Gilmar Mendes: o ministro admitiu estar preocupado com todas as investigações em andamento, envolvendo desvios de recursos e negociações de partidos em torno de coligações (Antônio Cruz/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 3 de maio de 2017 às 14h08.
Brasília - O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, disse nesta quarta-feira, 3, que certamente haverá uso de caixa 2 na campanha de 2018 se não houver uma reforma política. O ministro afirmou que é preciso encerrar "esse ciclo de vale-tudo que vivemos até aqui".
"Vai ser certamente uma eleição muito judicializada e também policiada. Se não houver mudança no sistema, por conta da inexistência de recursos públicos e privados, certamente nós vamos ter caixa dois. Vamos ter dinheiro do crime, toda essa instabilidade. Vai ser uma eleição policiada e policialesca", disse Mendes, após reunião com parlamentares da Comissão da Reforma Política da Câmara.
Ao falar com jornalistas depois da reunião, o ministro admitiu estar preocupado com todas as investigações em andamento, envolvendo desvios de recursos e negociações de partidos em torno de coligações.
"Isso vai levar certamente ao Supremo daqui a pouco a reagir, como reagiu à doação corporativa. Se não vier uma reforma política, isso vai fazer com que provavelmente o Supremo proíba também as coligações", ressaltou.
Para Gilmar Mendes, a corrupção da política leva à corrupção do modelo democrático, ao afastamento das pessoas, "e aí começamos a ter todos esses devaneios e aventuras que podem comprometer todo o patrimônio que construímos".
Indagado sobre quais seriam esses "devaneios e aventuras", o ministro respondeu que talvez a Venezuela fosse a democracia mais sólida na América Latina até um tempo atrás.
"Eu não preciso contar o que aconteceu lá. A corrupção levou à situação que tem hoje", frisou.
Sobre o financiamento das campanhas, Mendes disse que não há possibilidade de regresso à doação corporativa, considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"Não há como voltar. A partir daí, o que podemos fazer? Modelo de pessoas físicas de doação, que deve ser aumentada, e certamente fundos públicos. Mas como fazer fundos públicos para distribuição a candidatos? Tivemos 460 mil candidatos a vereadores, como distribuir dinheiro para essa gente toda? Por isso que a discussão de lista tem a ver com isso. Não podemos desconectar essas duas discussões", comentou.
O presidente do TSE traçou paralelo entre o atual contexto político e a crise econômica vivida pelo País no início da década de 1990. Para Mendes, o Brasil conseguiu dar um "salto de qualidade" e "mudou seu padrão civilizatório" com a instituição do Plano Real.
"Nós precisamos fazer nesse campo o que se fez no Plano Real. Um Plano Real no âmbito da política. Trazer o Brasil para um plano civilizatório no que concerne a política encerrando esse ciclo de vale-tudo que vivemos até aqui", disse.
Na avaliação de Gilmar Mendes, o sistema de lista fechada - um dos principais pontos discutidos no âmbito da reforma política - não serviria para blindar dirigentes partidários que viraram alvo de investigações.
"Na medida em que um político peso morto passa a integrar uma lista, que não é uma lista secreta, é um desestímulo para que ela seja votada, porque ela não tem bons nomes, é uma lista contaminada. Vai ter uma manifestação de repúdio. Vocês criaram na imprensa de que isso vai servir para esconder, se fosse pra esconder, colocaria no final da lista, e se está no final da lista não se elege", afirmou Gilmar.
"A democracia passa por crise no mundo todo. No nosso caso, a nossa briga é para criar a democracia partidária, fortalecer os partidos, que nem isso nós temos hoje", acrescentou.
O ministro não quis rebater as declarações do procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Lava Jato, que criticou a decisão da Segunda Turma do STF de revogar a prisão preventiva do ex-ministro José Dirceu. Gilmar deu o voto de desempate no julgamento. "Já disse tudo o que tinha pra dizer no meu voto, ontem (terça-feira, 2), disse o ministro.