Flores são depositadas na fachada da Boate Kiss após o incêndio que matou mais de 230 pessoas em Santa Maria: os donos do estabelecimento não forneceram à polícia imagens da noite do ocorrido (REUTERS/Edison Vara)
Da Redação
Publicado em 29 de janeiro de 2013 às 18h33.
A polícia investiga se foram ocultadas provas do incêndio na boate em Santa Maria, Rio Grande do Sul, onde 231 pessoas morreram, enquanto autoridades brasileiras anunciaram que as fiscalizações para evitar novas tragédias desse tipo serão reforçadas.
As autoridades suspeitam que a boate, repleta de estudantes universitários que participavam de uma festa, estava superlotada no momento do acidente, e investigam o suposto desaparecimento de um computador que armazenava imagens das câmeras de segurança.
A polícia também busca o registro de caixa, que permitiria comprovar quanta gente estava presente no local na hora do acidente.
O Brasil, sede da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016, no Rio de Janeiro, encontra-se sob pressão internacional para demonstrar que é capaz de garantir a segurança em grandes eventos públicos.
Quatro supostos responsáveis pelo incêndio foram presos na segunda-feira para facilitar a investigação: os dois donos da boate e dois integrantes do grupo musical Gurizada Fandangueira que utilizou sinalizadores no palco da boate Kiss.
"As câmeras de segurança não estavam no local, não havia nenhum computador com armazenamento de dados", disse a promotora Veruska Agostine à imprensa.
Para Veruska e seu colega Joel Oliveira Dutra, responsáveis pelo caso, o fato de os donos da boate não terem fornecido estas imagens à polícia é muito grave.
Os donos da boate declararam que o sistema de vigilância não funcionava há dois meses.
O incêndio foi provocado pelo uso de sinalizadores em um local fechado, porque havia muita gente no local e porque houve portas trancadas no momento da evacuação, afirmou à AFP o major Gerson da Rosa Pereira, do corpo de bombeiros de Santa Maria.
O alvará da boate estava vencido, segundo a polícia e os bombeiros. O local não tinha saídas de emergência e sua única porta de entrada e saída, segundo sobreviventes, não estava sinalizada e era bloqueada por barreiras que dificultaram a fuga.
Muitos jovens confundiram a saída com a porta dos banheiros, onde a polícia encontrou 180 cadáveres.
Outras testemunhas disseram que, no início, os seguranças bloquearam a saída para tentar cobrar a conta dos frequentadores, e que ao menos um extintor de incêndio não funcionou.
Estima-se que 90% das vítimas morreu por asfixia, em meio a um tumulto provocado pelo pânico e a uma nuvem de fumaça negra tóxica, que lhes impediu de achar a saída.
A polícia também busca saber que membro da banda levou os sinalizadores ao local e os ativou.
Dos mais de 100 feridos, 75 encontram-se em unidades de terapia intensiva e correm risco de vida, segundo o ministro da Saúde, Alexandre Padilha.
Prefeitos de várias cidades do país, como Manaus, Salvador, Curitiba, Cuiabá e Porto Alegre, anunciaram uma fiscalização mais rigorosa das boates durante sua reunião anual com a presidente Dilma Rousseff, realizada na segunda-feira.
O presidente da Câmara de Deputados, Marco Maia, anunciou a criação de uma comissão para redigir um projeto de lei federal sobre a concessão de licenças para locais públicos e prevenção de incêndios, para unificar as regras municipais e estatais.
O prefeito de Manaus, Arthur Virgílio Neto, informou que as boates "que estiverem irregulares, oferecendo riscos aos usuários, serão fechadas e terão os alvarás suspensos", indicou o jornal O Globo.
Na segunda-feira, 15 boates e bares de Manaus foram fechados e multados por diversas irregularidades.
A Defensoria do Rio Grande do Sul pediu o bloqueio dos bens da empresa proprietária da boate e de seus donos para "assegurar o direito das pessoas a terem garantida futura indenização, de modo coletivo e igualitário a todos os familiares das vítimas da tragédia", afirmou o defensor público-geral do Estado, Nilton Arnecke Maria.
Em Santa Maria, a tristeza dos familiares deu lugar à raiva e à exigência de justiça.
"Justiça, justiça, justiça!", clamaram mais de 15.000 pessoas que percorreram as ruas do centro de Santa Maria na noite de segunda-feira, vestidas de branco.
"Sei que a minha filha não volta, mas alguém tem que pagar por isso", disse à AFP Jorge Neves, pai da jovem Rafaella, falecida no domingo.