Rio de Janeiro: relatório de dois meses da intervenção mostrou que o número de chacinas dobrou e o de tiroteios aumentou 15,6% (Tânia Rêgo/Agência Brasil)
Agência Brasil
Publicado em 13 de junho de 2018 às 19h02.
A transição do comando da intervenção federal no Rio de Janeiro para as corporações e secretarias do estado da área de segurança já está planejada. Segundo o interventor, general Walter Braga Netto, a partir de outubro começa o trabalho de transição, com a aquisição de equipamentos terminando em dezembro, junto com a intervenção, e a desmobilização logística, patrimonial e contábil programada de janeiro a junho de 2019.
De acordo com ele, todo o trabalho está sendo planejado em conjunto com a Polícia Militar, Polícia Civil e Secretaria de Estado de Administração Penitenciária, que já compõem os grupos de trabalho do Gabinete da Intervenção Federal (GIF).
"Nós já estamos com o plano de transição e legado prontos, estamos revisando. Outubro, novembro e dezembro é a transição, término das aquisições e continuação das medidas estruturantes. Pelo decreto, a intervenção acaba aqui [em dezembro], mas de janeiro a junho desmonta-se o gabinete e fica um núcleo para poder fazer essa transição."
Braga Netto participou hoje (13) de um seminário sobre a intervenção na Associação Comercial do Rio de Janeiro (ACRJ), onde falou por mais de uma hora sobre o trabalho do gabinete. Após a apresentação, ele não conversou com a imprensa. Segundo a assessoria do GIF, Braga Netto vai apresentar o planejamento amanhã ao presidente Michel Temer em Brasília.
O general destacou que pretende deixar uma agenda positiva como legado, com procedimentos que poderão ser replicados em outros estados, como a integração das inteligências e o fortalecimento das corregedorias das polícias, que já foram feitas no Rio.
"Eu não tenho dúvida de que a intervenção dará certo, vai ser um case de sucesso. Criticam que para tudo o que foi feito não precisaria da intervenção. Mas não foi feito! Tem que ver a situação financeira do estado, que não podia receber dinheiro, talvez sem a intervenção não houvesse conseguido chegar nesses resultados. Me perguntam se a intervenção tem que se repetir nos outros estados? Não. O método sim, mas não há necessidade de prosseguimento, desde que se siga o método e dê continuidade".
O subchefe do GIF, general de brigada Paulo Roberto Pimentel, detalhou que integrantes dos órgãos de segurança pública já trabalham dentro do gabinete. "Esses agentes que estão no GIF hoje darão continuidade com o compromisso assumido nesse processo. E finalmente um legado que terá que ser administrado".
A socióloga Sílvia Ramos, coordenadora do Observatório da Intervenção, que reúne várias entidades da sociedade civil e faz o acompanhamento diário dos trabalhos na segurança pública desde fevereiro, também participou do seminário e disse as operações têm sido feitas com muito efetivo e pouco resultado prático em termos de prisões e apreensões.
"Ministros e secretários disseram que haveria grandes reestruturações, mas nem os comandantes locais dos batalhões mais problemáticos, mais violentos e mais suspeitos de corrupção estão sendo modificados. Então dá a impressão que está sendo feita muita operação, muito tiro, produzindo até mais mortes do que antes e que poucas mudanças estruturais estão sendo realizadas. Ou seja, estamos utilizando pouca inteligência, pouca mudança de estrutura, muito confronto e muito tiroteio".
Em abril, o relatório de dois meses da intervenção mostrou que o número de chacinas dobrou e o de tiroteios aumentou 15,6%, deixando 294 mortos e 193 feridos.
Segundo ela, alguns índices de criminalidade diminuíram no período, mas o relato dos moradores da Vila Kennedy, por exemplo, é o de que após a saída dos militares da comunidade o tráfico voltou com mais força do que estava, com mais armas e impondo terror aos moradores. Para ela, é preciso repensar a estratégia.
"É colocar uma polícia de proximidade, colocar uma polícia que vai ficar, não são operações espetaculares, não é entrar e sair, nós sabemos isso no Rio de Janeiro há muitos anos. Não é por acaso que na época que as UPPs [Unidades de Polícia Pacificadora] funcionaram, as primeiras dez, 15 ou no máximo 20, os crimes não só contra a vida, mas contra o patrimônio despencaram, aquilo produziu um efeito de que era para valer e era para ficar".
O subchefe do GIF, general de brigada Paulo Roberto Pimentel, diz que as chamadas "operações faraônicas" são, na verdade, o modus operandi militar e que isso tem gerado efeito positivo. "A gente fala que havia um certo desrespeito da criminalidade pela autoridade do Estado e isso se refletia no desejo de enfrentamento com o policial, até mesmo como primeira opção do criminoso. Esse tipo de operação evita esse confronto. O objetivo é esse, cumprem-se os mandados que foram exarados para aquela operação. A operação não é retirada do nada, sempre tem uma finalidade por trás. Não pode fazer essa comparação entre o número de efetivo e o de presos".