Temer na ONU: “Dados para o último ano já indicam a diminuição de mais de 20% do desmatamento" (Lucas Jackson/Reuters)
Da Redação
Publicado em 24 de setembro de 2017 às 06h00.
Última atualização em 24 de setembro de 2017 às 06h00.
“Os primeiros dados disponíveis para o último ano já indicam a diminuição de mais de 20% do desmatamento [na Amazônia].”
O presidente Michel Temer (PMDB) comemorou dados preliminares sobre o desmatamento da Amazônia, em discurso de abertura da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, na terça-feira (19).
Segundo ele, números disponíveis para o ano passado mostram uma diminuição de mais de 20% na derrubada da floresta.
Ao analisar a informação, o Truco – projeto de fact-checking da Agência Pública – descobriu que a o indicador é verdadeiro, mas Temer omitiu detalhes que permitem compreender o que de fato ocorreu. Por isso, a frase foi classificada como sem contexto.
A Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República foi procurada para indicar a fonte do número utilizado pelo presidente, uma vez que isso não é citado no discurso.
De acordo com a pasta, Temer referiu-se a um dado extraoficial da organização não-governamental (ONG) Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon).
Este mês, a entidade divulgou o Boletim do Desmatamento, que faz uma avaliação do período entre agosto de 2016 e julho de 2017.
Houve uma redução de 21% no volume de área desmatada medida pelo Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), de acordo com os dados do Imazon.
Entre agosto de 2015 e julho de 2016, foi detectada a destruição de 3.579 quilômetros quadrados. No período que vai de agosto de 2016 a julho de 2017, a soma caiu para 2.834 quilômetros quadrados.
Logo, o número usado por Temer coincide com o que foi divulgado pelo instituto. O dado, no entanto, não pode ser considerado como um resultado conclusivo de que a devastação realmente diminuiu.
Isso porque o SAD foi criado para emitir alertas mensais sobre o ritmo do desmatamento. O tipo de informação usada e a metodologia adotada pelo Imazon não permitem fazer uma medição exata do total da área desmatada.
As imagens analisadas pelo SAD são captadas pelo sensor Modis, do satélite Terra, da Nasa, e têm resolução de 250 metros. De acordo com a ONG, é possível verificar problemas em áreas de até 10 hectares (100 mil metros quadrados).
Um estudo comparativo publicado em 2011 pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) – responsável pelos sistemas oficiais de medição de desmatamento – concluiu, no entanto, que o SAD é pouco eficiente para enxergar detalhes em áreas com menos de 25 hectares (250 mil metros quadrados).
A análise comparou os dados de agosto de 2008 a julho de 2009 do sistema do Imazon com os do Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter) e do Projeto de Monitoramento do Desmatamento na Amazônia Legal por Satélite (Prodes), ambos mantidos pelo Inpe.
O Deter também faz medições em tempo real a partir de imagens do Modis, enquanto o Prodes usa três satélites, com sensores melhores, e uma metodologia diferente e mais demorada de análise – por isso, é bem mais preciso e fornece os índices anuais de desmatamento usados pelo governo.
De acordo com a análise comparativa, o Prodes conseguiu captar um panorama mais realista da devastação.
“É importante destacar que, para as faixas de tamanho de polígonos menores que 0,25 quilômetros quadrados, o índice de confirmação de ambos os sistemas [SAD e Deter] é baixo, justamente onde os polígonos do Prodes somam os maiores valores de área desmatada (60,2% em relação ao total)”, concluiu o estudo.
No início do ano passado, o Inpe melhorou a precisão do Deter, que foi transformado no Deter-B. O Imazon conseguiu aprimorar o processamento das imagens do SAD com a ajuda do Google, mas ainda mantém a mesma fonte de dados e a mesma metodologia.
Logo, o sistema ainda tem dificuldade para encontrar desmatamentos menores. Como a ONG afirma que seu objetivo é apontar tendências e emitir alertas, isso não afeta esses dois objetivos. Torna inviável, no entanto, comemorar a queda do desmatamento como fez Temer, com base nos dados do SAD.
O Prodes, do Inpe, ainda não divulgou os números oficiais válidos para o período de agosto de 2016 a julho de 2017. Isso deve ocorrer em novembro. Os resultados do ano passado indicaram aumento de 29% no desmatamento em relação ao período anterior, variação mais alta desde 2004.
O próprio Imazon achou prematura a comemoração do presidente Temer. Em nota, a ONG afirmou que o volume de desmatamento em julho deste ano (544 quilômetros quadrados) foi muito semelhante ao detectado no mesmo mês no ano passado (539 quilômetros quadrados).
“Isso é um ponto de alerta, pois entre julho e outubro é quando ocorre com maior frequência o desmatamento na região devido à menor incidência de chuvas”, explicou a organização.
Outro problema está nos locais que foram mais afetados. “Novamente as áreas protegidas (unidades de conservação e terras indígenas) ficaram em segundo lugar entre as categorias fundiárias que mais desmataram no período”, afirmou a ONG.
“Não houve aumento quando comparado com o período anterior, mas a persistência do número elevado de alertas de desmatamento em dois anos seguidos é um ponto de atenção.”
Distribuição dos Alertas de Desmatamento por Categoria 2016/2017 | |||
Categorias Fundiárias | 2016 | 2017 | Variação |
Assentamentos | 584 | 457 | -127 |
Unidades de Conservação | 719 | 553 | -166 |
Terras Indígenas | 43 | 55 | 12 |
Privadas, Posse e Devolutas | 2234 | 1769 | -465 |
Total | 3580 | 2834 | -746 |
Texto cedido pela Agência Pública.