Lula e Bolsonaro: chances de privatização crescem em um eventual segundo mandato de Bolsonaro (Ricardo Stuckert/Adenir Britto/PMSJC/Divulgação)
Estadão Conteúdo
Publicado em 4 de setembro de 2022 às 12h09.
Se, em geral, o mercado financeiro não aposta em grandes divergências na política macroeconômica entre um eventual governo Lula e um possível novo mandato de Bolsonaro, na área de privatizações, a tendência é de antagonismo, ao menos em relação às grandes estatais brasileiras.
Economistas e gestores acreditam que, no caso de Bolsonaro ser reeleito, o caminho para a venda da Petrobras, a maior estatal do País, poderia começar a ser trilhado - medida rechaçada pela equipe petista.
“Em um novo mandato do Bolsonaro, acho que aconteceria não só a venda de ativos da Petrobras, mas também o trabalho de preparação para ela ser privatizada”, diz o sócio da Mauá Capital Luiz Fernando Figueiredo. Ex-diretor do Banco Central, ele afirma acreditar que Lula faria apenas concessões marginais.
Sobre desestatizações, o programa de governo do candidato do PT destaca apenas que se opõe à privatização da Petrobras, da Eletrobras, dos Correios e da Pré-sal Petróleo.
Lula tem reiterado que as estatais precisam trabalham em benefício do povo brasileiro. O programa de Bolsonaro afirma que “ampliar e fortalecer o processo de desestatização e concessões da infraestrutura nacional” foi uma das “premissas do governo atual e continuará sendo no próximo mandato”.
Apesar de o governo Bolsonaro não ter conseguido fazer tudo o que o ministro da Economia, Paulo Guedes, pretendia na área - ele havia prometido a venda dos Correios, do Porto de Santos, da Pré-sal Petróleo, além da Eletrobras -, os analistas do mercado financeiro destacam que o presidente avançou consideravelmente nas desestatizações. Na campanha, Guedes disse que as privatizações somariam R$ 1 trilhão no governo Bolsonaro.
De qualquer forma, a percepção do mercado financeiro é de que o trabalho foi cumprido. “O governo de Bolsonaro teve um programa robusto de privatizações e a Eletrobras foi a joia da coroa”, afirma o estrategista-chefe da gestora RPS, Victor Candido. Ele aponta que a visão do mercado é de que uma empresa estatal é ineficiente e que acaba sendo alvo de uso político.
Para Cândido, a discussão em torno da privatização da Petrobras começou a ganhar corpo por conta da questão das altas do combustível, o que levou a uma série de mudanças na presidência da estatal por Bolsonaro. “Acho que acalmando, esse assunto perde força. O que deve acontecer é uma continuidade de venda de ativos pela Petrobras e diminuição de venda em outros setores”, comenta.
Além de refinarias. está em processo de venda a participação da estatal na petroquímica Braskem, por exemplo. Uma venda importante finalizada ano passado foi a da BR Distribuidora, hoje Vibra.
O estrategista-chefe da Vitreo, Francisco Levy, diz que as chances de privatização crescem em um eventual segundo governo de Bolsonaro, o que explica o recente desempenho das empresas públicas listadas na Bolsa, após uma melhora do atual presidente nas pesquisas de intenção de voto. “Mas hoje, de qualquer forma, o preço das ações das estatais está descontado”, afirma.
Estudo feito pela Teva Índices mostra que, em ano de eleições, o volume negociado de ações das empresas estatais fica acima da média, diante de um movimento de troca das carteiras pelos gestores. Neste ano, segundo o presidente da companhia, Gabriel Verea, o retorno do índice de estatais (que acompanha o desempenho em Bolsa das empresas públicas de capital aberto) está em 34% até aqui, bem acima do Ibovespa, o principal índice da B3, que está hoje em torno de 5%, diz.
Em relação aos projetos do PT, os analistas afirmam ser improvável uma reestatização da Eletrobras, dado que o custo político seria alto. ”Não me parece ser uma grande prioridade. Se o País estivesse enfrentando uma crise energética, aí ganharia momento político para fazer”, diz um economista que pediu para não ser identificado.
O mesmo profissional pondera, porém, que a venda da Petrobras pode não ser tão fácil como afirmam outros analistas. Isso porque Bolsonaro teria de gastar capital político, negociar com o Congresso e ainda enfrentar parte da população que é contra a privatização. Já a venda dos Correios, acrescenta, seria mais simples e, portanto, mais provável.
Ele diz ainda que, com exceção da desestatização das grandes estatais, os dois possíveis governos não se diferenciariam tanto nessa área. Para o economista, não haveria grandes divergências no ambiente de negócios sob Bolsonaro ou sob Lula nem nas regras estabelecidas em âmbito federal para que governos locais possam fazer suas concessões.
Esse ambiente e até as regras dependem da política macroeconômica e de uma taxa de juros mais baixa para viabilizar os projetos, afirma. “Para concessões, o que importa é o ambiente de negócios, que deve ser similar nos dois casos. A percepção é de que concessões mais corriqueiras, como de ferrovias e aeroportos, devem continuar.”