Senador Irajá: relator diz que projeto vai mudar o turismo do Brasil (Jane de Araújo/Agência Senado/Flickr)
Repórter de Brasil e Economia
Publicado em 21 de junho de 2024 às 15h27.
O senador Irajá (PSD-TO), relator do projeto de lei que legaliza o funcionamento de cassinos, bingos e jogo do bicho no Brasil, afirma que a medida será um "divisor de águas" para o turismo do país com potencial de movimentar mais de R$ 100 bilhões em novos negócios no país. O projeto original tramita no Congresso há 33 anos.
"Daqui a 10, 20 anos, vão lembrar desse projeto como um divisor de águas para o crescimento do turismo do Brasil", diz Irajá em entrevista exclusiva à EXAME.
Irajá argumenta que o projeto pode dobrar o número de turistas estrangeiros no Brasil. Segundo dados da Embratur, o país recebeu 5,9 milhões de turistas internacionais em 2023, que injetaram US$ 6,9 bilhões na economia brasileira. Apesar disso, o Brasil está distante dos países mais visitados do mundo. A França, por exemplo, lidera o ranking com 74 milhões de turistas por ano.
Irajá diz também que estudos iniciais realizados durante a elaboração do seu parecer estimam que a medida pode gerar mais de um milhão de empregos diretos e indiretos, além de uma arrecadação de R$ 22 bilhões aos cofres públicos anualmente.
"Não é um assunto unânime, mas é importante para a economia do Brasil", afirma o senador. "Conseguimos avançar com a matéria para dar um basta na ilegalidade."
Em seu relatório, Irajá cita dados que apontam que mesmo na ilegalidade o mercado de jogos de azar movimentou entre R$ 14 bilhões e R$ 31 bilhões em 2023. A expectativa do relator é que a liberação das modalidades seja explorada por resorts, hotéis e restaurantes, além de atrair empresas internacionais para o Brasil.
"Excluídos os países muçulmanos, o Brasil é o único do G20 que não legalizou a jogatina. É algo que já está na realidade do brasileiro. O que queremos fazer é que os bilhões arrecadados com esse jogo sejam direcionado para áreas essenciais, como educação e saúde, e saiam das mãos de facções criminosas", explica.
A Federação de Hotéis, Restaurantes e Bares do Estado de São Paulo (Fhoresp) estima que a legalização do projeto pode gerar R$ 382 bilhões de investimentos ao setor de turismo. A associação diz que mais de 50 empresas estrangeiras do ramo já visitaram o Brasil para sondar locais e regiões para possíveis implantações de cassinos e bingos.
Hoje, as práticas de jogo do bicho, jogos de azar e apostas em corridas de cavalo fora do hipódromo ou de lugar autorizado são enquadradas como “contravenções penais”, sujeitas à prisão simples e multas.
A matéria enfrenta resistência da bancada evangélica, que, assim como ocorreu durante a regulamentação das casas de apostas online, afirma que a medida vai estimular o vício, lavagem de dinheiro, tráfico e prostituição.
Sobre a dificuldade de articulação, o relator diz que a discussão deve ser feita de forma racional. E afirma: se a matéria fosse para plenário hoje, teria votos para ser aprovada. Irajá não deu prazo para votação.
"Percebo que os votos contrários são bem ideológicos, não são racionais. Estou aberto para o diálogo e para aceitar sugestões. Estamos confiantes para a aprovação. Vou conversar com o presidente Pacheco e com os líderes para entender a melhor forma de avançar com a matéria", disse.
Senadores contrários ao texto articulam para que a matéria passe por outra comissão antes de ir ao plenário. Irajá diz que, até o momento, não houve mudança no mérito do texto, por isso, a medida irá à sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva se for aprovada no plenário, sem necessidade de voltar à Câmara.
A proposta autoriza a prática e exploração no Brasil de jogos de cassino, bingo, videobingo, jogos online, jogo do bicho e aposta em corridas de cavalos. Cada tipo de jogo terá regras estabelecidas para a operação.
Os cassinos serão credenciados por leilões públicos e poderão funcionar somente em complexos integrados de lazer, isto é, em resorts e hotéis de alto padrão com pelo menos 100 quartos, além de restaurantes, bares e locais para reuniões e eventos culturais, e embarcações.
Para funcionar, cada cassino — definido como local onde são praticados jogos de chance ou de habilidade mediante apostas em roletas, cartas, dados ou máquinas de jogos — precisará comprovar capital social mínimo integralizado de pelo menos R$ 100 milhões. O credenciamento valerá por 30 anos, renováveis por igual período.
