Cinquenta e quatro policiais foram presos nesta terça-feira, 18 (Marcelo Camargo/ABr/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 19 de dezembro de 2018 às 09h27.
Última atualização em 19 de dezembro de 2018 às 09h27.
São Paulo - Cinquenta e quatro policiais foram presos nesta terça-feira, 18, sob a acusação de terem montado uma organização criminosa dentro do 22.º Batalhão da Polícia Militar para achacar traficantes de drogas ligados ao Primeiro Comando da Capital (PCC) na zona sul de São Paulo. Os PMs exigiriam propina avulsa e mesada para devolver drogas apreendidas, soltar funcionários de traficantes, avisar quando outros colegas se aproximavam dos pontos de drogas e até para prender traficantes concorrentes dos bandidos.
A Corregedoria da PM listou 52 casos, que juntos reúnem 122 acusações contra os policiais. A eles, os responsáveis pelas investigações imputaram oito tipos diferentes de crime: corrupção, concussão, falsidade ideológica, violação de sigilo funcional, associação para o tráfico, peculato, prevaricação e organização criminosa. Nesta terça, seis deles foram autuados em flagrante por tráfico - um guardava entorpecente no armário, no batalhão, e o outro em casa - e porte ilegal de armas. Dez armas foram apreendidas, além de R$ 80 mil.
O capitão Rodrigo Elias da Silva, da Corregedoria da PM, representou à 1.ª Auditoria da Justiça Militar pela decretação da prisão de 54 policiais. Ele pediu ainda - com a concordância do Ministério Público - a expedição de mandados de prisão contra cinco acusados de tráfico ligados à facção criminosa, quatro dos quais foram presos nesta quarta. Também foram requisitados 70 mandados de busca e apreensão.
O juiz Ronaldo João Roth decretou as 59 prisões preventivas e expediu os 70 mandados de busca em 19 municípios em 3 Estados (Rio, São Paulo e Minas). Eram 6 horas quando 450 policiais - 280 da Corregedoria e 170 do 2.º Batalhão de Choque -, acompanhados por promotores do Grupo Especial de Repressão ao Crime Organizado (Gaeco), deflagraram a fase Katrina da Operação Ubirajara - nome do bairro onde a investigação começou, na zona sul.
Katrina é uma referência ao furacão que devastou o sul dos Estados Unidos em 2005. A operação resultou em uma das maiores prisões em massa efetuadas pela Corregedoria na história. Entre os acusados não há oficiais. São 1 subtenente, 7 sargentos, 13 cabos e 33 soldados.
Em 3 de fevereiro de 2018, uma denúncia anônima chegou aos homens da Corregedoria. Segundo ela, policiais haviam abordado três pessoas naquele bairro. Os acusados estariam com drogas, mas, em vez de levar o trio para o 98.º Distrito Policial (Jardim Miriam), dois soldados teriam recebido o suborno de Sandro Gomes da Silva - capturado nesta quarta. Eles liberaram os dois maiores detidos e levaram à delegacia só uma adolescente. Em troca, receberam R$ 6 mil no dia 8. No dia 9, telefonaram para Silva, exigindo mais R$ 4 mil.
A Corregedoria passou a monitorar telefones que seriam usados pelos PMs nos achaques e descobriu a rede que envolvia dezenas de policiais no esquema de recolhimento de propinas no 22.º Batalhão. Ao todo, os corregedores ouviram 82 mil ligações telefônicas. Um dos traficantes que pagaria um mensalinho para os policiais seria Julio Cesar Oliveira Silva, o Revolta.
A Corregedoria monitorou entregas de dinheiro para policiais nos dias 25 de março, 14 e 20 de abril, 15 e 18 de maio e 12 e 23 de junho. Mais de uma dezena de policiais foram flagrados apenas nos achaques feitos contra Revolta, apontado como integrante do PCC. Em troca de até R$ 1,5 mil fixos, além de pagamentos extras, os policiais deixaram os pontos de droga do acusado funcionarem em Cidade Ademar.
O valores das propinas investigadas variavam de R$ 300 a R$ 10 mil. Em 23 de junho, Revolta entregou R$ 300 para uma soldado, metade do valor pago pelo acusado para seu companheiro, um soldado, que foi buscar o dinheiro em sua moto, durante a folga - as propinas também eram pagas durante o serviço.
Em outra ocasião, os PMs pediram R$ 50 mil para soltar um traficante envolvido com o tráfico de armas e munições para fuzis. Era 11 de abril. Como o bandido alegou não ter o dinheiro, os PMs aceitaram dar um desconto. Primeiro, a propina caiu para R$ 20 mil; depois, para R$ 5 mil e, finalmente, para R$ 4 mil, pagos em duas parcelas. O dinheiro foi dividido entre quatro PMs.
Durante seis dias, os policiais da Corregedoria da Polícia Militar acompanharam um caso classificado por um dos investigadores como "retrato da falta de ética entre os bandidos". Um soldado, conhecido como Ceará, aceitou a proposta de R$ 3 mil feita por Victor Matheus Ferreira Bastos - um dos acusados de tráfico presos nesta quarta - para "montar um time" e prender seu sócio, o também traficante conhecido como Bruno. Bastos queria assumir sozinho o controle do ponto de venda de drogas. Ceará buscou então ajuda de dois sargentos e um soldado para fazer a prisão.
No dia 27 de junho, o time providenciado pelo soldado Ceará deteve Bruno. Mas, em vez de levá-lo para a cadeia, decidiu tomar R$ 4.550 para deixá-lo solto. Ceará contou o que se passou para o traficante que o contratou e garantiu que "se recusou" a receber o dinheiro da propina paga pelo sócio de Bastos.
No dia 27 de maio, outros três PMs detiveram um integrante do PCC, que foi liberado após a abordagem. Os policiais, no entanto, ficaram com a droga apreendida e exigiram R$ 2 mil. Receberam apenas R$ 500, mas conseguiram transformar a tomada de dinheiro acidental em uma mesada quinzenal que o PCC passou a dar para os policiais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.