Rio de Janeiro: o estado enfrenta uma forte onda de violência neste ano (Ricardo Moraes/Reuters)
Agência Brasil
Publicado em 14 de julho de 2017 às 19h13.
A organização não governamental Justiça Global, ligada à defesa dos direitos humanos, enviou um documento à Organização das Nações Unidas (ONU) para que se manifeste publicamente sobre a onda de violência que tem aparecido de forma recorrente no Rio de Janeiro em 2017 atingindo crianças e adolescentes.
O documento pede que o organismo internacional intervenha junto às autoridades brasileiras.
O relatório cita que as mortes ocorreram em decorrência da atuação da Polícia Militar em favelas e periferias da cidade do Rio de Janeiro.
"A realização de operações policiais com caveirões e armamento de alto poderio bélico em áreas urbanas, por si só, já constitui uma violação de direitos humanos, mas isso ganha contornos ainda mais graves ao envolver a vida de crianças e adolescentes."
No informe, enviado à Relatora Especial Sobre Execuções Extrajudiciais, Sumárias ou Arbitrárias da ONU, Agnes Callamard, a Justiça Global cita casos que mostram o descaso do Estado com a segurança das crianças, como o de Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos, morta por tiros de fuzil, na Escola Municipal Daniel Piza, em 30 de março.
O assassinato decorreu da atuação do 41º Batalhão da Polícia Militar. Policiais da unidade militar se envolveram em casos de repercussão internacional, como a execução de cinco jovens de Costa Barros, que tiveram o carro fuzilado com 111 tiros disparados, em 28 de novembro de 2015.
De acordo com o pesquisador da Justiça Global, Guilherme Pontes, em 2017 ocorre um crescimento inaceitável da violência do Estado, que só aprofunda um problema estrutural de racismo e desigualdade social.
"Como a falência do projeto das UPPs não é algo que o governo tem conseguido esconder, ele volta a investir cada vez mais nessas operações de alta letalidade. A própria Polícia Militar constatou que os tiroteios em favelas que contam com Unidade de Polícia Pacificadora [UPP] aumentaram 13.746% em cinco anos, entre 2011 e 2016", diz o pesquisador.
Em nota, a Coordenadoria de Polícia Pacificadora (CPP) informou que não irá se pronunciar sobre o relatório no que diz respeito às unidades de Polícia Pacificadora.
Outro ponto criticado é o horário das operações policiais, que ocorrem em momentos de grande circulação, como na saída das escolas.
Esse cenário já levou ao fechamento de escolas, postos de saúde e outras instituições públicas. Esse foi o caso da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, da Fundação Oswaldo Cruz, que recentemente parou suas atividades por conta da violência armada nos territórios de seu entorno (Manguinhos, Mandela, Varginha, Vila do João).
A diretora da unidade escolar, Anakeila de Barros Stauffer, diz que essa realidade é comum a muitas escolas do Rio. Segundo ela, do ponto de vista do aprendizado, quem tem medo não aprende.
"Não adianta trazer os alunos para a escola enfrentando o medo cotidiano. Essa situação evidencia a evasão de alunos das salas de aula e afeta os profissionais da educação que sofrem com problemas psicológicos".
Anakeila disse que o Núcleo de Saúde do Trabalhador da Fiocruz constatou que essa questão da violência está abatendo tanto os profissionais da educação como os estudantes.
"Isso já vem desde a creche. Não adianta esconder as crianças embaixo das mesas ou amenizar o medo nas crianças. Não é só a questão da bala perdida ou achada. A violência do fogo e da arma é apenas mais um componente do que a gente vem sofrendo", disse.