São Paulo - Enrolada em uma bandeira verde-amarela, Ana Carmo, proprietária de uma banca de jornais de São Paulo, diz estar pronta para a Copa do Mundo, esperando da seleção um grande Mundial.
"Eles estão pressionados. Têm a obrigação de ganhar", afirma Ana, de 35 anos, que decorou sua pequena banca com uma grande bandeira brasileira.
Em busca do hexacampeonato, Neymar e companhia têm pela frente o desafio de levantar o ânimo de uma nação insatisfeita com os milhões gastos na construção de estádios, que, para muitos, deveriam ser destinados a investimentos em saúde e educação.
Ana Carmo está feliz pelo fato de os brasileiros terem uma oportunidade de brilhar em casa, mas não esconde algum descontentamento.
"O Brasil investiu e perdeu bastante com os custos (do torneio). Eles têm que ganhar bonito. A Copa é no Brasil. Não podemos perder", declarou com um sorriso otimista.
Dupla pressão
Após a euforia inicial pela escolha do Brasil em 2007 para receber a Copa, o apoio popular ao torneio caiu em meio aos atrasos na construção de estádios e na formação de uma infraestrutura de transporte adequada, que fizeram a conta chegar a 11 bilhões de dólares.
Uma pesquisa publicada no fim de semana passado pela empresa Datafolha reflete o otimismo do Brasil em relação à equipe e o pessimismo sobre o legado da competição: 68% acreditam que o Brasil vai ser campeão, mas 54% dizem que organizar o torneio trará ao país mais prejuízos do que ganhos.
Alguns torcedores lançaram uma advertência à seleção brasileira na última sexta-feira, ao vaiarem o Brasil durante a partida que terminou com uma vitória sofrida de 1 a 0 sobre a Sérvia, em um amistoso de preparação para a Copa disputado no Morumbi.
Marcos Guterman, autor do livro "O futebol explica o Brasil", disse que os jogadores sofrem "uma pressão dupla, muito maior do que em circunstâncias normais".
"Com estes problemas, a pressão é dupla", disse Guterman à AFP.
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1. Público X Privado
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1/12 (Divulgação/ Consórcio Maracanã 2014)
São Paulo - Faltando nove meses para a abertura da
Copa do Mundo de 2014, já se pode dizer que a conta do evento pesou mesmo é no bolso dos brasileiros, apesar de promessas em contrário: de cada R$ 10 gastos nos
estádios do Mundial
, R$ 6 são dinheiro público. Do orçamento total de R$ 8 bilhões das 12 arenas, R$ 4,8 bilhões saíram dos cofres do governo. Só o de Brasília, Mané Garrincha, custou 1,43 bilhão de reais, tendo como principal companhia outro bilionário, o
Maracanã. Apenas três estádios foram completamente financiados sem recursos dos governos estaduais. O governo federal até que não gastou diretamente, mas ajudou com vários incentivos. Um dele é o programa de financiamento do
BNDES, que liberou R$3,8 bilhões; o outro é Recopa, regime especial que desonerou a contratação de serviços e a compra de equipamentos de impostos federais como IPI, PIS/Pasep, entre outros.
Clique nas fotos para conferir levantamento de EXAME.com feito com a ajuda do Sindicato da Arquitetura e da Engenharia (Sinaenco), que mantém o
Portal 2014.
*Atualizada no dia 13/9 para mudança dos valores da Arena Fonte Nova, que não contou com recursos públicos em sua construção.
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2. Mané Garrincha (Brasília) - R$1,43 bilhão
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2/12 (Mateus Baeta/ Portal da Copa)
Valor total: R$ 1,43 bilhão
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 1,43 bilhão
Entregue em maio de 2013 A obra foi a única a não solicitar o financiamento do BNDES. A viabilidade financeira ocorreu por meio de recursos da Terracap (agência imobiliária pública controlada pelo Distrito Federal e pela União), oriundos da venda de terrenos de propriedade do governo.
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3. Maracanã (Rio de Janeiro) - R$ 1,19 bilhão
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3/12 (Divulgação/ Consórcio Maracanã 2014)
Valor total: R$ 1,19 bilhão
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 1,19 bilhão
Entregue em abril de 2013 A obra de reforma do Maracanã foi feita inteiramente com recursos públicos. Os R$ 1,19 bilhões gastos na obra foram viabilizados pelo governo estadual via financiamento do BNDES (R$ 400 milhões) e o restante veio diretamente do caixa do Tesouro Estadual do Rio de Janeiro.
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4. Arena da Amazônia (Manaus) - R$ 605 milhões
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4/12 (REUTERS/Bruno Kelly)
Valor total: R$ 605 milhões (previsto)
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 605 milhões
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra está sendo paga pelo governo do Amazonas, que captou parte do valor - R$ 388,1 milhões - através de financiamento do BNDES.
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5. Arena Pantanal (Cuiabá) - R$ 537,5 milhões
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5/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 537,5 milhões (previsto)
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 537,5 milhões
Previsão de conclusão: outubro de 2013 A obra foi inteiramente bancada com recursos do Governo do Mato Grosso, sendo que R$ 337,9 milhões foram captados via financiamento do BNDES.
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6. Castelão (Fortaleza) - R$ 518 milhões
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6/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 518 milhões
Recursos privados: -
Recursos públicos: R$ 518 milhões
Entregue em dezembro de 2012 O Castelão foi o primeiro estádio da Copa a ser entregue. A obra foi inteiramente financiada pelo governo do Ceará, que conseguiu financiamento do BNDES de R$ 351,5 milhões. Os outros 167 milhões são oriundos do Tesouro Estadual. A operação do estádio é feita pelo Consórcio das empresas Galvão Engenharia e Andrade Mendonça.
