Rodrigo Janot: fato está sendo tratado como indigno e inaceitável dentro da Procuradoria Geral da República (Adriano Machado/Reuters)
Estadão Conteúdo
Publicado em 27 de setembro de 2019 às 14h00.
Última atualização em 27 de setembro de 2019 às 14h11.
São Paulo — Ex-secretário-geral do Ministério Público da União na gestão de Rodrigo Janot, o procurador regional da República Blal Dalloul disse que as declarações do ex-procurador-geral da República representam "uma das páginas tristes para a história do Ministério Público".
Janot disse à imprensa que, no momento mais tenso de sua passagem pelo cargo, ingressou armado no Supremo Tribunal Federal (STF) com a intenção de matar a tiros o ministro Gilmar Mendes. "Não ia ser ameaça não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele e depois me suicidar", afirmou Janot.
A declaração do ex-chefe chocou não apenas Blal Dalloul, como também outros ex-auxiliares ouvidos pela reportagem, que engrossaram críticas, mas preferiram manter-se no anonimato.
"Estou realmente chocado com essa revelação. Não imaginava que tal situação tivesse acontecido e minha formação não admitiria conhecimento sem veemente discordância", disse Dalloul, que ficou em terceiro lugar na lista tríplice da categoria para a escolha do novo procurador-geral - ignorada pelo presidente Jair Bolsonaro, que indicou Augusto Aras.
"O evento é mais um das páginas tristes para a história do Ministério Público e sua revelação nada traz de positivo. É preciso perdoar e amar muito mais. Inclusive por e pela instituição tão maior do que qualquer das suas pessoas", completou Blal.
Outros auxiliares de Janot na época em que chefiou a PGR manifestaram "perplexidade" pela revelação feita. A reação entre as pessoas que compuseram a equipe do ex-procurador-geral e até de quem permaneceu como amigo após a gestão é péssima. O fato está sendo tratado como indigno e inaceitável.
Um desses integrantes disse à reportagem que já havia escutado um comentário de Janot de que tinha apenas pensado em matar Gilmar Mendes, mas entendeu que era uma bravata - e nunca que se chegou perto à consumação.
Para esse membro do MPF, o fato de a declaração ter vindo no contexto de venda de livro é ainda pior, mais vergonhoso. Até o motivo, crítica à filha, foi citado como ridículo.
Um outro ex-auxiliar de Janot, que pediu para não ser identificado nesta reportagem, disse estar preocupado com os reflexos das declarações do ex-procurador-geral da República sobre a "institucionalidade" do MP.
Para esse ex-auxiliar de Janot, o ex-PGR agiu "de forma incompatível com o estágio civilizacional" e o "desequilíbrio demonstrado tem sido repudiado em todos os ambientes internos".
Em entrevistas reveladas nesta quinta-feira (26), o ex-PGR contou que, em 2017, sua relação com o ministro do STF tornou-se tão conflituosa que ele chegou a ir armado ao tribunal para matar o ministro.
“Não ia ser ameaça não. Ia ser assassinato mesmo. Ia matar ele e depois me suicidar”, disse Janot ao Estadão. O conflito atingiu a temperatura máxima quando Janot tentou impedir Gilmar de atuar num processo envolvendo o empresário Eike Batista.
Janot alegou que Gilmar estava impedido de julgar o caso porque sua esposa, Guiomar Mendes, trabalhava no escritório de advocacia que defendia Eike.
Em seguida, surgiram notícias que acusavam a filha de Janot de ser advogada de empresas envolvidas na Lava-Jato. O ex-procurador-geral acusa Gilmar de ter inventado essa história.
O fato o teria deixado tão abalado que ele planejou matar Gilmar em pleno STF. Os dois chegaram a se encontrar na antessala do Tribunal. Janot diz que foi “a mão de Deus” que o impediu de puxar o gatilho.