Senador Gim Argello: considerado o melhor nome pelo Planalto para cuidar do bom uso dos recursos públicos no TCU. Cargo é vitalício (Ariel Costa/Divulgação)
Da Redação
Publicado em 9 de abril de 2014 às 19h59.
São Paulo – O nome que o governo Dilma quer para ocupar a cadeira de ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) – um cargo vitalício, com salário de R$ 26,7 mil e dever de vigiar as contas públicas – é de um senador que não recebeu um voto para estar onde está e foi várias vezes manchete nos últimos anos – em boa parte delas, por suspeitas de irregularidades (veja lista com algumas delas ao final).
Com seis inquéritos em tramitação no Supremo Tribunal Federal, Gim Argello soube fazer amigos rapidamente entre os poderosos do Senado desde que entrou, em 2007.
Ele se orgulha também do bom trânsito conquistado no Palácio do Planalto após vários testes de fidelidade.
Em Brasília, diz-se que tem uma boa relação com Dilma Rousseff desde quando ela, ainda ministra da Casa Civil, saía para caminhar na Península dos Ministros, região de casas de alto padrão da capital, e encontrava o parlamentar eventualmente nos exercícios matinais.
Para quem entrou cabisbaixo para ocupar a cadeira vaga após a renúncia de Joaquim Roriz – não recebeu, portanto, um voto para pular da política do Distrito Federal aos voos mais altos da política federal – ele só tem do que se orgulhar.
Se chegou a correr risco de cassação há sete anos, agora querem colocá-lo como ministro do Tribunal que aprecia anualmente as contas da Presidência da República, fiscaliza a aplicação de recursos e andamento de obras, além de apurar irregularidades diversas envolvendo verbas públicas.
Os servidores e procuradores do TCU não o querem de jeito nenhum. Ontem fizeram uma manifestação para deixar isso bem claro.
Apontam que o cargo exige, por lei, “reputação ilibada”. E é aí que as coisas podem começar a se complicar para Argello. A tal ponto que a indicação, procedimento que costuma passar pelo crivo do Congresso sem maiores dificuldades, não saiu como o previsto nesta terça-feira.
A enorme base aliada não conseguiu aprovar o processo acelerado de indicação de Gim ao cargo, como pretendia o presidente do Senado, Renan Calheiros.
Disse assim o senador Cristovam Buarque, cuja carreira política também foi construída no Distrito Federal:
“Não sei quantos aqui conhecem a vocação do senador Gim Argello para o papel que ele desempenhará pelos próximos 19 anos como ministro do Tribunal de Contas da União. Eu, que o conheço há mais tempo do que muitos, não sei se ele tem a menor vocação, o menor preparo, o menor gosto pelo trabalho árduo de ministro do TCU”, disse o senador do PDT, segundo o blog de Josias de Souza.
Ex-corretor de imóveis e hoje homem rico e de inúmeras posses, além de empresário, não faltam investigações e acusações contra Argello, cujo patrimônio, de acordo com matéria da revista IstoÉ de 2009, teria passado de um bilhão de reais. Ele nega.
Com o fracasso de ontem, o político agora terá que passar por uma sabatina no Senado, o que pode trazer constrangimentos para ele e quem o patrocina ao cargo.
Oficialmente, a indicação é de Renan Calheiros, mas Dilma e toda equipe o querem lá.
Gim Argello é a peça que fecha o quebra-cabeças montado pelo Palácio do Planalto para ter apoio do PTB, com vistas às próximas eleições presidenciais.
Ele pode ser colocado lá justamente porque outro ministro do TCU, Valmir Campelo, recebeu a oferta de assumir cargo poderoso no Banco do Brasil, provavelmente a vice-presidência de Governo, e se aposentou mais cedo do que manda a lei.
As denúncias e investigações
Seis inquéritos contra Argello tramitam no STF (3746/2013 - 3723/2013 - 3723/2013 - 3570/ 2012 - 3059/ 2010 - 2724/ 2008), segundo a Transparência Brasil.