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7. Arena da Baixada (Curitiba) - R$ 131 milhões
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7/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 265 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 134 milhões
Recursos públicos: R$ 131 milhões
Previsão de conclusão: dezembro 2013 Os R$ 131 milhões de recursos públicos foram captados via financiamento do BNDES. O empréstimo foi tomado pelo Fundo de Desenvolvimento Econômico (FDE) administrado pela agência de fomento estatal. O restante foi bancado pelo Clube Atlético Paranaense.
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8. Arena Fonte Nova (Salvador) - sem recursos públicos
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8/12 (Governo Federal/Portal da Copa)
Valor total: R$ 591,7 milhões
Recursos privados: R$ 591,7 milhões
Recursos públicos: -
Entregue em abril de 2013 O Estádio foi construído pela Parceria Público-Privada (PPP) entre o Governo do Estado da Bahia e a Fonte Nova Negócios e Participações (FNP). A FNP financiou R$ 323,6 milhões com o BNDES. Além disso, um empréstimo no valor de R$ 250 milhões também foi feito pela FNP com BNB (Banco do Nordeste do Brasil). O restante foi adquiridoatravés do Desenbahia – Agência de Fomento do Estado da Bahia.
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9. Arena das Dunas (Natal) - sem recursos públicos
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9/12 (Glauber Queiroz/Portal da Copa)
Valor total: R$ 400 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 400 milhões
Recursos públicos: -
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra foi quase inteiramente financiada pelo BNDES, que liberou R$ 396,5 milhões ao consórcio OAS Arenas, que será administrador do equipamento por 20 anos. O restante também fica a cargo da OAS.
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10. Beira-Rio (Porto Alegre) - sem recursos públicos
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10/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 330 milhões (previsto)
Recursos privados: R$ 330 milhões
Recursos públicos: -
Previsão de conclusão: dezembro de 2013 A obra está sendo realizada por uma parceria entre o Clube Internacional e a construtora Andrade-Gutierrez. O investimento O Clube aportou parte dos recursos (R$ 26 milhões) e a construtora conseguiu financiamento de R$ 235 milhões via BNDES. Em contrapartida pelo investimento, durante 20 anos, a Andrade Gutierrez, por meio da Sociedade de Propósito Específico, terá direito a explorar todas as novas áreas criadas no estádio.
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11. Arena Pernambuco (Recife) - sem recursos públicos
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11/12 (Portal da Copa)
Valor total: R$ 529,5 milhões
Recursos privados: R$ 529,5 milhões
Recursos públicos: -
Entregue em abril de 2013 O estádio foi construído através de uma Sociedade de Propósito Específico (SPE) formada pelas empresas Odebrecht Participações e Investimentos (OPI) e Construtora Norberto Odebrecht do Brasil. A SPE foi concebida para construir e operar a Arena Pernambuco em regime de parceria público-privada (PPP) com o governo estadual. A empresa conseguiu financiar R$ 400 milhões através do BNDES.
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12. Agora, veja exemplos de "legados" que o Brasil não terá
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12/12 (Adidas/Facebook.com)
"O humor do torcedor brasileiro, o espírito do torcedor brasileiro vai depender do desempenho da seleção. Depende do Neymar e depende do conjunto da seleção", afirmou.
Futebol político
Também há muito em jogo para a presidente Dilma Rousseff, que pode enfrentar a ira do país se o Brasil for eliminado da Copa antes da final de 13 de julho, no Maracanã.
Dilma, que é candidata à reeleição em outubro, defendeu a realização do torneio no Brasil, e insiste que os investimentos em infraestrutura beneficiarão os brasileiros durante anos.
Mas muitos projetos foram adiados e tiveram custaram muito mais do que havia sido previsto.
"Neste Mundial, a política e o futebol estão muito atrelados", declarou José Paulo Florenzano, professor de Antropologia da Universidade Católica de São Paulo.
"Tudo pode acontecer. Uma boa campanha da seleção pode despertar um sentimento patriótico e abafar os protestos. Já o inverso, uma eliminação inesperada, pode precipitar uma onda de protestos", disse à AFP.
O humor nacional está em baixa.
Os brasileiros esperaram mais do que o normal para decorar suas ruas, casas e carros com bandeiras brasileiras, e a ameaça de mais protestos projeta uma sombra de incerteza sobre a Copa.
Na Copa do Mundo de 1970, a ditadura militar aproveitou a obsessão da nação com o futebol para distrair a população de suas preocupações cotidianas, explicou Pablo Azevedo, um especialista em Administração do Esporte na Universidade de Brasília.
Após um desempenho decepcionante no Mundial de 1966, o governo apoiou preparações inéditas para a equipe nacional que incluíam o início do treinamento muito antes da competição e partidas na altitude para que os jogadores se adaptassem às condições na Cidade do México na Copa de 70.
"O Brasil ficou mais de um ano comemorando a vitória", disse Azevedo.
Mas os analistas dizem que Dilma terá apenas algum tempo de calma se o Brasil conquistar a Copa, já que, devido à campanha eleitoral, deverá enfrentar as preocupações do eleitorado pouco depois do torneio.
"Teremos uma trégua de alguns dias, talvez semanas", acrescentou Guterman. "Mas a realidade do Brasil segue ali. Ainda há tensão sobre a situação econômica e social".
Enquanto organiza as revistas em sua banca, Ana Carmo está otimista de que uma vitória do Brasil dará ao país o impulso necessário.
"Trará muita felicidade aos corações dos brasileiros", disse, "e se esquecerão um pouco de seus problemas".