Congresso: na terça-feira, Janot pediu ao Supremo Tribunal para iniciar 83 novas investigações sobre políticos baseadas nos depoimentos ainda sigilosos (Monique Renne/Site Exame)
Reuters
Publicado em 15 de março de 2017 às 19h46.
Curitiba- Um dos principais procuradores da Lava Jato disse que até 350 novas investigações serão iniciadas em decorrência da leva de depoimentos de executivos da empreiteira Odebrecht, revelando como a corrupção percorre todo o espectro político, das menores cidades aos escalões mais altos do governo.
Carlos Lima, decano de uma equipe de procuradores de Curitiba que há três anos toca a investigação da Lava Jato, disse que os relatos da Odebrecht ampliam o inquérito muito além das expectativas e que irão envolver congressistas de destaque, veteranos do Poder Executivo e outras figuras do poder.
Na terça-feira, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal para iniciar 83 novas investigações sobre políticos baseadas nos depoimentos ainda sigilosos. Ele ainda solicitou que outros 211 casos em potencial sejam encaminhados a instâncias inferiores.
"Eu diria que, entre os casos que vão ao Supremo e os que ficam aqui em Curitiba, eu calcularia que em torno de até 350 novas investigações vão começar", disse Lima à Reuters na terça-feira em seu escritório na capital paranaense.
As revelações podem derrubar o governo do presidente Michel Temer, afirmam especialistas, ou afetar a perspectiva de reformas econômicas, que animou os mercados financeiros brasileiros e fez o real ficar entre as moedas de melhor desempenho no mundo em 2016.
A Odebrecht é uma de várias grandes empreiteiras que pagaram bilhões de dólares de propinas a políticos e executivos de estatais, especialmente a Petrobras , durante anos.
A Lava Jato começou três anos atrás investigando um esquema de lavagem de dinheiro comandado pelo doleiro Alberto Youssef, cujo depoimento revelou o vasto esquema envolvendo algumas das maiores lideranças políticas e empresariais do país.
Desde que assinou o maior acordo de leniência do mundo com procuradores brasileiros, norte-americanos e suíços no final do ano passado, a Odebrecht se tornou alvo de inquéritos de várias nações latino-americanas, nas quais admitiu ter pago propinas para garantir contratos.
Lima disse que as novas investigações irão contemplar vários outros países que ainda não investigam a Odebrecht, sem dar detalhes.
Ele disse que até mesmo os brasileiros, acostumados à corrupção, irão ficar chocados com a delação da Odebrecht, que irá mostrar como a corrupção é endêmica em todos os níveis de governo, do municipal ao federal, já que as construtoras desembolsaram bilhões em suborno em troca de contratos governamentais lucrativos, afirmou.
"Agora vai ficar sem nenhuma dúvida o grau de extensão da corrupção no sistema político brasileiro em todos os niveis, isso vai ser colocado à vista de todos", disse.
"A Lava Jato em si não vai mudar nada, ela vai revelar a extensão do que acontece, o que tem que mudar é a própria democracia", disse. "A população brasileira tem que decidir se vamos continuar sendo enganados, ou realmente nós vamos atrás de alguma coisa maior que é mudar."
A classe política do Brasil está angustiada com os mais de 950 depoimentos dados por 77 executivos da Odebrecht, que devem vir a público em breve.
Janot pediu permissão ao Supremo Tribunal para investigar congressistas e ministros, e a divulgação de seus nomes é iminente. Janot já obteve autorização para investigar 54 políticos em 2015, mas não está claro se alguns daqueles nomes estarão na nova lista.
Os congressistas vêm trabalhando há meses para minar a Lava Jato, disse Lima, tentando aprovar medidas de anistia na calada da noite. Até agora estes esforços não deram frutos, e o procurador acredita que o momento passou.
"Assim que se souber quem não está envolvido, o clima entre aqueles que não estão sob investigação ficará mais positivo, e acredito que verão que é inútil tentar aprovar anistias ou outras medidas para permitir que aqueles que são corruptos escapem da Justiça", opinou.
Ele não quis dizer se pensa que as revelações da Odebrecht irão resultar na queda de Temer.
Sérgio Praça, cientista político da Fundação Getúlio Vargas, disse que o governo Temer está na beira do abismo.
Temer vem repetindo que sua prioridade é aprovar reformas que tirem a economia do Brasil da pior recessão de sua história. Ele conseguiu aprovar medidas de austeridade e provavelmente conseguirá fazer alterações no inchado sistema previdenciário, disse Praça.
"Mas assim que os depoimentos da Odebrecht realmente impactarem, mesmo que o governo Temer sobreviva, o que pode muito bem não acontecer, não terá absolutamente nenhuma força política", disse.
"Haverá uma paralisia total. Nenhuma outra reforma irá passar porque este governo irá implodir. Nada será feito até um novo presidente ser eleito."