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STF começa a julgar militarização das escolas de SP em meio a debate sobre adesão ao modelo

Supremo vai decidir sobre a constitucionalidade do projeto de Tarcísio de Freitas

Agência o Globo
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Publicado em 2 de dezembro de 2024 às 07h30.

O processo de militarização das escolas de São Paulo, que será retomado em 2025, foi marcado até agora por disputas internas nas escolas, incluindo hostilidades, episódios de repressão a professores e estudantes contrários ao projeto e pressões externas. Na semana passada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, derrubou uma decisão da Justiça estadual e liberou liminarmente o governo a recomeçar a implementação. Na próxima sexta-feira, o plenário do STF começa o julgamento sobre sua constitucionalidade.

Cerca de 300 diretores de escolas estaduais manifestaram o interesse em adotar o modelo cívico-militar. Os planos do governo de São Paulo são de militarizar 45 colégios a partir de 2026. Para isso, professores, pais de alunos até 16 anos e estudantes acima dessa idade das unidades educacionais precisam aceitar o modelo por meio de uma votação.

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Criada na década de 1990 em Goiás, a escola cívico-militar virou política pública nacional em 2019 no governo Jair Bolsonaro. Em 2023, o presidente Lula determinou o fim do programa, mas estados e municípios criaram leis locais para seus projetos.

Segundo a pesquisa “A cara da democracia”, feita pelo Instituto da Democracia, que reúne especialistas de UFMG, Unicamp, UnB e Uerj, 60% dos brasileiros apoiam a militarização das escolas e 30% são contra. O levantamento, porém, não diferencia o modelo militar do cívico-militar — o primeiro é direcionado a filhos de militares e tem professores e regras militares; no outro, há rotinas semelhantes às de quartéis e os militares atuam em funções não pedagógicas, como a inspetoria.

Turbulência na rede

Antes de a Justiça de SP suspender a implementação do modelo no estado, as escolas já haviam começado as discussões para a votação da comunidade aprovar ou não a militarização. Esse período, no entanto, foi marcado por turbulência nas escolas. O sindicato dos professores e alunos ligados a movimentos estudantis se mobilizaram com protestos e carros com caixas de som com críticas ao modelo. Profissionais afirmam, porém, que houve pressão da secretaria para que as consultas aprovassem a militarização.

"A direção sofre pressão da secretaria e repassa para a gente", conta o professor de uma das escolas que manifestou o interesse no projeto, e que pediu para não ser identificado. "Em nenhum momento foi uma discussão dos prós e contras. A gente tem que fingir que não tem nada de ruim".

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Em uma escola da capital, a direção emitiu um comunicado em agosto impedindo os professores de darem sua opinião. “Como funcionários contratados, nossa responsabilidade é apenas reproduzir dentro da unidade escolar as informações fornecidas pela SEDUC/SP”, diz o texto que revoltou os profissionais. Depois do episódio, a secretaria afastou o comando da escola.

Na mesma semana, em Campinas, PMs foram chamados para uma manifestação de alunos em uma escola. Os jovens se recusaram a subir para as aulas depois do intervalo como forma de protesto. Em nota, a Secretaria de Segurança Pública (SSP) de São Paulo disse que foi chamada pelo pai de uma estudante e foram ao local para “acompanhar a liberação da aluna para os seus pais”.

"Não tinha nenhuma confusão ou algo do tipo. Quando a PM chegou, eles conversaram com os estudantes e viram que não tinham o que fazer. Então eles foram embora. Mas foi bem assustador para os estudantes estarem falando contra militar dentro da escola e aparecer um PM do nada", diz Ludymila Frassi, uma das organizadoras do protesto.

No período, uma professora foi detida por policiais enquanto panfletava na frente de uma escola contra o projeto. Ela foi colocada no porta-malas de uma viatura e teve o material confiscado. A SSP alegou que os dois foram “flagrados abordando alunos” e quando a PM chegou “um deles proferiu ofensas aos oficiais, o que resultou na condução de ambos”. A secretaria não respondeu sobre o que motivou a abordagem nem a razão pela qual os panfletos não foram devolvidos.

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A professora nega o desacato e afirma que, com medo, tentou contemporizar a situação, oferecendo entregar os panfletos aos agentes para ser liberada, o que não adiantou.

"O PM ficou muito ofendido na parte do panfleto que fala sobre corrupção de militares", conta Priscila Toledo.

Além da hostilidade dentro das escolas, houve pressões externas sobre aquelas que queriam implementar o modelo. A direção da Escola Estadual Vladimir Herzog, por exemplo, manifestou o interesse e recuou após manifestação do instituto que também leva o nome do jornalista. Herzog foi torturado e morto na ditadura

A Secretaria de Educação nega qualquer retaliação, diz que está aberta ao diálogo e que apoia a livre manifestação. Em audiência pública no STF em outubro, o secretário executivo do órgão, Vinicius Mendonça Neiva, defendeu que o programa busca ser uma opção para quem quiser e ter gestão democrática:

"Os indicadores que essa política pública pretende melhorar são disciplina, redução de violência e melhoria de ambiente escolar. E isso leva à aprendizagem".

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