Fabrício Queiroz: o ex-policial militar tenta explicar desde o fim de 2018 uma “movimentação atípica” em suas contas bancárias de 1,2 milhão de reais, no intervalo de um ano (Nelson Almeida/AFP)
Clara Cerioni
Publicado em 18 de junho de 2020 às 10h20.
Última atualização em 18 de junho de 2020 às 21h08.
Alvo principal da operação realizada na manhã desta quinta-feira, 18, o ex-policial militar Fabrício Queiroz tenta explicar desde o fim de 2018 uma “movimentação atípica” em suas contas bancárias de 1,2 milhão de reais, no intervalo de um ano.
Ele está no centro da investigação do Ministério Público do Rio de Janeiro que apura a prática de "rachadinha" na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), onde trabalhou como assessor do então deputado estadual e hoje senador Flávio Bolsonaro.
Queiroz, que foi segurança e motorista do filho do presidente Jair Bolsonaro entre 2007 e 2018, foi preso nesta manhã no imóvel de Frederick Wasseff, um dos advogados da família Bolsonaro
Desde o fim de 2018, o avanço das investigações reforçou a suspeita de que assessores devolviam parte de seus salários para Flávio. Outros familiares de Queiroz também foram lotados no gabinete do então deputado estadual, e entre os parentes investigados estão a mulher de Queiroz, que também teve pedido de prisão autorizado hoje, a sua enteada e duas filhas.
Os promotores afirmam que Flávio nomeava assessores orientados a devolver parte de seus salários para o grupo e que era responsabilidade de Queiroz coordenar este recolhimento.
Segundo o MP, uma loja de chocolates de Flávio que fica em um shopping da Barra da Tijuca e negócios imobiliários do senador serviam para lavar o dinheiro ilegalmente, e há indícios de que a movimentação do negócio era incompatível com sua atividade comercial.
O Coaf identificou que Flávio recebeu 48 depósitos no valor de 2 mil reais entre junho e julho de 2017. A defesa do senador alega que os pagamentos fracionados, que somaram 96 mil reais, eram relativos à venda de um apartamento. Já Queiroz, quando questionado sobre a movimentação financeira, disse que elas eram fruto da compra e venda de veículos usados.
Ao autorizar os mandados de prisão e de busca e apreensão, o juiz da 27ª Vara Criminal da Comarca do Rio afirmou que “há indícios de que houve a formação de uma organização com alto grau de permanência e estabilidade, composta por dezenas de assessores da Alerj, nomeados por Flávio Bolsonaro, para a prática de crimes de peculato (desvio de dinheiro público) e lavagem de dinheiro”. Foi decretado segredo de justiça no caso.
Na visão de analistas políticos ouvidos pela reportagem, a prisão de Queiroz pode elevar o clima de tensão que já está instaurado no Palácio do Planalto, por conta das múltiplas investigações em curso no Supremo Tribunal Federal contra ele e aliados.
"O presidente, que tem bloqueado os riscos de impeachment sobretudo com a aliança notoriamente frágil com o centrão, vai ficando cada vez mais pressionado. E sabemos, pela experiência da Dilma Rousseff, que esse cerco do judiciário costuma ter um impacto importante na capacidade do presidente de se articular", diz Gabriel Brasil, analista de risco político da Control Risks.
Em sua avaliação, o cerco contra a família Bolsonaro deve alimentar o cenário de já elevada incerteza com relação às condições de governabilidade do presidente. O analista cita que também há a possibilidade de delações premiadas desestabilizarem a estratégia de defesa dos investigados.
"É importante ressaltar que o caso Queiroz envolve diretamente a família do presidente, cuja defesa ele já mostrou ser sua maior prioridade, mesmo em detrimento de agendas políticas importantes do governo", diz.
André Perfeito, economista-chefe da Necton, prevê reações econômicas à prisão de Queiroz a depender da reação de Bolsonaro, que ainda não se posicionou sobre a operação desta manhã. "Meu receio é que numa situação que nem esta atitudes impensadas ou precipitadas ocorram no Palácio do Planalto", avalia.
Nesta semana, a militante extremista Sara Winter, aliada de Bolsonaro, foi presa na ação que investiga o financiamento e a realização de atos antidemocráticos, que contaram com a participação do presidente. Deputados bolsonaristas e o blogueiro do Terça Livre, Allan dos Santos, também foram alvo de busca e apreensão no mesmo inquérito. O ministro Alexandre de Moraes, do STF, autorizou, ainda, a quebra dos sigilos bancários de dez deputados e um senador bolsonaristas.
Após as operações contra aliados, o presidente falou, sem citar os mandados, em “abusos” e disse que tomará todas as medidas legais para proteger a Constituição porque não pode “fingir naturalidade” diante do que está acontecendo. “Luto para fazer a minha parte, mas não posso assistir calado enquanto direitos são violados e ideias são perseguidas”, escreveu o presidente nas redes sociais. “Por isso, tomarei todas as medidas legais possíveis para proteger a Constituição e a liberdade dos brasileiros”.
(Com informações da Agência O Globo)