Haverá o limite de um cassino em cada estado e no Distrito Federal, com exceção de São Paulo, que poderá ter até três cassinos, e de Minas Gerais, Rio de Janeiro, Amazonas e Pará, que poderão ter até dois, cada um, em razão do tamanho da população ou do território.
Também poderão ser instalados cassinos em embarcações marítimas (no limite de dez, em todo o país) e em navios fluviais com pelo menos 50 quartos, dentro dos seguintes limites: um cassino em cada rio com extensão entre 1,5 mil e 2,5 mil quilômetros; dois em cada rio com extensão entre 2,5 mil e 3,5 mil quilômetros; e três em cada rio com extensão acima de 3,5 mil quilômetros.
Embarcações fluviais com cassinos não poderão ficar ancoradas em uma mesma localidade por mais de 30 dias seguidos.
O jogo de bingo poderá ser explorado de forma permanente em locais específicos, tanto na modalidade de cartela, como nas modalidades eletrônica e de videobingo. Poderá haver uma casa de bingo em cada município, sendo que as cidades maiores poderão ter um estabelecimento para cada 150 mil habitantes.
Os municípios e o Distrito Federal serão autorizados a explorar jogos de bingo em estádios com capacidade mínima de 15 mil torcedores, desde que em forma não eventual. As casas de bingo serão autorizadas a funcionar por 25 anos, renováveis por igual período. Para pleitear a autorização, precisarão comprovar capital social mínimo integralizado de R$ 10 milhões.
Em cada estado e no Distrito Federal, poderá ser credenciada para explorar o jogo do bicho uma pessoa jurídica a cada 700 mil habitantes. Em Roraima (único estado com população abaixo desse limite, conforme o Censo de 2022) será permitida a instalação de uma operadora do jogo do bicho.
Pessoas jurídicas poderão ser autorizadas a explorar o jogo do bicho por 25 anos, renováveis por igual período. Para pleitear a autorização, precisarão comprovar capital social mínimo integralizado de R$ 10 milhões.
As apostas em corridas de cavalo poderão ser exploradas por entidades turfísticas credenciadas junto ao Ministério da Agricultura. Essas mesmas entidades poderão também ser credenciadas a explorar, ao mesmo tempo, jogos de bingo e videobingo, desde que no mesmo local em que haja a prática do turfe.
O projeto regulamenta também o aluguel de máquinas de apostas e obriga o registro de todas elas junto ao poder público, bem como a realização de auditorias periódicas. As máquinas de jogo e aposta deverão ser exploradas na proporção de 40% para a empresa locadora e de 60% para o estabelecimento de bingo ou cassino, sobre a receita bruta, sendo essa a diferença entre o total de apostas efetuadas e os prêmios pagos.
O projeto determina que serão criados e deverão ser pagos pelas entidades operadoras de jogos e apostas licenciadas: a Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) e a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos). As casas de apostas serão isentas de outros impostos e contribuições.
Recolhida ao Tesouro Nacional, a Tafija deverá ser paga a cada três meses, sendo no valor de R$ 600 mil para os cassinos; R$ 300 mil para casas de jogos on-line; e R$ 20 mil para casas de bingo, operadoras de jogo do bicho e entidades turfísticas.
A Cide-Jogos terá alíquota de até 17% (podendo ser reduzida a critério do Poder Executivo) para todas as entidades que explorarem jogos e apostas, incidindo sobre a receita bruta — isto é, a diferença entre o total de apostas realizadas e de prêmios pagos.
Do montante arrecadado, 16% irão para o Fundo de Participação dos Estados, 16% para o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), 12% para a Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur), 10% para ações na área do esporte e 10% para o Fundo Nacional da Cultura.
O restante será empregado em ações de prevenção ao vício em jogos, em saúde, segurança pública, proteção dos animais, financiamento estudantil, ações em áreas impactadas por desastres naturais e no Fundo Nacional da Criança e do Adolescente.
Além disso, as entidades operadoras de jogos e apostas deverão destinar 1% da receita bruta à formação de atletas, com repasses feitos diretamente ao Comitê Brasileiro de Clubes e ao Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos.
Os prêmios de valor igual ou superior a R$ 10 mil recebidos pelos apostadores pagarão 20% de Imposto de Renda, já retidos na fonte. O cálculo considerará a diferença entre o prêmio recebido e as apostas efetuadas pelo mesmo apostador nas últimas 24 horas.