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Repasse de verba para São Paulo cai 90% no governo Bolsonaro

Segundo dados do orçamento municipal, a União repassou à capital paulista R$ 21,4 milhões este ano, ante R$ 223 milhões em 2018

 (Carolina Antunes/PR/Flickr)

(Carolina Antunes/PR/Flickr)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 23 de outubro de 2020 às 12h19.

O volume de transferências federais para investimentos em São Paulo caiu 90% com a chegada de Jair Bolsonaro ao Palácio do Planalto na comparação com o último ano do governo de Michel Temer. Segundo dados do orçamento municipal, a União repassou à capital paulista R$ 21,4 milhões este ano, ante R$ 223 milhões em 2018. A redução prejudica o andamento de obras de infraestrutura urbana, como ações para melhorar a drenagem, e não leva em conta a verba destinada para combater o novo coronavírus.

A pandemia por si só não explica a queda. No ano passado, o valor em repasses do governo federal já havia registrado uma forte retração: ao longo de 2019, a soma das transferências para a capital alcançou R$ 37 milhões. Para efeito de comparação, em 2016, último ano eleitoral, a cidade recebeu o montante de R$ 345,7 milhões da União.

De acordo com a Secretaria Municipal da Fazenda, esses recursos são resultado de convênios firmados pelas demais pastas com ministérios para programas específicos. Quando o acordado não é realizado, a Prefeitura precisa complementar o custo das obras com o remanejamento de outras fontes, como o Fundo de Desenvolvimento Urbano (Fundurb).

O secretário Philippe Duchateau ressalta, no entanto, que essas são transferências discricionárias, ou seja, que não são constitucionais (caso do SUS, por exemplo) nem legais, impostas por lei. "O Poder Executivo pode transferir de acordo com seus programas, políticas públicas ou suas escolhas", disse.

Como o recurso federal esperado não chegou, a execução de três pôlderes, estruturas hidráulicas para evitar inundações, na região de Aricanduva, na zona leste, por exemplo, precisou de um aporte de R$ 25 milhões do Tesouro Municipal para ter sua continuidade assegurada, informou a Secretaria Municipal de Infraestrutura.

Segundo a pasta, quando a transferência prevista em convênio assinado com o Ministério do Desenvolvimento Regional for realizada, o cofre da cidade será "ressarcido".

Apoio eleitoral

O apoio de Bolsonaro ao candidato Celso Russomanno (Republicanos), que disputa o primeiro lugar nas pesquisas com o atual prefeito, Bruno Covas (PSDB), transformou os repasses da União em tema da campanha eleitoral. Após o tucano dizer, em sabatina do Estadão, no dia 15, que Bolsonaro "virou as costas" para São Paulo, Russomanno contestou e disse que o prefeito falta com a verdade.

Os números mostram que a queda neste tipo de transferência federal a municípios não ocorre só na capital paulista. Belo Horizonte, por exemplo, recebeu R$ 3,1 milhões neste ano - em 2019, o repasse alcançou R$ 41,7 milhões, ou seja, uma queda de 92%. Em 2018, ainda na gestão Temer, o valor havia ficado em R$ 41,3 milhões, segundo a Secretaria Municipal da Fazenda.

Em algumas áreas, as verbas enviadas pela União à capital mineira chegaram a zerar em 2020, como ocorreu, por exemplo, em relação a recursos previamente acordados para programas de saneamento básico. Mas, segundo o secretário João Fleury, a queda não impactou as contas do município e não impediu a realização de obras relacionadas às enchentes - em janeiro, fortes tempestades destruíram avenidas centrais e deixaram 13 mortos.

A situação se repete em Salvador, onde o mesmo tipo de transferência caiu 21%. Entre janeiro e setembro, foram repassados R$ 24,7 milhões. No mesmo período do ano passado haviam sido R$ 31,7 milhões e, de 2018, R$ 51,2 milhões, de acordo com a secretaria da Fazenda do município (Sefaz).

O secretário Paulo Souto afirma que o cenário era esperado diante da queda de arrecadação do governo federal e da pandemia. "Claro que se tivesse mais recursos, se investiria mais. Mas isso não causou um transtorno maior porque a grande maioria dos investimentos Salvador faz com recursos próprios e operações de crédito", disse.

Especialista em direito público, o advogado Adib Kassouf Sad confirma que a redução pode ter sido provocada, além de escolha política, por algumas razões involuntárias, como queda de arrecadação decorrente da pandemia - fruto inclusive da redução da atividade econômica -, realocação de recursos financeiros existentes para outros pontos do orçamento e eventual prorrogação ou adiamento de início ou retomada de programas e obras. "Por mais justificável que seja a razão, há uma frustração da expectativa criada com a previsão de envio dos recursos, seja com o adiamento, seja com a suspensão do investimento", afirmou. Procurados, Planalto e Ministério da Economia não comentaram os dados.

Déficit

Diante da crise econômica acentuada este ano com a pandemia do novo coronavírus, todas as esferas de Poder sofrem com a não realização das receitas previamente orçadas. Na capital, por exemplo, a estimativa é que se feche o ano com uma redução de aproximadamente 10% na arrecadação, o que corresponderá a R$ 7,1 bilhões a menos na conta da Prefeitura. Ao fim de dezembro, a receita total deve chegar a R$ 62 bilhões ante os R$ 68,9 bilhões previstos em lei.

Essa diferença entre as receitas e as despesas comprometidas, somada ao aumento de gastos diretamente relacionados à pandemia, deve se traduzir em um déficit de R$ 2,5 bilhões, segundo expectativa do secretário municipal da Fazenda, Philippe Duchateau.

Ele explica que para suprir a falta de receita - e assim cumprir com o compromissos assumidos a curto prazo - o Município terá de apelar às suas "reservas". O valor a menos será compensado pelos superávits acumulados em anos anteriores.

"No início de 2020, tínhamos superávits (recursos em caixa menos obrigações) de aproximadamente R$ 7,5 bilhões, dos quais R$ 5 bilhões eram de recursos vinculados e R$ 2,5 bilhões livres. É por isso que podemos fazer esse déficit. Os recursos livres serão os que vamos consumir integralmente", diz Duchateau.

Ao longo do ano, os custos extras da Prefeitura com ações de combate ao novo coronavírus caminharam no sentido oposto à queda das receitas. Somente a Secretaria da Saúde, responsável pela maior parte das medidas adotadas, como construção e manutenção de hospitais de campanha, precisou de um acréscimo orçamentário de R$ 1,6 bilhão.

Outros R$ 950 milhões extras foram repassados à Secretaria de Transportes para compensações tarifárias do sistema de ônibus. As despesas devem aumentar, já que ontem a Câmara Municipal aprovou, em segunda votação, o auxílio de R$ 100 por mês defendido agora por Bruno Covas (PSDB). As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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