Pobreza: evolução regional foi afetada pela situação econômica do Brasil e da Venezuela (Marco Bello/Reuters)
Agência Brasil
Publicado em 20 de dezembro de 2017 às 21h49.
Os níveis médios de pobreza e de extrema pobreza aumentaram na América Latina em 2015 e 2016, segundo estudo da Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), divulgado nesta quarta-feira (20).
Em 2016, o número de pessoas em situação de pobreza chegou a 186 milhões (30,7% do total de habitantes), das quais 61 milhões localizam-se na faixa de pobreza extrema.
A evolução regional foi afetada pela situação econômica do Brasil e da Venezuela, de acordo com a Cepal. Estes foram os únicos que registraram aumento real da pobreza.
Se os dois países fossem excluídos da análise, a tendência entre 2015 e 2016 seria de diminuição da pobreza total de 1% e de 0,5% da extrema na região.
No caso do Brasil, a avaliação foi feita a partir de estimativas do órgão vinculado às Nações Unidas, pois não foram disponibilizados dados oficiais relativos a esses anos.
A análise da situação de 18 países concluiu que o total de pobres era de 168 milhões (28,5% do total) em 2014 e 178 milhões (29,8%) em 2015.
Já o de pessoas na pobreza extrema passou de 48 milhões (8,2%) em 2014, para 54 milhões em 2015 e 61 milhões (10%), em 2016.
De acordo com o relatório Panorama Social da América Latina 2017, o crescimento demarca uma mudança na região, já que os índices de pobreza caíram entre 2002 e 2014, como resultado de políticas de distribuição de renda, reformas tributárias e outras de combate à desigualdade.
A secretária executiva da Cepal, Alicia Bárcena, apresentou os dados em entrevista coletiva no México, transmitida pela internet.
Ela destacou que a incidência da pobreza e da extrema pobreza é mais elevada entre grupos sociais específicos, como crianças, adolescentes, jovens, mulheres e a população que mora em áreas rurais.
No ano passado, a pobreza afetava 46,7% das crianças e adolescentes até 14 anos e a extrema pobreza, 17%. No caso dos jovens de 15 a 29 anos, os percentuais eram de 31,1% e 9,5%, respectivamente.
Entre as mulheres, a pobreza e a pobreza extrema cresceram na faixa dos 15 aos 29 anos, considerada de idade produtiva.
A Cepal prevê recuperação do crescimento econômico neste ano, mas alerta que este não é o único fator que importa para a redução da pobreza.
"É verdade que emprego, geração de renda e maior atividade econômica são importantes, mas o que também é fundamental é que se fortaleçam os sistemas de proteção social", disse Alicia, que destacou a importância das políticas de transferência vinculadas a estratégias de redução da pobreza e da expansão dos sistemas previdenciários.
O Panorama Social da América Latina 2017 também discute a desigualdade de renda e sua relação com a dinâmica do mercado de trabalho, bem como os efeitos dos sistemas de pensão em matéria de igualdade.
De acordo com a Cepal, a desigualdade de renda caiu na região entre os anos de 2002 e 2016.
O Índice Gini médio entre países passou de 0,538, em 2002, para 0,467 no ano passado, diz a comissão, que é vinculada à Organização das Nações Unidas (ONU).
No caso, 0 representa ausência de desigualdade e 1, desigualdade máxima. A Cepal alerta, porém, para a redução do ritmo de queda, especialmente nos últimos três anos.
O Coeficiente, ou Índice, de Gini é um dado estatístico usado para avaliar a distribuição das riquezas de um determinado lugar.
Na entrevista, Alicia Bárcena fez um apelo para que os países fortaleçam políticas laborais e de proteção social. Ela defendeu uma "mudança estrutural progressiva na economia", com a implementação dos Objetivos pelo Desenvolvimento Sustentável (ODS), que conformam a chamada Agenda 2030.
Entre os objetivos, estão a erradicação da pobreza, a obtenção da igualdade de gênero e o desenvolvimento de ações para combater as mudanças climáticas.
Na avaliação da Cepal, as pensões foram essenciais para reduzir a pobreza entre idosos na região.
Expressão disso, a porcentagem da população economicamente ativa que paga algum sistema previdenciário passou de 36,9% para 47,8% entre 2000 e 2014.
Entre 2002 e 2015, o percentual da população de 65 anos ou mais que recebeu algum tipo de pensão passou de 53,6% para 70,8%.
A comissão regional da ONU alerta, contudo, para o fato de os valores recebidos serem baixos.
Além disso, trabalhadores da zona rural com menos escolaridade e em setores de menor produtividade continuam mais descobertos. A desigualdade de gênero também é marcante.
Em geral, mulheres têm menor nível de cobertura e as diferenças de valores nos benefícios que recebem superam 20 pontos percentuais em 10 dos 17 países analisados, podendo alcançar 40 pontos percentuais.
A Cepal avalia o processo de envelhecimento da população latino-americana e caribenha e constata que, em 2040, as pessoas de 60 anos ou mais superarão as que têm até 14 anos.
Apenas as que têm mais de 80 anos aumentarão quase 20 milhões. O envelhecimento fica nítido quando comparadas as taxas de crescimento dos diferentes grupos.
Enquanto o grupo de pessoas de 60 anos ou mais crescerá 3,4% por ano entre 2015 e 2040, a população de 20 a 59 anos crescerá 0,5% ao ano no mesmo período. Já a população com idade inferior a 20 anos diminuirá na mesma proporção.
O número de mulheres idosas tende a crescer mais que o de homens. Isso preocupa a Cepal, ao constatar que já existe desigualdade de gênero nos sistemas de pensões, seja por via direta, no próprio desenho dos sistemas, ou indireta, derivada da trajetória das mulheres no mercado de trabalho, que ganham menos e têm cotizações interrompidas por causa da vida reprodutiva.
Além disso, como a tarefa de cuidar de crianças e idosos costuma caber às mulheres, a Cepal sugere que os países caminhem rumo à igualdade, garantindo que elas permaneçam no mercado e satisfaçam suas aspirações.
O relatório divulgado pela Cepal recomenda prioridade para a consolidação de políticas ou sistemas integrados de cuidados nos países, a universalização do acesso aos serviços de saúde e ao desenvolvimento de políticas específicas para garantir proteção social a todos os idosos, "considerando o redesenho dos sistemas de pensão para permitir que esse grupo tenha acesso à segurança econômica".
No Brasil, atualmente, existem 58 pessoas de 60 anos ou mais para cada 100 menores de 15 anos. Em 2030, serão 104. Em 2050, 201.
O país ocupa a 17ª posição no ritmo de envelhecimento entre 38 nações analisadas, ficando atrás, entre outros, de Cuba, que será o mais envelhecido da região a partir de 2040.
Ainda que considere que os desafios para esses sistemas serão maiores a partir de 2020, pois aumentará a dependência dos mais velhos, como Brasil e Argentina, o estudo conclui que é necessário que os estados consolidem sistemas de pensões de cobertura universal e com forte componente de solidariedade para a igualdade.
Para tanto, o estudo recomenda que os estados busquem ampliar a cobertura; melhorar a solidariedade do componente contributivo mediante regras para os cotizantes que beneficiem os setores com pensões insuficientes transferências financiadas com rendas gerais ou mediante solidariedade contributiva; integrar os esquemas contributivos e não contributivos (em uma lógica de direitos universais); manter os incentivos à contribuição e garantir a sustentabilidade financeira, com a integração de uma perspectiva de igualdade de gênero em sua formulação.