Ágatha: Além dela, desde o início do ano outras seis crianças foram mortas durante tiroteios em comunidades (Sergio Moraes/Reuters)
Clara Cerioni
Publicado em 19 de novembro de 2019 às 10h34.
Última atualização em 19 de novembro de 2019 às 11h00.
São Paulo — A Polícia Civil do Rio de Janeiro concluiu nesta terça-feira (19) que Ágatha Félix, assassinada em 20 de setembro, dentro de uma Kombi no Complexo do Alemão, foi morta por um tiro de fuzil da Polícia Militar.
De acordo com a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC), que liderou as investigações, o policial atuava na Unidade de Polícia Pacificadora (UPP) da Fazendinha e tentou atingir dois homens que passavam em uma moto. O projétil, no entanto, ricocheteou e atingiu a menina de 08 anos que estava no interior do veículo.
Essa versão inclusive que havia sido relatada por familiares de Ágatha e pelo próprio motorista da kombi. Inicialmente os policiais afirmaram que houve troca de tiros, versão sempre contestada pelas testemunhas.
Segundo reportagem do jornal Extra, o inquérito aponta que o PM que efetuou o disparo "estava sob forte tensão devido à morte de um colega três dias antes e, por isso, pode ter confundido uma esquadria de alumínio que o garupa segurava com uma arma".
A conclusão do caso foi encaminhado ao Ministério Público do RJ, que fará as diligências judiciais. A DHC acusa o policial de homicídio doloso (quando há intenção de matar), requer seu afastamento da UPP e pede a proibição de contato com qualquer testemunha que não sejam policiais militares.
A Polícia Militar informou, por meio de nota, que “lamenta o triste episódio da pequena Ágatha e reforça solidariedade à família”. A PM disse ainda que está dando apoio à investigação da Polícia Civil e que apura a ocorrência por meio de um Inquérito Policial Militar (IPM). Ainda segundo a PM, o cabo está afastado de suas atividades nas ruas.
No dia 03, a revista VEJA publicou que um grupo de policiais militares havia invadido o Hospital Getúlio Vargas, na Penha (zona norte do Rio), um dia após a morte de Ágatha, para exigir dos funcionários a entrega da bala que matou a menina; Conforme a revista, os médicos se recusaram a entregar a bala, e os policiais foram embora.
O assassinato de Ágatha gerou forte comoção e várias autoridades, como o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, postaram sobre o assunto nas redes sociais.
O caso também desencadeou um onda de questionamentos sobre a área de segurança pública do governo de Wilson Witzel (PSC), que desde a campanha defende uma política de confronto no enfrentamento ao crime organizado. Além de Ágatha, desde o início do ano outras seis crianças foram mortas durante tiroteios em comunidades.
Menos de uma semana depois, publicou um decreto que modifica as regras para concessão de gratificação a policiais por redução de indicadores de criminalidade no Rio de Janeiro. O novo decreto deixa de considerar a redução dos homicídios decorrentes de intervenção policial como uma meta estratégica para a concessão da gratificação.
Entre janeiro e setembro, o número de mortes por intervenção de agentes do Estado subiu 19% no estado do Rio na comparação com 2018. Foram 1.402 casos, contra 1.183 no ano passado.
Dias após a morte de Ágatha, movimentos de favelas também fizeram uma denúncia formal à Organização das Nações Unidas (ONU) contra o governador. O documento foi encaminhado à alta comissária da ONU para Direitos Humanos, Michele Bachelet, e à Relatoria Especial sobre Execuções Sumárias e Extrajudiciais.
Os grupos pedem ao Alto Comissariado da ONU uma resposta pública e incisiva cobrando o Estado Brasileiro e também que apontem que Witzel violou obrigações de direito internacional ratificadas pelo Estado brasileiro. Ainda não há um posicionamento da organização sobre o caso.