Justiça tributária viabilizada trabalha também na desigualdade social (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)
Gilson Garrett Jr
Publicado em 29 de dezembro de 2020 às 12h34.
Última atualização em 29 de dezembro de 2020 às 17h05.
O Supremo Tribunal Federal (STF) teve um papel decisivo em 2020 no enfrentamento da pandemia de covid-19. Em um dos primeiros julgamentos sobre o tema, delimitou até onde estados e municípios poderiam ir em decisões sobre o isolamento social. Logo no fim do ano determinou que a vacinação pode ser obrigatória.
Mas não foram só temas ligados à pandemia que permearam os julgamentos do Supremo. Os ministros também decidiram que homossexuais podem doar sangue, e foram contrários ao dossiê antifascista produzido pelo Ministério da Justiça.
O ano ainda foi marcado pela aposentadoria do ministro Celso de Mello após 31 anos de atuação na Corte. Ele foi sucedido por Kassio Nunes Marques, o primeiro indicado do presidente Jair Bolsonaro ao STF.
Veja os 6 principais julgamentos que dominaram a pauta. A lista foi elaborada com o auxílio do professor Rubens Glezer, da FGV Direito São Paulo.
1- Competência para ações sanitárias contra a covid-19
Em abril, o STF decidiu, por unanimidade, que estados e municípios têm autonomia para regulamentar medidas de isolamento social. O caso foi apresentado pelo PDT depois de o governo baixar a Medida Provisória 926, que restringia a ação de governadores em tomar ações preventivas ao novo coronavírus.
A ação questionava trechos da MP que deixavam a cargo da União a definição de quais serviços essenciais deveriam ficar abertos, independentemente de medidas de isolamento adotadas por governadores e prefeitos.
Apesar de considerarem a medida provisória constitucional, os ministros decidiram que ela não deve centralizar a tomada de decisões sobre isolamento social na União.
2- Vacinação obrigatória
Em um dos últimos julgamentos do ano, a Corte se posicionou favorável à tese de que a vacinação contra a covid-19 deve ser obrigatória, mas não forçada. O tribunal também entendeu que, em caso de inércia da União, os estados e os municípios podem tornar a imunização compulsória.
Prevaleceu a tese segundo a qual a população não pode ser coagida a se vacinar, mas deve receber sanções caso se recuse, em nome do bem coletivo e da imunização coletiva.
No mesmo julgamento, os ministros analisaram outro recurso sobre se pais poderiam deixar de vacinar os filhos baseados em crenças religiosas ou filosóficas. A maioria entendeu que o estado pode, sim, obrigar pais a vacinar crianças e adolescentes.
3- Doação de sangue por homossexuais
O plenário do STF considerou inconstitucionais dispositivos de normas do Ministério da Saúde e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) que excluíam do rol de habilitados para doação de sangue os “homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes nos 12 meses antecedentes".
No julgamento, concluído em maio, prevaleceu o voto do relator, ministro Edson Fachin, no sentido de julgar procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5543, ajuizada pelo PSB. As normas relacionavam a proibição a critérios que consideravam o perfil de homens homossexuais com vida sexual ativa à possibilidade de contágio por infecções sexualmente transmissíveis (IST).
4- Dossiê antifascista
Em um dos casos mais importantes do STF, a maioria dos ministros votou para suspender todo e qualquer ato do Ministério da Justiça de produção ou compartilhamento de informações sobre cidadãos “antifascistas”. Pelo entendimento dos ministros, a pasta comandada pelo ministro André Mendonça ficou proibida de levantar dados sobre a vida pessoal, escolhas pessoais ou políticas e práticas cívicas exercidas por opositores ao governo.
A relatora do caso, ministra Cármen Lúcia, votou contra o monitoramento de opositores do governo. Com duros recados ao Planalto, a ministra disse que o Estado “não pode ser infrator”, ressaltou que “não compete a ninguém fazer dossiê contra quem quer que seja” e elogiou a imprensa, que revelou a existência do relatório. O voto da ministra foi seguido por oito ministros.
5- Candidato pode fazer concurso em outra data por motivo religioso
No fim de novembro, o STF decidiu autorizar a realização de provas de concursos públicos em datas e horários que não constam nos editais por motivos de crença religiosa. A discussão envolveu a participação dos adventistas nas etapas das seleções, cuja crença estabelece que o dia de sábado deve ser guardado, ou seja, não deve ser dedicado a atividades como trabalho, entre outras.
Após três sessões de julgamentos, por 7 votos a 4, a Corte entendeu que as provas podem ser remarcadas para outra data que não conste no edital, desde que a mudança não cause prejuízos para a administração pública e para a preservação da igualdade na seleção dos candidatos.
O julgamento era de repercussão geral, ou seja, pauta outras decisões semelhantes em todo o país.
6- Reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado
O Supremo também teve papel importante na delimitação de regras no Poder Legislativo. No começo de dezembro, durante sessão de julgamento em plenário virtual, a maioria dos ministros entendeu que os presidentes da Câmara e do Senado não podem disputar a reeleição na mesma legislatura.
O julgamento foi histórico porque dividiu o STF. Quatro ministros acompanharam o relator, Gilmar Mendes, que entendeu a reeleição possível, mas permitida a apenas uma recondução.
Edson Fachin, Luís Roberto Barroso e Luiz Fux seguiram os votos das ministras Carmen Lúcia e Rosa Weber e do ministro Marco Aurélio Mello, contrários à reeleição. Ao proferir seu voto, o presidente do STF, ministro Fux, disse que a norma constitucional “impede a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente à do primeiro ano da legislatura”.
(Com Estadão Conteúdo e Agência Brasil)