Ao todo, sete estudantes da Unifesp se revezam e lecionam semanalmente para 20 refugiados, entre sírios, camaroneses e nigerianos (Divulgação/MemoRef)
Da Redação
Publicado em 11 de setembro de 2015 às 10h46.
São Paulo - Estudantes do curso de graduação em Letras criaram o projeto Memorial Digital do Refugiado (MemoRef), que promove a inclusão de refugiados por meio de aulas de português e atividades culturais.
Já na abertura do curso, ocorrida no final de agosto, os estrangeiros puderam conhecer e curtir uma roda de samba.
Uma das idealizadoras do projeto, a estudante Marina Reinoldes, de 20 anos, disse que, ao final do curso, previsto para dezembro, um banco de dados estará disponível em um portal na internet, apresentando resultados dessa experiência pedagógica e social, além de histórias de vida dos refugiados.
A situação de refúgio não é uma escolha, ressaltou a estudante. “Temos consciência de que eles não têm escolha, mas nós temos. E é com esse direito de escolha, que nós, enquanto estudantes da universidade, enquanto entendedores dessa missão social do ambiente acadêmico, decidimos fazer esse projeto para ajudá-los”, afirmou.
Ela explicou que as universidades têm a missão social de ajudar a desenvolver e mudar a realidade do seu entorno, expandindo a teoria e aplicando conhecimentos com a comunidade.
Em um questionário apresentado ao refugiado para se inscrever no curso, o grupo pergunta o motivo da vinda ao Brasil.
“Um dos alunos respondeu 'porque eu preciso viver e trabalhar'. Isso, para mim, mostrou que nosso projeto tem um valor muito maior que o educacional. É uma questão social, de poder trazer a universidade para essa realidade também”, contou Marina.
Ao todo, sete estudantes da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), do campus de Guarulhos, se revezam e lecionam semanalmente para 20 refugiados, entre sírios, camaroneses e nigerianos.
Marina já ensinava refugiados na organização não governamental Oásis Solidário e pôde conhecer as dificuldades que os estrangeiros enfrentavam no Brasil logo que chegavam, sem dominar o idioma, sem emprego e, muitas vezes, sozinhos.
Desde o ano passado, os sírios lideram as estatísticas de refugiados no Brasil. Segundo dados do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare), órgão ligado ao Ministério da Justiça, 2.077 sírios receberam asilo do governo brasileiro, de 2011 até agosto deste ano.
Os refugiados sírios ficam à frente dos angolanos (1.480), colombianos (1.093), congoleses (844) e libaneses (389).
Diante dessa situação, Marina idealizou o MemoRef no ambiente acadêmico, onde conseguiu agregar os elementos necessários para a execução do projeto: espaço físico, equipamentos, professores orientadores e graduandos voluntários com vontade e disponibilidade para dar as aulas.
O grupo desenvolveu ainda o livro didático exclusivo Recomeçar: língua e cultura brasileira para refugiados, que será disponibilizado para download gratuitamente ainda este mês.
“A barreira linguística é a primeira que eles enfrentam. Sem a língua, não conseguem ir ao mercado, comprar comida, não conseguem pedir ajudar, não conseguem trabalhar. Sem trabalhar, não conseguem dinheiro, nem trazer a família”, explicou Marina.
O camaronês Luc, 45, está há oito meses no Brasil. Sua família, que mora nos Estados Unidos, pagou uma passagem de navio para que ele fosse visitá-la.
O navio, porém, fez uma parada na Argentina e outra no Brasil, no Rio de Janeiro, onde Luc desembarcou. Do Rio, foi parar na cidade de Guarulhos, onde tem um amigo que o ajuda.
Ele não conseguiu emprego até o momento, mas já encaminhou pedido de refúgio ao governo brasileiro e pretende fazer um curso de soldagem.
Sua sobrevivência aqui depende do amigo e de uma quantia em dinheiro enviada por sua família dos EUA. Luc fala francês e inglês e já entende bem o português, mas quer se expressar melhor no idioma, por isso procurou a rede Cáritas, que o encaminhou ao MemoRef. “[A aula] é muito formidável, eu gosto muito”, disse Luc.
Sobre as primeiras aulas do curso, Marina ressaltou o sentimento de realização do grupo por pensar, desenvolver e tirar o projeto do papel. Com satisfação, ela finalizou: “Eu acho que a gente aprende muito mais do que ensina”.