Mantega: para a PF, a referência aos então deputados e ao ex-ministro estariam relacionadas às obras da BMX Empreendimento Imobiliário e Participações S/A (Marcelo Casal Jr./ Agência Brasil/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 29 de setembro de 2016 às 15h23.
São Paulo e Curitiba - Ao avançar sobre as anotações e codinomes utilizados pela cúpula da Odebrecht para o pagamento de propinas em obras em todo o País, a Polícia Federal aponta a suspeita de repasses ilícitos ao ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, ao ex-deputado e ex-líder do Governo na Câmara Cândido Vaccarezza (PT), e ao deputado Carlos Zarattini (PT-SP) referentes a contratos da empreiteira com a Prefeitura de São Paulo em 2011.
A anotação sob suspeita dos investigadores está no celular de Marcelo Odebrecht, em uma pasta intitulada como 'Crédito' e com a expressão "BMX: Vacareza e Zaratini 3%, sendo 3 deles, mais 1 GM até outubro. Depois 21M p/GM e 2 para V + Z".
Para a PF, a referência aos então deputados e ao ex-ministro (identificado pela sigla GM) estariam relacionadas às obras da BMX Empreendimento Imobiliário e Participações S/A, uma incorporadora responsável pela obra Parque da Cidade - construções residenciais, comerciais e até um shopping feito pela Odebrecht na capital paulista.
O celular do empreiteiro foi apreendido na 14.ª fase da Lava Jato, chamada Erga Omnes, deflagrada em junho de 2015.
O delegado federal Filipe Hille Pace afirma em relatório de análise das mensagens - documento que embasou a Operação Omertà, 35ª fase da Lava Jato deflagrada na segunda-feira, 26 -, que as investigações identificaram nas anotações uma rotina de Marcelo Odebrecht. "Relacionava projetos que geravam lucro para as empresas da holding Odebrecht como motivos para pagamentos ilícitos."
O delegado aponta suspeitas sobre os petistas ao analisar os outros trechos das anotações que associam as siglas referentes aos políticos com valores.
Em uma tabela abaixo da primeira citação, a "BMX", descrita como "evento out", Marcelo Odebrecht detalha o que seriam os valores referentes a cada codinome.
Após analisar outras mensagens e diálogos de executivos da Odebrecht, a PF afirma que as expressões 'evento' e 'evento out' seriam uma referência às eleições e, por isso, o delegado aponta as seguintes suspeitas:
"Candido Elípio Vacarezza (VACAREZZA; Va), Carlos Zarattini (ZARATTINI; Z) receberiam R$ 3.000.000,00 relacionados ao 'Evento Out' e R$ 2.000.000,00 relacionados a 'Evento 2014', este último valor sob orientação de Guido Mantega (GM; G.)", afirma o delegado no relatório.
"Guido Mantega (GM), por sua vez, ao que parece, definiria a destinação de R$ 1.000.000,00, relativo ao 'Evento Out', e de R$ 21.000.000,00, relacionado ao Evento 2014'", segue o investigador.
Chamou a atenção do delegado Pace o fato de, em novembro de 2011, Marcelo Odebrecht ter recebido um e-mail com anotações sobre vários projetos da Odebrecht e objetivos da empresa para dar andamentos a eles.
Um destes projetos é, exatamente, o "Projeto BMX (SP)" e, no e-mail, é descrita a preocupação da empresa em conseguir as "aprovações finais" da proposta junto à Prefeitura de São Paulo, bem como viabilizar a aquisição de Certificados de Potencial Adicional de Construção - Cepacs, emitidos pela prefeitura.
Em relação a Zarattini, que ainda é deputado e possui foro privilegiado, as informações sobre ele já foram encaminhadas ao Supremo Tribunal Federal.
Vaccarezza e Mantega, por sua vez, não possuem foro privilegiado e estão sob investigação da Lava Jato em Curitiba, sob tutela do juiz federal Sérgio Moro.
No caso do ex-ministro, ele chegou a ser detido e solto cerca de cinco horas depois na 34.ª fase da Lava Jato, chamada Arquivo X, deflagrada na quinta-feira, 22.
Arquivo X apura a suspeita de pagamento de US$ 2,3 milhões pelo empresário Eike Batista ao PT por ordem de Mantega.
O ex-ministro é citado pela Polícia Federal em outras planilhas de Marcelo Odebrecht que fazem referência à contabilidade paralela que a empreiteira mantinha junto ao PT.
Neste caso, ele seria identificado como "pós Itália", uma referência à sucessão do ex-ministro Antonio Palocci Filho (Fazenda e Casa Civil/Governos Lula e Dilma), identificado como "italiano", nas relações com a empreiteira.
Defesa
Em nota, deputado Carlos Zarattini afirmou: "Desconheço o teor e veracidade desses documentos. Não tenho nenhum conhecimento do que significam. Reitero mais uma vez que todas as doações feitas a minha campanha foram legais e devidamente incluídas na prestação de contas apresentada à justiça eleitoral".
O advogado José Roberto Batochio, que defende o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, reagiu com ironias às suspeitas dos investigadores baseadas em anotações no celular do empreiteiro Marcelo Odebrecht. Batochio invocou até a famigerada polícia secreta russa.
"Nunca foi do conhecimento do ministro Mantega qualquer código cifrado em celular de quem quer que seja. Isso só existe na KGB e na cabeça dos investigadores."
Já o criminalista Marcellus Ferreira Pinto, que defende Vaccarezza, afirmou:
"As obras do Parque da Cidade, vinculadas ao denominado Projeto BMX, foram executadas durante a gestão de Gilberto Kassab, à época filiado ao DEM, notório opositor da gestão do PT tanto na esfera municipal quanto na federal. Portanto, não seria concebível qualquer tipo de ingerência de Cândido Vaccarezza na gestão das obras realizadas pela Prefeitura de SP. Quanto ao suposto 'Evento 2014', as doações recebidas por Cândido Vaccarezza naquela eleição são públicas, estão sob apreciação no TSE e já houve manifestação do Ministério Público Federal Eleitoral por sua aprovação."