Usuários de crack em rua da Cracolândia, em São Paulo (Marcelo Camargo/ABr/Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 7 de setembro de 2014 às 18h00.
Rio de Janeiro - A Pesquisa Nacional sobre o Uso de Crack – Quem São os Usuários de Crack e/ou Similares do Brasil? Quantos São nas Capitais Brasileiras?, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), verificou que 20% dos que frequentam as chamadas cracolândias são mulheres. O trabalho ouviu 32.359 pessoas, sendo que 24.977 responderam ao questionário nos próprios domicílios e 7.381, nos próprios locais de uso da droga.
Além de responderem os questionários, os usuários fizeram testes de HIV e hepatite, que indicaram que, entre as mulheres, 8,17% eram portadoras do HIV, índice que, nos homens, chegava a 4,01%. Com hepatite C, as mulheres representaram 2,23% dos infectados e os homens, 2,75%.
Segundo um dos coordenadores do trabalho, o médico Francisco Inácio Bastos, do Laboratório de Informação em Saúde (LIS), pertencente ao Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), o perfil das mulheres pesquisadas é muito negativo.
“Até para mim, que sou acostumado a trabalhar nessa área, nunca tinha visto uma população feminina tão maltratada e tão magoada. Agressão física, abuso sexual, nenhuma assistência pré-natal. Quando me perguntam o que me chocou mais como médico, eu digo que foi ver pessoas em uma situação tão precária, precisando tanto de ajuda”, contou à Agência Brasil.
A pesquisa apontou que menos de 5% dos entrevistados permaneceram no tratamento até o último mês. Para o coordenador, ficou claro que a porta de entrada dos usuários de crack no sistema de saúde não é via tratamento da dependência química, mas por meio dos cuidados gerais de saúde, como curativos, tratamento de dente e da boca. O médico acrescentou que, no caso das mulheres, seria natural que o contato com o sistema de saúde ocorresse por necessidade de realizar o pré-natal, mas não é isso o que ocorre.
“No momento das entrevistas, 10% das mulheres relataram que estavam grávidas. O que não quer dizer que tiveram o filho, porque algumas perderam e outras abortaram. Quando se vai para o padrão desejável em termos de pré-natal, que são sete consultas, menos de 5% delas fizeram pré-natal regular”, disse.
O coordenador defendeu que os governos deveriam fazer um plano integrado para tratamento do abuso de substâncias químicas vinculado à rede geral de saúde e não apenas aos centros de dependência química. “A grande via do usuário grave se inserir no sistema de saúde é via sistema de saúde geral, são as UPAs [unidades de Pronto-Atendimento], são os programas de Saúde da Família, porque, para o tratamento de dependência química, a proporção que continua é muito baixa. É uma conclusão triste”, explicou.
O Icict também está fazendo uma análise da criminalidade na ausência de programas de apoio aos usuários de crack, para complementar o trabalho. Francisco Inácio Bastos disse que, o que se notou de diferença no tratamento de usuários foi o resultado obtido com a adoção de programas específicos, porque nos locais em que foram implementados houve queda de violência. “Houve uma redução global da taxa de criminalidade e houve uma vinculação dos usuários com programas gerais de saúde”, disse.
A pesquisa foi feita entre o segundo semestre de 2011 e o primeiro semestre de 2013 nas 26 capitais de estado e no Distrito Federal, dividida em três abordagens. A primeira com avaliações em todas as capitais, a segunda nas nove regiões metropolitanas e a última nas cidades pequenas e de médio porte. Agora, o instituto está lançando o livro digital sobre a pesquisa, que pode ser obtido no site do Icict.