FLÁVIO ROCHA E JOÃO AMOÊDO EM EVENTO DA EXAME: com a saída do empresário, o representante do partido Novo é o último dos outsiders (Germano Lüders/Exame)
Raphael Martins
Publicado em 14 de julho de 2018 às 08h37.
Última atualização em 14 de julho de 2018 às 12h30.
Pode ter sido o desempenho fraco nas pesquisas ou o desgosto pelo jingle composto por Latino. Fato é que a desistência do presidenciável Flávio Rocha (PRB) de sua candidatura para as eleições de 2018 evidencia que o penúltimo dos outsiders deixou a estrada livre para que os tradicionais nomes da política disputassem o Palácio do Planalto em outubro. O solitário representante dos não-políticos de carreira, agora, é João Amoêdo, do partido Novo.
“Ao me lançar candidato, imaginei que a consciência do peso da carga tributária e de um estado grande e inútil estaria mais clara na cabeça do povo brasileiro”, disse Rocha em entrevista a EXAME. “Seria uma luta quixotesca, uma candidatura apenas para marcar presença”. De fato, ele abre mão de pouco. Nas pesquisas de preferência, a candidatura que pregava liberalismo econômico junto do conservadorismo de costumes, com apoio firme do Movimento Brasil Livre, não saiu de 1%.
O PRB, por sua vez, passa defender a “união” por uma candidatura de centro, sem mencionar quem representa este projeto. Mas não sem deixar algumas pistas. O próprio Rocha diz em vídeo divulgado na tarde desta sexta-feira que o Brasil passa por um “momento turbulento, que não pode flertar com os extremos”. Por “extremos”, deve-se ler, segundo diretores do partido que falaram à reportagem, o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ) e seja lá qual for o candidato do PT. Com a ex-senadora Marina Silva (Rede) também não há conversas.
O tal projeto de centro para o PRB, segundo dirigentes ouvidos em condição de anonimato, é preferencialmente o ex-governador de São Paulo Geraldo Alckmin (PSDB) ou o senador Álvaro Dias (Podemos-PR). O que talvez possa soar como surpresa é que a legenda não descarta Ciro Gomes (PDT). “Seria uma aliança muito difícil, mas se trouxer o Josué Alencar, do PR, para vice ou mesmo fixando uma coligação com o PSB daria alguma estrutura partidária para uma chapa forte”, diz um dos dirigentes do PRB. “E não dá para dizer que o Ciro é um mau gestor.”
As evidências mostram qual foi o curso da retirada do penúltimo dos outsider da disputa. A estrutura partidária, o tempo de TV e os recursos para campanha ainda estão no centro do processo decisório dos partidos, enquanto os rumos da eleição parecem cada vez mais incertos. As sondagens ao eleitorado estagnaram de vez. Tanto Datafolha como Ibope mostram Bolsonaro na liderança com cerca de 20%, seguido de Marina e Ciro. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), virtualmente inelegível pela condenação em segunda instância no caso do tríplex do Guarujá, figura com cerca de 30% quando é considerado.
A dúvida agora é se, sem outsiders, os tradicionais meios de fazer política serão determinantes na disputa. EXAME consultou três diferentes visões de cientistas políticos sobre o assunto. Majoritariamente, os consultores acreditam que o cálculo dos partidos está correto e ter capilaridade e recursos ainda será decisivo.
A falta de renovação e ausência de novos nomes é um bom indicativo. Tanto o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa (PSB) como o apresentador Luciano Huck — que ensaiou uma candidatura pelo PPS — desistiram das candidaturas com alguma influência da antiga estrutura do mainstream político. Na cúpula dos partidos, dominavam as disputas pelas alianças estaduais que deixavam incerto o destino da eleição nacional. Ambos não quiseram pagar para ver se entrariam na política com poucos apoios.
“Há um claro cansaço com o establishment político, mas a eleição no Brasil se faz com estrutura partidária”, diz Thiago Vidal, gerente de análise política da Prospectiva Consultoria.
Outro fator que bloqueou a mudança de ares na análise da Prospectiva foi a reforma política de 2017. As campanhas mais curtas e com recursos escassos, na mão das lideranças partidárias, geram um caldo que favorece quem tem mandato, em vez de ajudar quem nunca teve. Ter o tempo de TV ajuda a desconstruir notícias falsas que, por ventura, circulem nas redes sociais.
“Tende a prosperar o candidato que tem estrutura na ponta, com cabos eleitorais e capilaridade. Mesmo no caso de Donald Trump, nos Estados Unidos, não há consenso sobre a influência das redes sociais no processo eleitoral”, diz o cientista político Carlos Pereira, professor da Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas da Fundação Getulio Vargas.
Para a Eurasia, consultoria norte-americana de risco político, houve nos últimos anos uma mudança de paradigma na demanda do eleitorado. No cálculo da empresa, há um grau de desencanto com o sistema e com as lideranças políticas muito mais elevado do que em eleições passadas, associado especialmente à insatisfação com a corrupção no establishment político. Como nunca, portanto, a decisão do voto será envolvida pelo discurso dos candidatos que tenham credibilidade de mudar a maneira com qual a política é feita, justamente as trocas e negociações que garantes chapas fortes e cheias de recursos.
“Candidatos vistos como mais do mesmo ou associados aos esquemas de corrupção terão um grande passivo nessa eleição. Os modelos de previsão eleitoral começam pelo perfil da demanda e quais candidatos melhor se encaixam”, diz o cientista político Christopher Garman, diretor de análise para as Américas da Eurasia. “Por isso, damos mais relevo aos candidatos com credenciais no eixo de combate à corrupção, vistos perante o eleitor que mudam a maneira de fazer política. Não apostamos em Geraldo Alckmin, mesmo com mais estrutura partidária e palanque. Ele não está aliado com esse perfil.”
A Eurasia calcula 45% de chances aos “quase reformistas”. São eles Jair Bolsonaro, Marina Silva e, em menor proporção, Álvaro Dias. Os chamados “anti-reformistas”, caso de candidato petista ou Ciro Gomes, 30%. Geraldo Alckmin tem 25%.
Neste mês de julho iniciam as convenções partidárias, que dão as linhas definitivas das candidaturas. Em um mês, é hora de sair às ruas. Somente então será possível saber qual das correntes de pensamento está correta — e o que está, de fato, na cabeça do eleitor.