Capitão Augusto: deputado deixou, nesta quarta-feira (24), o cargo de vice-líder do governo na Câmara dos Deputados (Câmara dos Deputados/Agência Câmara)
André Jankavski
Publicado em 24 de abril de 2019 às 18h57.
Última atualização em 24 de abril de 2019 às 20h33.
Sâo Paulo — Durou dois meses a atuação do deputado federal Capitão Augusto (PR-SP) como vice-líder do governo na Câmara dos Deputados. Recrutado em fevereiro para tentar organizar uma articulação extremamente bagunçada, o deputado admitiu que não conseguiu cumprir com o seu objetivo.
“Estou vendo que, por mais que a eu fale e tente ajudar, o relacionamento do Executivo com o Legislativo está muito ruim e muito deteriorado”, afirma ele.
O deputado acredita que a reforma da Previdência pode sofrer muito com essa desorganização do governo e de sua equipe de parlamentares. Nas suas contas, a reforma tem tudo para ser aprovada, mas a desidratação será alta. O parlamentar acredita que a economia fique em 400 bilhões de reais nos próximos dez anos.
Para completar, Augusto não defende os nomes escolhidos para representar o governo na Câmara ou no Congresso. Ao contrário. Para ele, Major Vitor Hugo (PSL-GO), Joice Hasselmann (PSL-SP) e Delegado Waldir (PSL-GO) não estão conseguindo entregar o que o presidente precisa. Mais do que isso: estão entrando em muitas brigas desnecessárias com a oposição.
“Cada dez deputados que você conversa, oito reclamam e dois se calam. O governo não está interessado em ouvir”, diz o deputado. Confira, a seguir, a sua entrevista.
Por que o senhor decidiu deixar a vice-liderança do governo?
Eu já tenho várias funções aqui na Câmara. Sou o presidente da comissão de segurança, vice-líder do PR, presidente da frente parlamentar de segurança e relator do pacote do ministro Sérgio Moro.
Quando fui convidado para ser vice-líder foi mais para ajudar o governo. Eu sempre fui aliado do presidente Jair Bolsonaro, desde o início da campanha. Quando a candidatura dele era motivo de brincadeiras entre os parlamentares, eu subi à tribuna para apoiá-lo.
Mas o senhor já tinha essas funções anteriormente. Por que decidiu sair neste momento?
Eu pensei que poderia contribuir com o governo com a minha visão e experiência dentro do Congresso. E eu estou vendo que, por mais que a gente fale e tente ajudar, o relacionamento do Executivo com o Legislativo está muito ruim e muito deteriorado.
Cada dez deputados que você conversa, oito reclamam e dois se calam. O governo não está interessado em ouvir. Então, a melhor coisa é abrir mão e tocar as minhas coisas.
O senhor continua apoiando o presidente?
Sou aliado do Bolsonaro, mas vou deixar para outro vice-líder fazer esse papel de tentar mostrar para o governo que o negócio não está bom.
Em outras ocasiões, o senhor se mostrou confiante que poderia mudar o jogo e organizar a base do Congresso. Por que não obteve êxito nesse ponto?
Eu considero errada a estrutura política que foi montada pelo governo. O presidente nunca teve um bom relacionamento com o plenário da Câmara. Sempre foi muito combativo e esse é o jeito dele. Não à toa, quando Bolsonaro tentou ser presidente da casa, ele teve apenas cinco votos. Já que ele tinha um problema interno com os parlamentares, a primeira coisa que o presidente deveria fazer é reforçar aquilo que tem uma maior dificuldade.
Na sua opinião, o que ele deveria fazer?
O presidente deveria ter pegado o Ministério das Relações Institucionais [hoje Secretaria de Governo], que cuidava do relacionamento com os parlamentares, e ter transformado em um super ministério. Durante o governo do ex-presidente Michel Temer, esse papel foi muito bem feito pelo Carlos Marun.
Esse eventual ministro deveria estar no mesmo patamar do ministro Paulo Guedes e do ministro Sérgio Moro. É esse ministério que viabilizaria a aprovação dos projetos de todos os outros setores. E a primeira coisa que foi feita foi tirar essa pasta. Foi um grande erro.
Depois, alocou esse relacionamento para a Casa Civil, que foi mais uma falha, porque esse setor tem inúmeras outras coisas para fazer e não apenas ficar cuidando de parlamentares no dia a dia.
Mas como o senhor avalia o papel do ministro Onyx Lorenzoni?
Ele é meu amigo pessoal, mas os demais parlamentares têm uma rusga na Câmara por conta das 10 medidas contra a corrupção. Depois, criaram uma secretaria com status de ministério que é a Secretaria de Governo e colocam o general Carlos Alberto Santos Cruz. Mas parece que ele não gosta de parlamentar e está sempre de cara amarrada.
Nos corredores do Congresso, ninguém comenta se ele recebeu ou não recebeu parlamentares. Assim fica difícil.
Como o senhor enxerga as lideranças do governo na Câmara?
O líder do partido do presidente, o Delegado Waldir, é um cara muito combativo e briga muito com a esquerda. As próprias campanhas dele acabam sendo meio caricatas. Não acredito que seria a melhor pessoa para ser o líder do partido. O presidente também errou ao colocar um líder do governo na Câmara do próprio partido, o deputado Major Vitor Hugo.
O PSL já é do governo, então tem que se fazer o aceno para outro partido. O deputado Vitor Hugo é humilde e trabalhador, cheio de boa vontade, mas não foi bem aceito pelos líderes.
Então, o relacionamento complicou a olhos vistos. Outro erro também foi colocar a deputada Joice Hasselmann como líder no Congresso. Além de ser do mesmo partido, ela também é muito combativa e briga demais com a oposição.
Então, a imagem do governo com os deputados está bem negativa?
Há deputados que pedem reuniões e sequer são recebidos. Trata-se de uma reclamação generalizada. Os parlamentares tentam reunião com o segundo e terceiro escalão e não estão conseguindo. É inacreditável.
Você vê que o negócio está ruim e, por mais que você se esforce, não adianta. Por isso, é melhor eu tocar as minhas coisas aqui e dar espaço para outro vice-líder que, de repente, o governo vai ouvir.
Na sua opinião, o governo não vê que está errando, não aceita que está errando ou, simplesmente, quer insistir no erro?
Eu acredito estão levando para o presidente informações que não refletem a realidade. A própria reforma da Previdência, ao se conversar nos bastidores, é que ela será desidratada. O governo receberá uma minirreforma.
Não interessa para ninguém que o paciente morra, então a reforma passa com a certeza absoluta. Mas devido ao mau relacionamento, os deputados darão o mínimo necessário para estabilizar o paciente. Quer 1 trilhão de reais? Dá 400 bilhões e está ótimo.
Esse é o valor que o senhor acredita que vai chegar a desidratação?
Eu acredito que mais da metade da reforma será desidratada. O governo tem dois meses para rearticular. Eu espero que essa saída minha, mesmo sendo um aliado e amigo do Bolsonaro e do Onyx, acenda alguma luz amarela e perceba que o negócio não está bom.
Ninguém abre mão de ser vice-líder do governo. É interessante para o parlamentar e traz um status bom por estar próximo. Se eu estou abrindo mão, é porque o negócio está feio. Que isso sirva de alerta para ouvir a verdade do que acontece nos bastidores.