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Por coronavírus, Bolsonaro corre risco de perder apoio popular

Para o cientista político Ian Bremmer, o fato de o presidente brasileiro diminuir a gravidade da pandemia pode impactar sua relação com o Congresso

Ian Bremmer, fundador e presidente do grupo Eurasia: condução da crise do coronavírus pode ter impacto negativo sobre investidores (Universidade Johns Hopkins/Divulgação)

Ian Bremmer, fundador e presidente do grupo Eurasia: condução da crise do coronavírus pode ter impacto negativo sobre investidores (Universidade Johns Hopkins/Divulgação)

FS

Fabiane Stefano

Publicado em 27 de março de 2020 às 18h54.

Última atualização em 27 de março de 2020 às 19h24.

As opiniões do presidente Jair Bolsonaro sobre a gravidade da pandemia do coronavírus começam a atrair as atenções no exterior.

O cientista político americano Ian Bremmer, presidente do grupo Eurasia, uma das maiores consultorias de riscos políticos globais, tem feito duras críticas a Bolsonaro.

“Há muita concorrência, mas o líder mundial mais ineficaz nas respostas ao coronavírus agora é o presidente brasileiro Jair Bolsonaro”, publicou no dia 22 de março em sua conta do Twitter.

Logo após o pronunciamento do presidente em rede nacional, em 24 de março, no qual Bolsonaro criticou as medidas de isolamento adotadas pelos estados brasileiros, Bremmer fez novamente duros comentários.

“O discurso de Bolsonaro à nação faz Trump parecer um líder mundial modelo”, publicou. O presidente americano Donald Trump também é frequentemente criticado por Bremmer.

Em entrevista à EXAME, Bremmer analisa o impacto político e econômico da atuação de Bolsonaro diante da pandemia.

No Twitter, você tem criticado fortemente as posições do presidente Jair Bolsonaro, que é contra medidas de isolamento adotadas pelos estados no Brasil. Quais são os riscos que o presidente brasileiro corre diante da gravidade da pandemia?

Não tomar medidas para proteger adequadamente sua população, enquanto todas as outras grandes economias do mundo — desenvolvidas e emergentes — estão trabalhando o máximo possível para se antecipar a isso, é incrivelmente perigoso. Esse é um vírus que não temos imunidade e a vacina ainda deve levar, no mínimo, um ano para ficar disponível. De fato, essas posições do presidente Bolsonaro já atingiram muito seu próprio governo. As pesquisas domésticas agora mostram amplo apoio a medidas de isolamento social. Portanto, politicamente, ele corre o risco de perder o apoio popular adotando essa abordagem.

Dito isso, não se pode descartar a possibilidade de que Bolsonaro lá na frente se beneficie das medidas de contenção adotadas pelos governadores e, ao mesmo tempo, culpá-los pela freada econômica. Portanto, existe um caminho para que Bolsonaro saia intacto dessa crise. Mas jogar politicamente com uma crise como essa é a pior decisão possível. E ele corre um risco real, sim, do ponto de vista da opinião pública.

O presidente Bolsonaro argumenta que o bloqueio impactará a economia brasileira. “Os empregos devem ser mantidos. O sustento das famílias deve ser preservado. Temos de voltar à normalidade”, afirmou ele na TV. É possível fazer esse tipo de escolha agora?

Há uma desvantagem em fazer esse tipo de escolha no momento. Isso é especialmente verdade em relação ao Brasil, que não tem o mesmo tipo de resiliência econômica que normalmente vemos nas economias industriais avançadas. Portanto, não é loucura se preocupar com o custo econômico que as medidas agressivas terão sobre o povo brasileiro. Mas ainda é muito cedo para tomar essa decisão. Todos precisamos de mais informações sobre o escopo do perigo e como o desligamento dos negócios está impactando a contenção da propagação da doença, antes de tomar uma decisão sobre quando e como reiniciar a economia do país.

Como os investidores podem reagir ao discurso do presidente Bolsonaro que contradiz as ações dos outros líderes globais?

Negativamente. No grupo Eurasia, rebaixamos a trajetória de curto e longo prazo do país. Antes do coronavírus, Bolsonaro e o Congresso estavam trabalhando juntos no conjunto mais abrangente de reformas econômicas de qualquer país em desenvolvimento no mundo. Isso agora se torna muito mais desafiador. Mas, no curto prazo, os investidores estão analisando se o pacote de ajuda ao setor privado e os trabalhadores forçados a ficar em casa são medidas temporárias. Se não forem, podem minar a solvência do Brasil. A boa notícia é que parece que o Congresso seguirá o plano da equipe econômica de manter o pacote temporário e provavelmente aumentará o tamanho e o escopo de qualquer ajuda anunciada. Os investidores devem reagir bem a isso.

O presidente Bolsonaro tem se envolvido em muitas controvérsias desde que assumiu o cargo. No ano passado, ganhou atenção internacional por suas posições em relação à Amazônia brasileira e por críticas a ambientalistas. Agora, são suas opiniões sobre a pandemia que atraem críticas. Até que ponto os líderes podem se envolver em controvérsias como essas?

Para Bolsonaro, o lado positivo da atual crise é, devido ao coronavírus, haver muito menos foco em seus erros em relação às mudanças climáticas. E, de modo geral, questões ambientais não receberão a mesma prioridade dos líderes mundiais neste ano.

Quando se trata de coronavírus, a reação internacional contra Bolsonaro não tem sido tão acentuada. O acordo comercial com a União Europeia não foi inviabilizado e as relações com o presidente americano Donald Trump permanecem ativamente positivas. Ele também tem sido pragmático com os chineses. Mais problemáticas são suas relações domésticas e sua capacidade de manter uma coalizão reformista.

Nos últimos dias, protestos e panelaços acontecem quase diariamente nas grandes cidades brasileiras. Existe o risco de o presidente brasileiro não conseguir completar seu mandato?

Não no curto prazo, em razão do escopo da crise atual. E o Congresso certamente não quer seguir o caminho do impeachment novamente. Mas, na pior das hipóteses, o impedimento do presidente é viável e é um risco a se observar após o término da atual crise de saúde.

 

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