Como não se tratam de ações penais, ele não responde oficialmente como réu perante o Supremo.
O rol de suspeitas é vasto, passando por lavagem de dinheiro, crime eleitoral, corrupção ativa, peculato (apropriação da coisa pública), entre outros.
Se pelo STF não há condenações, Gim já teve sentenças desaforáveis por parte da Justiça do DF, em primeira e segunda instâncias, por ter assinado ato, considerado ilegal, que criou cargos na Câmara Legislativa da capital. Ele recorre da condenação no STJ.
A seguir, seguem seis denúncias que envolvem o parlamentar, que incluem recebimento de lotes nas jovens terras demarcadas do Distrito Federal. Parte das suspeitas abaixo estão entre as investigadas no Supremo:
1) Emendas para entidades fantasmas
A revista Veja e o jornal O Estado de S. Paulo publicaram no final de 2010 evidências que mostravam que dinheiro de emendas do senador iam para entidades culturais de fachada.
Um dos institutos, segundo a Veja, chegou a repassar meio milhão de reais para a Rádio Nativa FM, arrendada pelo filho do parlamentar, Jorge Afonso Argello Júnior.
O escândalo custou a Argello o cargo de relator da Comissão Mista de Planos, Orçamentos Públicos e Fiscalização.
2) De novo a rádio
Na mesma época, o Correio Braziliense noticiou evidências colhidas pelo Ministério Público de que essa mesma rádio não distribuía os anunciados prêmios de promoções. Isso incluía, segundo o Correio, colocar como vencedores donos de veículos cujas placas não batiam com as informações do Detran.
3) Filho e mulher movimentam milhões
Um dos inquéritos que tramita no STF questiona as vultuosas quantias movimentadas nas contas dos familiares diretos de Argello.
Sua mulher, Márcia Cristina Lanzillote Varandas Argello, sacou R$ 800 mil em junho de 2012 “em uma lotérica de propriedade do senador”, de acordo com o MP.
Já seu filho movimentou R$ 2,7 milhões na conta-corrente entre fevereiro a setembro de 2010.
O Ministério Público considerou o valor "incompatível com a renda declarada de R$ 6.500” do jovem, que tem menos de 25 anos.
4) Recebimento de lotes
Representação do Psol de 2007 contra Gim Argello, logo que este assumiu, faz referência à denúncia feita por um deputado distrital de que o político teria recebido 300 lotes para facilitar a regularização de um condomínio irregular no DF no começo dos anos 2000.
À Isto É, uma empresária afirmou ter passado 100 lotes de outro condomínio para pessoas ligadas ao então deputado distrital.
5) Contrato de aluguel de informática dava para comprar itens
Em 2002, quando era presidente da Câmara legislativa do DF, Gim Argello autorizou a realização de um contrato sem licitação para aluguel de equipamentos considerados posteriormente defasados de informática.
Para o Ministério Publico, o valor para alugar 369 equipamentos por dois anos daria para comprar 1.338 deles, de acordo com informações do Estadão.
6) Lobby para Luiz Estevão, o primeiro senador cassado do Brasil
Gim Argello teria agido junto com o empresário Luiz Estevão diante da Controladoria Geral da União para diminuir a multa imposta pelo TCU ao primeiro senador cassado do país, segundo a Folha de S. Paulo. Estevão foi multado em um bilhão de reais por desvios na obra do Tribunal Regional do Trabalho de SP nos anos 90.
Ele nega
Vale lembrar que o senador sempre negou todas as acusações ou defendeu que as informações estavam equivocadas.
No caso da movimentação financeira dos filhos e da mulher, por exemplo, Argello apontou à Folha que ambos mexem com compra e venda de imóveis, o que justifica as somas, além de questionar os valores anunciados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF).
No caso de Luiz Estevão, ainda, ele disse que não participou das reuniões, apenas ajudou a marcá-las.
No caso dos contratos de informática, a defesa do senador afirma que a contratação foi recomendada pelos técnicos da Câmara Legislativa e que o TJDFT já inocentou Argello de ação com teor semelhante.