Impeachment: “Golpe seria crime de responsabilidade sem punição”, disse Velloso, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (Ueslei Marcelino / Reuters)
Da Redação
Publicado em 14 de abril de 2016 às 15h41.
Em evento promovido por partidos de oposição, entre os quais o PSDB e o DEM, cerca de 15 juristas favoráveis ao impeachment da presidente Dilma Rousseff foram à Câmara dos Deputados para apresentar aos parlamentares argumentos jurídicos sobre a questão.
Eventos similares, mas com juristas contrários ao afastamento de Dilma, foram feitos em dezembro do ano passado e em março deste ano em cerimônias no Palácio do Planalto.
A poucos metros do evento da oposição, deputados governistas e ex-parlamentares que participaram da elaboração da Constituição de 1988 promoveram atos alertando que o atual processo de impeachment, da forma que está sendo conduzido na Câmara, representa violação à Carta Magna.
O presidente do PSDB, senador Aécio Neves (MG), abriu o evento da oposição, no qual foi lançado manifesto pela legalidade do afastamento da presidente Dilma Rousseff.
O ex-candidato à Presidência da República disse que o afastamento da presidente seria uma oportunidade para o Brasil "se dar uma nova chance”, uma vez que houve “dolo” na tomada de medidas que, “não só afetaram resultado eleitoral, mas levaram à destruição de pilares fundamentais da economia e do ganho social” dos brasileiros.
Um dos juristas convidados para o evento foi o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Velloso.
“Golpe seria crime de responsabilidade sem punição”, disse Velloso, em referência aos supostos crimes que teriam sido cometida pela presidente Dilma.
“Não tem o menor sentido falar que o impeachment é golpe, porque não está fora da legalidade. E dizer que violar a Lei de Responsabilidade Fiscal não é crime é coisa que não podemos entender. Pedalada fiscal é crime, e crime grave descrito na lei”.
Segundo Carlos Velloso, para que o Supremo seja acionado, é necessária a ocorrência de violação a direitos e garantias constitucionais ou a violação ao direito de defesa. “Mas isso vem sendo conduzido e presidido com muito critério”, acrescentou.
Professora das Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil), Stefânea Maria de Queiroz destacou que “a democracia não é baseada unicamente na legitimidade na soberania popular. Democracia estabelece a ideia de uma democracia limitada, onde há controles recíprocos entre os poderes. Tanto é que podem ser objeto de controle de constitucionalidade”, disse a professora, em tom crítico a práticas de violação à independência dos poderes e à violação da Lei Orçamentaria.
“O STF já disse que não se precisa de imparcialidade nos atos dos parlamentares”, acrescentou Stefânea, ao ser referir aos aspectos políticos de um julgamento de impeachment pelo Parlamento.
“Isso faz parte do movimento democrático, embora seja traumático do ponto de vista do presidencialismo”, completou.
Instrumento de democracia
Também para o presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo (Iasp), José Horácio Halfeld Rezende Ribeiro, o impeachment é um instrumento da democracia.
“Se um presidente fosse imune, teríamos total descontrole e desequilíbrio daquele que ostenta o cargo. A aprovação do impeachment no domingo não significa condenar. Significa permitir o que o povo brasileiro merece, que é um julgamento justo, adequado, do que de fato ocorreu com o futuro da nação”.
Segundo o professor de direito da Universidade de São Paulo (USP) Dirceu Ramos, o Executivo, que já estaria intervindo no Judiciário, intervém agora também no Legislativo, por meio da distribuição de cargos.
“Não há golpe. Há processo democrático previsto na Constituição. Crime sem impeachment, sim, é golpe. Isso precisa ser dito, porque eles [governistas] repetem uma mentira para torná-la verdade”, afirmou Ramos.
“Outra questão que se coloca é relativa ao [fato de a] presidente ter sido eleita por voto popular: Legitimidade se adquire e se perde”, argumentou.
“Além disso, vimos, dentro do Palácio do Planalto, segmentos fazendo ameaças, ao lado de uma presidente omissa, que não tomou nenhuma atitude”, disse ele, referindo-se ao secretário de Administração e Finanças da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), Aristides Santos.
Para Pedro Henrique Reinaldo, membro do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o Brasil sofreu "um golpe” há alguns anos, enquanto a sociedade brasileira "estava anestesiada por um falso crescimento econômico. Nós, os deputados, a oposição e a classe média fomos omissos por muitos anos, desde o mandato do ex-presidente Lula, e essa anestesia não nos fez perceber vários crimes. Agora há dois ex-tesoureiros na cadeia, mas falta o autor intelectual. Por isso, o modus operandi se perpetuou”.
Segundo o jurista Hamilton Dias de Souza, a nomeação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para a chefia da Casa Civil da Presidência da República representa desvio de finalidade.
“Isso é grave, porque há crime de responsabilidade, por parte da presidente da República. Fala-se que não só Lula como outros ministros de Estados estão procurando deputados para oferecer cargos. Estão tentando comprar os senhores [parlamentares]”, afirmou Souza.
Governistas
Enquanto os juristas convidados pela oposição defendiam o impeachment, governistas anunciavam, no Salão Verde, o protocolo de assinaturas para a criação da já anunciada Frente Parlamentar Mista em Defesa da Democracia, com 186 deputados e 32 senadores.
Organizadora da lista, a presidente do PCdoB, deputada Luciana Santos (PE), disse que o trabalho do grupo será debater o significado do processo de impeachment.
“O que estará em jogo no domingo é um plebiscito: os que dizem sim, ou não, para a democracia”, afirmou a deputada.