BEN NELSON: proposta da Universidade Minerva é formar pessoas com pensamento crítico, habilidade de se comunicar e de solucionar problemas de forma criativa / Divulgação/Minerva
Da Redação
Publicado em 17 de outubro de 2016 às 16h42.
Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h08.
Thiago Lavado
Cansado do método padrão das universidades americanas, o economista Be Nelson resolveu abrir seu próprio centro de ensino superior. A proposta era inovadora: a Universidade Minerva não tem campus, as aulas expositivas são proibidas, professores são incentivados a falar por no máximo quatro minutos e, ao final do curso, cada estudante terá morado em 7 cidades — o primeiro ano em São Francisco, depois seis meses em Berlim, Buenos Aires, Bangalore, Seul, Istambul e Londres. Usando tecnologia própria para fazer cada estudante participar das aulas e com três em cada quatro alunos vindo de fora dos Estados Unidos, a ideia é a usar as cidades como sala de aula, dando aos alunos a chance de aprender na sociedade em que estão imersos e formando adultos com pensamento crítico. Durante uma visita ao Brasil, Nelson teve a seguinte conversa com EXAME Hoje.
Como a Minerva nasceu? De onde veio a ideia?
A ideia veio de um curso sobre a história das universidades, que fiz durante meu ano de calouro na faculdade. E eu percebi que o que as universidades estão fazendo atualmente não é o que elas deveriam estar fazendo, especialmente no contexto dos Estados Unidos. As universidades americanas deveriam treinar as pessoas para pensar criticamente, tomar decisões e governar, mas, em vez disso, estão só disseminando informação. O conceito da Minerva é: nós deveríamos criar um currículo que ensina as pessoas a pensar sistematicamente e que permita o aprendizado objetivo até o final do ensino. Eu deixei essa ideia de lado por um tempo e me graduei. Só mais tarde percebi que a necessidade de uma universidade nesse modelo era muito maior do que eu imaginava antes. Então decidi abrir minha própria instituição.
Em que estágio a Minerva está agora?
Nossa primeira turma tem em torno de 120 alunos de 35 países diferentes. A segunda tem 150 estudantes de 50 países. É um corpo estudantil muito diversificado. A razão pra isso é que nós não olhamos de onde as pessoas vem, não temos cotas para alunos de um lugar ou de outro. A razão da nossa diversidade é que procuramos por mérito e o talento está distribuído de maneira ampla. Estamos no processo de selecionar nossa terceira turma e as inscrições já estão aberta. A primeira turma já se mudou para Berlim, inclusive.
Por que é tão importante oferecer esse tipo de educação e abordagem?
Se você olhar para as ideias fundadoras das universidades americanas irá perceber que elas eram muito diferentes daquelas da universidade tradicional, que ensinavam uma habilidade, uma profissão, um treinamento. O modelo americano originalmente partia do pressuposto de que eles lidavam com uma sociedade completamente nova e seria necessário treinar pessoas que pudessem comandar as grandes instituições da sociedade. Infelizmente, as universidades não se mantiveram a esses ideais. Ao invés de promover um tipo de educação que suprisse o plano de fundo para a tomada de decisões, as universidades simplesmente decidiram que há muito informação por aí e que o aluno precisa selecionar um conjunto de cursos que o interessa e, ao final, ele receberá um diploma por isso. O problema é que, justamente quando as universidades aboliram os currículos estritos, o mundo passou a ser um lugar bem mais complexo. Os desafios da atualidade são muito mais complexos do que eram aquelas das sociedades há 50 ou 100 anos. Esse mundo precisa de uma educação mais estruturada, não menos. O mundo precisa de pessoas que possam pensar multidisciplinarmente e sistematicamente, de pessoas que sejam capazes de entender a segunda e terceira ordem dos fatos, consequências e ações. As universidades atuais vão na direção oposta disso e por isso a Minerva é tão crítica nesse ponto.
O que você disse me lembrou a situação das universidades no Brasil. Há um contrassenso em que muitas universidades treinam os alunos para serem novos professores e acadêmicos, enquanto que muitos estudantes querem se graduar para entrar no mercado de trabalho profissional. Como você vê essa diferença entre a carreira profissional e a academia?
Tanto a universidade quanto os alunos estão errados. Nós temos o mesmo problema nos Estados Unidos. Ambas as abordagens são ruins por que as pessoas precisam de conhecimento prático, não profissional. Por exemplo: digamos que alguém vá para a universidade para fazer computação e precisa aprender a programar. O currículo tem um curso de programação de 2005, mas essa pessoa ingressou em 2010 e se graduou em 2015. Qualquer linguagem e conceito de programação em um currículo que tem dez anos estará completamente obsoleta e o estudante, recém-graduado, estará completamente desatualizado. Do outro lado, várias universidades querem incluir nos currículos algum tipo de pesquisa obscura que só funcionará se o aluno quiser seguir carreira acadêmica. As universidades deviam ensinar conhecimento prático, algo que possa ser aplicado no cotidiano. Não importa o quê. Quem deveria aprender programação, qualquer linguagem que o interesse, é o aluno. A universidade deveria promover o ensino de pensamento lógico e princípios de algoritmos. Esse tipo de expertise pode ser aplicada diretamente no aprendizado de linguagens de programação. Essa é a nossa proposta. As universidades tradicionais dão X, os alunos querem Y e nós oferecemos Z.
De que maneira a Minerva difere da típica universidade?
Nós usamos a cidade como campus, estudantes terão vivido em 7 cidades diferentes ao redor do mundo quando se graduarem, nós temos o corpo docente mais diverso do mundo. São tipos de experiência muito ricas. Procuramos não só viver nas cidades, mas nos integrar nelas e entender as bases culturais, políticas e econômicas de uma sociedade. Mas a diferença está em como ensinamos: temos uma fundação que se constitui em 120 hábitos mentais e conceitos que permitem o pensamento crítico, a solução criativa de problemas, o entendimento das segunda e terceira ordem dos fatos e a habilidade de se comunicar efetivamente. Essas quatro habilidades funcionam para qualquer tipo de trabalho que alguém queira exercer. Nós damos a base e no último ano o aluno escolhe o que quer aprender e pede que o professor lhe ensine. Criamos uma quantidade enorme de base funcional até que ela se torne em exploração completa, preparando o estudante para o mundo real. Além disso, aulas expositivas e massivas são proibidas na Minerva. Todas as turmas têm menos de 20 alunos e as aulas são altamente personalizadas. O professor está lá para desenvolver o aluno e não ensinar de uma posição mais alta. Nenhum professor deve falar por mais de quatro minutos, o que significa que os alunos têm que participar das aulas. Temos uma tecnologia própria, desenvolvida para facilitar e aprimorar esse ambiente de aprendizado vivo.
Quem é o típico estudante da Minerva?
Isso é interessante porque, em uma primeira olhada, eles são completamente diferentes um do outro. Eles vêm de diferentes países, têm uma gama muito ampla de interesses, não têm todos a mesma classe social. Alguns serão empresários, outros engenheiros, cientistas ou sociólogos. O plano de fundo é muito diverso. Mas há similaridades. Eles são todos ótimos alunos e têm uma paixão que expressam pela realização de coisas extraordinárias. A última parte requer uma mente aberta, curiosa e o desejo de aprender e experienciar coisas novas. Na seleção, somos bastante criteriosos e olhamos, além do histórico escolar, para as realizações pessoais das pessoas, não somente atos realizados para entrar na universidade, mas para mudar a sociedade. Há pessoas assim ao redor do mundo todo.