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O que está em jogo no julgamento do STF – além da prisão de Lula

Além do futuro imediato do ex-presidente Lula, decisão sobre habeas corpus pode afetar eleições e as outras prisões da Lava Jato

Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília (Ricardo Moraes/Reuters)

Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília (Ricardo Moraes/Reuters)

Luiza Calegari

Luiza Calegari

Publicado em 4 de abril de 2018 às 06h00.

Última atualização em 4 de abril de 2018 às 08h44.

São Paulo – O julgamento do pedido de habeas corpus do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva hoje no Supremo Tribunal Federal (STF) pode ter implicações mais amplas para o mundo jurídico do que pode parecer à primeira vista.

Para começar, boa parte da sessão pode ser dedicada a debater o caráter vinculante da decisão – se esse julgamento específico vai valer para outros casos parecidos.

Além disso, as consequências poderiam se estender aos outros presos da Lava Jato e a todos os réus presos após julgamento em segunda instância.

Entenda tudo o que pode ser afetado pelo julgamento de hoje:

A liberdade de Lula

A questão mais óbvia que será debatida neste julgamento é a permissão de que o ex-presidente possa recorrer de sua sentença em liberdade até que a decisão final seja tomada pelo próprio STF, o chamado trânsito em julgado.

Ele foi condenado, em primeira instância, pelo juiz Sérgio Moro a 9 anos e meio de prisão. A segunda instância, o Tribunal Regional Federal da 4ª região (TRF4) confirmou a sentença e aumentou a pena para 12 anos e um mês de detenção.

A defesa do presidente tinha direito de apresentar um último recurso no TRF4, os embargos de declaração, que foram negados. No entanto, dias antes, o STF já tinha começado a julgar o pedido de habeas corpus de Lula e, como não pôde concluir o julgamento, concedeu uma liminar para que a ordem de prisão não fosse expedida até a avaliação do STF.

A configuração das eleições

Se Lula conseguir responder ao final do processo em liberdade, isso pode servir como argumento da defesa ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para garantir sua participação nas eleições.

Pela Lei da Ficha Limpa, só a confirmação da sentença em segunda instância já tornaria Lula inelegível, mas o ex-presidente ainda pode registrar a própria candidatura, aguardar que ela seja questionada pelo Ministério Público e apresentar argumentos para defendê-la.

A estratégia do Partido dos Trabalhadores (PT) é a de manter Lula como candidato à Presidência até o último momento possível – mesmo se ele for preso. O substituto deve ser anunciado, no máximo, até 20 dias antes da eleição – e a foto será trocada na urna.

Lula é hoje o líder nas pesquisas de intenção de votos, com cerca de 30% da preferência do eleitorado. No entanto, sua capacidade de transmissão dos votos para um outro candidato do PT é limitada.

A abrangência da decisão

Os ministros do STF podem debater, ainda, sobre a possibilidade de a decisão valer para outros casos de prisão após a segunda instância.

Inicialmente, o ministro Marco Aurélio Mello tinha pedido para que a presidente da Corte, Cármen Lúcia, pautasse duas Ações Diretas de Constitucionalidade (ADCs), que questionavam o entendimento do STF sobre a prisão após a segunda instância.

Se elas tivessem sido pautadas, o STF poderia ter mudado a jurisprudência antes de decidir sobre o caso de Lula. Como Cármen Lúcia decidiu pautar o pedido de habeas corpus primeiro, alguns ministros falam em propor, de forma heterodoxa, que a decisão tenha caráter vinculante, ou seja, valha para todos os casos, segundo o portal Jota.

O professor de Direito Penal do Mackenzie Marco Aurélio Florêncio explica que, atualmente, a prisão após a condenação em segunda instância também não se dá automaticamente – é o juiz de execução penal quem decide sobre a necessidade de prender o réu antes do trânsito em julgado.

Se o STF decidir a favor do réu no caso de Lula, a decisão seria equivalente à que mudou o entendimento sobre o tema em 2016 – quando um condenado por homicídio teve a prisão decretada após a condenação em segunda instância.

Para que isso fosse válido para os réus, os advogados ou o Ministério Público teriam que entrar com recursos, caso a caso, baseados no novo entendimento do STF.

Da última vez que o STF votou sobre a prisão após segunda instância, a decisão favorável foi apertada, por 6 votos a 5. A ministra Rosa Weber, que é o fiel da balança, é pessoalmente contra a prisão após a segunda instância, mas tem votado segundo o entendimento vigente da Corte.

Se a manobra de conferir caráter vinculante à decisão, essa votação pode ser lida como uma mudança na jurisprudência, fazendo com que Weber possa votar de acordo com a própria convicção, e não segundo o entendimento já consolidado.

A eficiência da Lava Jato

Para o ex-Procurador Geral da República Rodrigo Janot e outras lideranças do Ministério Público, só a concessão do habeas corpus para Lula poderia criar um “efeito cascata”, com a liberação de inúmeros criminosos, não apenas presos por corrupção, mas também por homicídios, estupros e roubos.

Mais de 4.200 pessoas aderiram a um abaixo-assinado, enviado ao Supremo, no qual constam esses argumentos. O presidente da Associação Nacional de Procuradores da República (ANPR), José Robalinho Cavalcante, disse à Folha que uma eventual concessão de habeas corpus a Lula seria “o maior retrocesso do nosso sistema penal”.

O procurador Deltan Dallagnon, que faz parte da força-tarefa da Lava Jato e é evangélico, divulgou um abaixo-assinado online (que já tem mais de 100 mil adesões) no Twitter, afirmando que faria “jejum” e “oração” pelo “dia D”, quando o recurso seria julgado.

“4ª feira é o dia D da luta contra a corrupção na #LavaJato. Uma derrota significará que a maior parte dos corruptos de diferentes partidos, por todo país, jamais serão responsabilizados, na Lava Jato e além. O cenário não é bom. Estarei em jejum, oração e torcendo pelo país”, escreveu o procurador.

 

 

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