Petrobras: mesmo com o esforço interno para acelerar o andamento de processos, atualmente a autarquia ainda julga casos de 2009 (Sergio Moraes/Reuters)
Da Redação
Publicado em 17 de dezembro de 2014 às 10h37.
São Paulo - O efeito letal do escândalo na Petrobras sobre as ações da companhia tem levado investidores a se perguntarem se será possível uma punição regulatória condizente com a dimensão do que tem sido descoberto pela operação Lava Jato.
Infelizmente, já se pode afirmar com segurança que a resposta será tardia e falha. Julgamentos de processos na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) levam pelo menos quatro anos e o cardápio de punições não faz ninguém tremer.
Não adianta culpar o órgão regulador. Para começar, o xerife do mercado de capitais brasileiro nem tem base legal para investigar corrupção.
Por isso mesmo, o primeiro processo na CVM com objetivo de identificar se executivos e conselheiros da Petrobras faltaram com dever de lealdade para com a companhia, ao deixarem de fazer constar no balanço falhas das quais teriam conhecimento, só começou em outubro, sete meses após a fase inicial da operação Lava Jato da Polícia Federal.
Mesmo com o esforço interno para acelerar o andamento de processos, atualmente a autarquia ainda julga casos de 2009. Uma meta fixada pelo presidente Leonardo Pereira é de no ano que vem limpar a pauta de processos até 2011. Nesse passo, eventuais sanções a executivos por irregularidades na Petrobras não devem acontecer antes de 2018.
Além disso, o arsenal da CVM para remediar as irregularidades é inócuo. Mesmo o mais pesado dos corretivos, a suspensão de um executivo por 20 anos para atuar em companhia aberta, não deve assustar quem estiver sujeito a tal pena. Dada a natureza política das indicações para postos-chave na estatal, é difícil imaginar que qualquer um deles ou delas fosse convidado a exercer papel relevante em outra companhia listada na Bovespa.
Outra opção do cardápio de punições, a multa, pode ter um efeito limitado, considerando-se os desvios potenciais de bilhões de reais citados nas investigações envolvendo o suposto esquema de corrupção na Petrobras.
O maior conjunto de multas já aplicado pela CVM, de pouco mais de 650 milhões de reais, ocorreu em 2008 envolvendo irregularidades no Banco Santos, quebrado quatro anos antes.
A última sanção, a advertência, parece pueril dada a dimensão do escândalo, mas não pode ser descartada. A CVM já usou esse recurso outras vezes para punir representantes de governos por irregularidades em estatais, como o presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, esta também conselheira da Petrobras, e o ex-governador de São Paulo Cláudio Lembo.
Dado que a Petrobras tem entre os conselheiros grandes empresários, banqueiros e ministros de Estado, não seria inédito que tal fórmula fosse repetida. A companhia, pelo atraso na divulgação do balanço, está sujeita a multa de 500 reais diários. E só.
Diante dessa combinação de demora e ineficácia, não será surpresa se as punições mais severas virem da Securities and Exchange Commission (SEC), reguladora do mercado de capitais dos Estados Unidos. Diferentemente da CVM, na SEC os processos se concentram mais na pessoa jurídica e as multas são bem maiores. No ano passado, o órgão aplicou uma multa de 400 milhões de dólares à petroleira francesa Total, por pagamento de propina a autoridades iranianas para conseguir uma parceria com a estatal do país. AUTORREGULAÇÃO Se não há motivos para ter esperança por um corretivo exemplar pelos canais oficiais do mercado de capitais no Brasil, da autorregulação também não se pode esperar muito.
Na BM&FBovespa, as únicas empresas sujeitas a multas são as integrantes dos níveis de governança corporativa. A Petrobras sempre deu de ombros para esse segmento, sob argumento de que, por ter recibos de ações negociados na Bolsa de Valores de Nova York, já obedecia a regras de listagem bastante superiores. As demais instituições do mercado também devem refletir sobre seu papel. Mesmo com seguidas mostras de desprezo a investidores e analistas, poucas manifestações firmes aconteceram. Há dois anos, a Petrobras não faz reuniões Apimec.
Neste ano, mesmo diante das denúncias de corrupção a partir de março, a Petrobras ostenta em seu site mais de uma dezena de prêmios do mercado, incluindo um troféu por transparência do balanço, em agosto, e a presença de suas ações no índice das empresas mais sustentáveis do mundo.
Há pouco mais de dois anos, após um pequeno investidor ter se manifestado contra as práticas da gestão da companhia em um evento Apimec, um diretor disparou imediatamente: se não está satisfeito, venda suas ações! Agora, após os papéis da Petrobras terem caído ao piso em uma década, nem essa alternativa parece viável.
* Esta coluna foi publicada na terça-feira, 16 de dezembro, no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.