos, o que poderia limitar o interesse de investidores nos ativos. "Interesse existe sim, no mercado... é uma questão de avaliar o valor, de preço". Sales, do Acende Brasil, tem avaliação semelhante e aposta que o mais provável é que essas distribuidoras que sejam vendidas por valores bastante baixos ou mesmo simbólicos devido a essas dificuldades.
Ele lembrou que em 2004 a Cemar, distribuidora do Maranhão, foi vendida por 1 real.
Situação diferente tem a Celg-D, que atua em Goiás, vista como um ativo mais interessante pelo mercado, cujo leilão agendado para 19 de agosto teve um preço mínimo estabelecido em 2,8 bilhões de reais.
Além da Celg-D, a Eletrobras pretende vender suas unidades que atuam em Acre, Amazonas, Alagoas, Piauí, Rondônia e Roraima. Entre os eventuais interessados nas empresas, Sales listou os grupos Equatorial, Neoenergia, Enel e Energisa, todos com atuação em distribuição de energia em Estados do Norte ou Nordeste, além da CPFL.