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Por que cortar ministérios de Dilma não fará diferença

Analistas consultados por EXAME.com listam as medidas que seriam mais eficazes para colocar em ordem as contas do país

Dilma Rousseff: a opinião dos analistas é de que o pacote proposto pela presidente está fadado ao fracasso (REUTERS/Ueslei Marcelino)

Dilma Rousseff: a opinião dos analistas é de que o pacote proposto pela presidente está fadado ao fracasso (REUTERS/Ueslei Marcelino)

Raphael Martins

Raphael Martins

Publicado em 23 de setembro de 2015 às 11h28.

Última atualização em 2 de agosto de 2017 às 13h26.

São Paulo – Como parte das medidas do pacote fiscal, o governo federal deve apresentar hoje (23) a reforma ministerial, que pode encerrar as atividades de 10 pastas da gestão Dilma Rousseff. A expectativa é de que o corte renda uma economia de R$ 200 milhões.

De um pacote que pretende arrecadar um total de R$ 32 bilhões, o enxugamento de ministérios tem mais importância política que econômica. Para analistas consultados por EXAME.com, a medida serve mais de alívio às pressões que Dilma sofre da oposição e de alguns setores da sociedade do que em economia real. Em termos práticos, o corte representa nada em soluções para reverter a crise.

Por outro lado, ter menos ministros só serve como pressuposto para agravar uma crise com a já abalada coligação parceira, uma vez que ao menos 10 membros da base aliada perderão seus postos. Fora isso, grande parte da arrecadação está baseada em aumento de tributos, através da recriação da CPMF.

“O pacote está fadado ao fracasso. Quando você tem essa situação em que o governante foi identificado pela população como responsável pelo descontrole das contas públicas, o nível de resistência é muito forte”, afirma José Matias-Pereira, professor de Administração Pública da Universidade de Brasília. “A crise está evidenciando que o Brasil já vem protelando há muito tempo algumas reformas estruturais. Essa reformas só podem ser feitas por um dirigente com credibilidade.”

Entre os fatores mais efetivos, que aliviariam o caixa em curto, médio e longo prazo, foram citados reformas na previdência, renegociação da dívida pública, reformulação dos cargos na administração pública e eficiência nos gastos.

Veja abaixo como pensam os especialistas.

Previdência social

Segundo os especialistas, a previdência social é a que mais sofre de um “defeito estrutural”. Hoje, as leis definem que os trabalhadores em atividade financiem o fundo que dá suporte aos aposentados. Mas, em virtude do aumento da expectativa de vida, o atual sistema gera déficits estimados em R$ 90 bilhões para esse ano, ou três vezes mais que o que se pretende arrecadar pela CPMF.

“Os governantes não gostam dessas reformas e arcar com esse ônus, pois gera pressões e perdas de votos. Se esse modelo atual continuar, seguirá dando prejuízos até um ponto insustentável”, diz Matias-Pereira, da UnB.

A proposta da maior parte dos especialistas consultados é que a previdência inicie um novo sistema, começando do zero. Aliado ao sistema vigente, a ideia é ir substituindo aos poucos por um fundo de previdência, dedicado exclusivamente à gestão desse dinheiro para retornar ao contribuinte mais adiante.

“Podem ser estruturados fundos de pensão por categoria e auto-geridos”, diz Ricardo Sennes, da consultoria política Prospectiva. “Não faz sentido esse tema seguir no orçamento federal.”

Do ponto de vista jurídico, no entanto, a reforma da previdência esbarraria na criação de projetos de emenda constitucional e convencimento de um Congresso que não vem colaborando com as propostas do Planalto.

“É preciso vontade política, pois é uma briga grande, com fórmulas jurídicas mais desafiadoras”, afirma Floriano Peixoto de Azevedo Marques Neto, professor do departamento de Direito do Estado da Faculdade de Direito da USP. “Deve ser discutido se o Estado vai gerir esse fundo, se será privado e como será desenvolvido, por exemplo. As negociações podem levar 3 dias ou 3 anos.”

Eficiência

Segundo os analistas, outro grande problema estrutural e que gera gastos é a ineficiência do funcionário e da gestão pública. A ideia é fortalecer os sistemas de controle e fiscalização do país, para evitar desvios e desperdícios, algo que elevado ao máximo gera a faísca para esquemas de corrupção.

O caso mais marcante é o esquema descoberto pela Operação Lava Jato, cujos desvios foram comandados por funcionários indicados para as estatais. Um marco recente de desperdício foi a renovação da frota de carros oficiais do Senado, gasto estimado em R$ 2 milhões.

“A crise é fruto da dificuldade de seguir princípios de boa governança. É isso o que leva a uma má aplicação dos recursos”, diz Geraldo Loureiro, diretor do Instituto Brasileiro de Governança Pública.

Para Marques Neto, da USP, uma boa fonte de corte seriam os cargos comissionados. Dos 22 mil trabalhadores — que por serem fruto de indicação não são necessariamente capacitados para as posições que ocupam —, cerca de 40% poderiam ser dispensados sem grandes prejuízos para o funcionamento da máquina pública.

“Se o presidente de uma empresa fosse escolher seus diretores, ele buscaria os melhores para não colocar em risco seu capital”, afirma Loureiro, do IBGP. “No Brasil, isso não existe, ministros e secretários são frutos de indicação para satisfazer necessidades políticas. Basta ver a confusão que criará o corte de ministérios.”

Para os entrevistados por EXAME.com, outro fator que geraria retorno e reforço no caixa é o que parece mais óbvio: investimento em educação. Com mão de obra mais capacitada, seria possível cobrar mais produtividade do trabalhador brasileiro, gerando competitividade e dando mais retorno à já pesada carga de tributos. “É algo para pensar em resultados daqui 30 anos”, diz Matias-Pereira, da UnB.

Saída à esquerda

Para Pedro Fassoni Arruda, professor do departamento de política da PUC-SP, não há consenso sobre as medidas de corte. Para o acadêmico, o fundamental para acertar as contas do governo é priorizar os investimentos públicos para gerar emprego e dar gás à economia, além de renegociar a dívida pública, principal responsável por comprometer o orçamento.

“Retirar direitos não é a saída. Apesar de ser um governo considerado de esquerda, é uma gestão que vem se alinhando com os desejos do capital financeiro e dos credores estrangeiros”, diz. “A alta de juros só aumenta os encargos da dívida pública, complicando ainda mais a situação. Cada ponto percentual a mais da taxa Selic significa o comprometimento de alguns bilhões no orçamento federal.”

Além de uma auditoria da dívida externa, Arruda diz que é preciso também uma reforma tributária para taxar os contribuintes de forma proporcional. Como medida paliativa, Arruda é favorável à restauração da CPMF para não sacrificar investimentos em educação ou saúde.

“O sistema que temos é regressivo, os ganhos de capital são muito pouco tributados”, afirma. “Diminuir impostos sobre consumo e aumentá-los de acordo com a renda. Nesse sistema, os pobres pagam a maior quantidade de tributos, enquanto poderiam ser taxadas as grandes fortunas para aumentar a arrecadação.”

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