Plenário da Câmara dos Deputados (Adriano Machado/Reuters)
Alessandra Azevedo
Publicado em 1 de outubro de 2022 às 14h22.
As regras para eleger um deputado federal não são tão simples quanto as usadas na eleição de senador, em que, basicamente, o candidato mais votado fica com a cadeira. O cálculo para preencher uma vaga na Câmara dos Deputados é complexo e leva em consideração não só a quantidade de votos do candidato, mas também o desempenho do partido.
Neste ano, com as regras eleitorais aprovadas em 2021, eleger um deputado federal ficou ainda mais complicado do que nos pleitos anteriores. Partidos com votações pouco expressivas, mesmo que tenham um ou outro candidato de peso, podem não concorrer às vagas remanescentes, as chamadas "sobras eleitorais", após a divisão geral das cadeiras entre os partidos.
Em resumo, para eleger um deputado, é preciso que o candidato e o partido tenham conseguido um número mínimo de votos válidos nas urnas, que não levam em conta brancos e nulos. Parece simples: as vagas são distribuídas entre as legendas com melhor desempenho e, dentro delas, entre os candidatos mais votados.
Mas há uma série de critérios. Primeiro, o partido precisa atingir o quociente eleitoral. O cálculo é feito da seguinte forma: divide-se o número de votos válidos no estado pelo número de vagas que o estado tem (que pode variar de oito a 70, dependendo da quantidade de eleitores do local - veja lista abaixo).
Por exemplo, se um estado com direito a dez cadeiras na Câmara tiver 2 milhões de votos válidos, o quociente eleitoral será de 200 mil votos. Ou seja, apenas os partidos que conseguirem pelo menos 200 mil votos elegerão candidatos. Os outros são excluídos. Nesse cálculo, são considerados os votos em candidatos do partido ou apenas na legenda.
Para saber quantas cadeiras um partido que preencher esse critério ocupará na Câmara, é preciso dividir o total de votos válidos da legenda pelo quociente eleitoral. Nesse exemplo, um partido que tenha obtido 400 mil votos terá direito a duas vagas na Câmara (resultado da divisão de 400 mil por 200 mil). Esse é o chamado quociente partidário.
Vale ressaltar que um partido que conseguir 450 mil votos também terá direito a duas vagas. Nesse caso, o quociente partidário é de 2,5. Pelas regras eleitorais, é desconsiderado o número “quebrado”, vale apenas o inteiro.
As vagas conquistadas, então, vão para os candidatos com mais votos dentro do partido. Mas também tem um critério individual: o candidato precisa ter atingido, sozinho, pelo menos 10% do quociente eleitoral para ser eleito deputado federal. No exemplo citado, 20 mil votos.
Se restarem vagas depois dessa distribuição, os partidos disputam as chamadas "sobras". No estado usado como exemplo, isso pode acontecer se uma legenda com poucos nomes lançar um candidato muito popular, que consiga, sozinho, 600 mil votos para deputado federal, por exemplo.
Nesse caso, o partido conseguiria três vagas de deputado somente com o número de votos conquistados por esse candidato (resultado da divisão dos 600 mil pelo quociente eleitoral de 200 mil). Por isso, como levam outros políticos menos votados para a Câmara, esses candidatos são chamados de “puxadores de votos”.
Mas, se essa legenda não tiver outros candidatos que tenham conseguido individualmente pelo menos 20 mil votos (10% do quociente eleitoral), não poderá ocupar as outras duas vagas conquistadas pelo "puxador de votos". Nesse caso, elas entram para as sobras e são distribuídas entre os outros partidos.
As regras, na distribuição das sobras, são diferentes. É preciso dividir o total de votos do partido pelo número de vagas que ele preencheu (quociente partidário), mais um. Essa é a chamada média. Em tese, o partido que tiver a maior média consegue uma vaga. O cálculo é refeito até acabarem as cadeiras.
As novas regras eleitorais, no entanto, dificultam o acesso a essas sobras, porque só permitem que partidos que tenham conquistado pelo menos 80% do quociente eleitoral possam ocupar essas cadeiras. No exemplo citado, as sobras só seriam distribuídas entre partidos que conseguissem pelo menos 160 mil votos (80% de 200 mil).
Além disso, mesmo que o partido tenha atingido esse mínimo de votos, se não tiver nenhum candidato com pelo menos 20% do quociente eleitoral (40 mil votos, nesse caso), perderá o direito à vaga remanescente. Pode acontecer também de um candidato com 50 mil votos, por exemplo, não ser eleito porque o partido não atingiu os 80% do quociente eleitoral.
Até as eleições de 2018, não importava para a distribuição das sobras o desempenho do partido, desde que o candidato tivesse 10% do quociente eleitoral. A legenda que atingisse a maior média ocupava a cadeira remanescente.
“Agora, pode ter um candidato com uma votação fantástica, mas, se o partido não atingir 80% do quociente eleitoral, ele não vai disputar as sobras”, explica Neuriberg Dias, analista político do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).
Outra regra que preocupa siglas menores é a cláusula de desempenho. Desde 2017, a Constituição diz que um partido precisa atingir um determinado número de votos para ter acesso aos fundos partidário e à propaganda gratuita na TV e no rádio, duas variáveis essenciais para conseguir eleger candidatos. Essa regra é chamada de cláusula de barreira ou de desempenho.
O objetivo é reduzir a fragmentação partidária, ao estimular, por exemplo, fusões de legendas. Não terão acesso aos recursos e ao tempo de propaganda partidos que, em 2022, tiverem menos de 2% dos votos válidos -- distribuídos em ao menos nove estados com pelo menos 1% dos votos válidos em cada um -- ou que tenham eleito menos de 11 deputados federais em nove estados diferentes.
Em 2018, a regra era de 1,5% dos votos válidos e nove deputados federais. A cláusula de barreira fica mais dura a cada pleito. Em 2026, o critério exigido será de 2,5% dos votos válidos e 13 deputados eleitos. Em 2030, vai para 3% e 15 deputados eleitos.