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O outro lado do eldorado nordestino da soja

Expansão do agronegócio na região do Mapitoba atrai levas de migrantes e cidades da região já sofrem com graves problemas de infraestrutura

Produção de soja esconde precariedade na infraestrutura urbana, na saúde, segurança pública e educação

Produção de soja esconde precariedade na infraestrutura urbana, na saúde, segurança pública e educação

DR

Da Redação

Publicado em 21 de março de 2011 às 22h34.

Maranhão - Em 1988, a SLC Agrícola, produtora gaúcha de soja, algodão e milho, vendeu uma fazenda de 2 000 hectares no Rio Grande do Sul e com o dinheiro comprou 26 000 hectares no sul do Maranhão. A aposta na região, que na época não tinha nenhuma infraestrutura, mostrou-se acertada. Hoje, as fazendas na área conhecida como Mapitoba ou Matopiba – que se estende por Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia, e que foi visitada pela reportagem do site de VEJA – respondem por 24% do faturamento total da empresa, de 596 milhões de reais em 2010. No encalço das produtoras brasileiras, como a SLC, vieram investidores estrangeiros e multinacionais do agronegócio, como ADM, Bunge, Cargill, Louis Dreyfus e Multigrain. Este movimento implicou a realização de investimentos milionários e a inserção de tecnologia de ponta na produção, convertendo o cerrado nordestino no novo paraíso do agronegócio. Mas o crescimento tem suas dores.

A cidade de Luis Eduardo Magalhães, no oeste da Bahia, 10ª economia do estado e centro agroindustrial do cerrado, viu sua população aumentar 230% desde 2000, ano em que se emancipou da vizinha Barreiras. “Eu preciso criar duas mil vagas nas escolas públicas anualmente”, argumenta o prefeito Humberto Santa Cruz, do PR. Nem as escolas particulares conseguem suprir a demanda. Apesar de o município de 60 mil habitantes ser bem distribuído, a infraestrutura urbana não consegue acompanhar as necessidades da população que se expande rapidamente. Nem os bairros mais abastados têm pavimentação. A população reclama que não há opções de lazer, como shoppings, cinemas ou áreas arborizadas, e dos preços sobrevalorizados dos imóveis – resultado de uma demanda muito maior que a oferta.

Caos urbano – O caos do crescimento econômico desordenado é ainda mais visível em Balsas, pólo agrícola do Maranhão e dona do segundo maior Produto Interno Bruto (PIB) do estado. A cidade é hoje o exemplo mais flagrante no Matopiba de contraste entre a riqueza gerada pelo agronegócio e a incapacidade do poder público de oferecer boa infraestrutura urbana. Vendida na última década como o eldorado da soja, o município de 80 000 habitantes frustrou muitos migrantes que ali desembarcaram em busca de trabalho fácil. “Se eu não arrumar nada em dois meses, eu vou voltar para o Rio Grande do Sul”, diz o plantador de sementes Alessandro Alves Costa, que, atualmente, está desempregado.

Além de ter ruas, dentre poucas que são asfaltadas, completamente esburacadas, Balsas coleciona problemas nas áreas de saúde, segurança pública e educação. A reportagem do site de VEJA visitou uma escola de palha construída pelos moradores do povoado de Pendanga, há apenas nove quilômetros do centro da cidade. A escola – um barracão de cinco metros quadrados – atende a dez alunos de cinco a 13 anos, que apresentam graves dificuldades de leitura e escrita. O número reduzido de crianças da comunidade é a justificativa do poder público para a omissão. “O MEC só me obriga a construir escola para atender mais de 25 crianças”, justifica o prefeito Francisco Coelho, do PMDB. A escola foi batizada ironicamente com o nome de sua mãe.

Protesto – A insatisfação popular com o descaso das autoridades locais é tanta que, no final do ano passado, um grupo de estudantes de direito organizou uma manifestação contra a administração municipal. O movimento contou com o apoio anônimo de empresários da cidade. Representantes da segunda geração de Balsas, filhos dos migrantes que vieram em busca do boom do agronegócio, os jovens são os mais incomodados com as limitações impostas pelo crescimento acelerado somado à má administração. “O problema é que todas as estruturas estão ligadas ao grupo do prefeito. Não temos a quem recorrer”, lamenta o estudante Eduardo Vieira de Sá, uma das lideranças do grupo.

Outro problema sério da cidade é a ineficiência da telefonia celular. Conseguir sinal é uma questão de sorte. A deficiência atrapalha o funcionamento das empresas ali instaladas, como a InSolo, que pretende deixar a cidade “no médio prazo”, afirma o presidente Salomão Yoshio. A empresa concentra todas suas unidades produtivas no Piauí, mas optou por estabelecer a sede administrativa em Balsas, já que, apesar de todos os problemas, a cidade oferece infraestrutura urbana melhor que as cidades fronteiriças do estado vizinho.

Na divisa com o Maranhão, o pólo agrícola piauiense de Uruçuí surpreende pela simplicidade. A maioria dos 20 000 habitantes vive em casas pobres de tijolo e/ou madeira. Nada permite vislumbrar os quase 18 milhões de reais que a prefeitura arrecada só de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) – 80% desse valor vem do agronegócio. Recentemente, o prefeito Valdir Soares da Costa, do PT, foi preso na operação Geleira, da Polícia Federal, suspeito de desviar recursos da saúde e da educação. Ele já se encontra em liberdade novamente.

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