STF: atualmente, lei só permite aborto em caso de estupro, risco à vida ou anencefalia do feto (José Cruz/ABr)
Estadão Conteúdo
Publicado em 6 de dezembro de 2016 às 11h07.
São Paulo e Brasília - Quatro anos depois de permitir o aborto de fetos anencéfalos, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) deve voltar a tratar do tema nesta terça-feira, 7, quando está marcado o julgamento de uma ação que propõe a descriminalização do aborto no caso de grávidas infectadas pelo vírus da zika.
Ministros ouvidos reservadamente pela reportagem, no entanto, consideram que o novo julgamento é mais delicado e controverso que a anencefalia, por haver maior potencial de vida nas crianças que desenvolvem microcefalia.
Além disso, apontam que não há ainda estudos científicos robustos sobre as consequências do vírus da zika.
"É um julgamento complexo, que pode abrir precedentes. Também vamos autorizar aborto de fetos com Síndrome de Down?", indaga um ministro ouvido pela reportagem. Na avaliação dele, o debate em torno do tema ainda não está suficientemente amadurecido a ponto de o STF firmar um entendimento. "É um tema que exige maior maturação", opina o ministro.
O processo é de relatoria da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, que já tem o voto pronto desde setembro. Em 2012, Cármen deu um dos oito votos favoráveis à liberação de aborto em caso de anencefalia - outros dois ministros votaram contra: Ricardo Lewandowski e Cezar Peluso, que já deixou a Corte e se aposentou. Na época, Lewandowski considerou que caberia ao Congresso incluir no Código Penal uma nova exceção ao crime de aborto.
O Código Penal prevê que a interrupção da gravidez no Brasil é permitida apenas nos casos em que a gestante corre risco ou quando a gravidez decorre de estupro.
"É um julgamento diferente da anencefalia: nesse caso, há possibilidade de vida, embora haja uma deficiência bárbara", avalia outro ministro, que acredita que há maioria na Corte pela liberação, ainda que por um placar mais apertado que o da anencefalia.
Dentro do STF, pelo menos três votos são considerados certos a favor do direito de aborto no caso de grávidas infectadas pelo vírus da zika: Luís Roberto Barroso, Edson Fachin e Rosa Weber, que já se manifestaram na última terça-feira no sentido de que a interrupção da gravidez até o 3º mês não é crime.
A ação direta de inconstitucionalidade a ser julgada pelo plenário do STF foi ajuizada pela Associação Nacional de Defensores Públicos (Anadep), que também pede a obrigação de haver médicos capacitados para o diagnóstico clínico de infecção por zika em unidades do SUS e a imediata disponibilidade nos hospitais de exames para a detecção da infecção.
Para o secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Leonardo Steiner, a ação tem aspectos positivos, como a reivindicação por melhores condições de assistência para crianças com microcefalia. "O cuidado deve ser discutido", afirmou. Isso não vale, no entanto, para o aborto. "Somos contra qualquer atitude que possa diminuir a aceitação da vida. Sempre nos manifestamos contra", disse. Para ele, a discussão vem acompanhada de um risco, o de se rejeitar as deficiências. "Estamos entrando numa sociedade onde a finitude humana não é mais aceita. Entramos num perigo grande, o de valorizar apenas pessoas sadias", avaliou.
O ministro da Saúde, Ricardo Barros, não quis opinar sobre o tema. Numa entrevista ao Estado, logo ao assumir ele havia afirmado que qualquer discussão sobre o tema deveria ser feita ouvindo setores religiosos.
Até novembro, foram confirmados 2.189 casos da má-formação no País e outros 3.113 estão em investigação.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.