Jair Bolsonaro: partidos da oposição e ex-presidentes afirmam que as atitudes do líder do Executivo atrapalham o combate ao coronavírus (Ueslei Marcelino/Reuters)
Reuters
Publicado em 30 de março de 2020 às 14h37.
Última atualização em 30 de março de 2020 às 15h09.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), pediu nesta segunda-feira, 30, que a população não siga as orientações do presidente Jair Bolsonaro no combate ao coronavírus e afirmou que o chefe do Executivo federal não lidera o país no combate à pandemia.
"Neste caso, por favor, não sigam as orientações do presidente da República do Brasil. Ele não orienta corretamente a população e, lamentavelmente, não lidera o Brasil no combate ao coronavírus e na preservação da vida", disse Doria em entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista.
Doria e Bolsonaro divergem sobre as estratégias para lidar com o novo coronavírus. Enquanto o governador tem adotado medidas de restrição à circulação, como quarentena e fechamento do comércio, e insistido que as pessoas fiquem em casa — em consonância com as recomendações do Ministério da Saúde e da Organização Mundial da Saúde (OMS) —, Bolsonaro já se referiu à doença como uma "gripezinha", defende a volta das pessoas ao trabalho para evitar danos à economia e acusa governadores e prefeitos que adotam medidas de isolamento de "exterminadores de empregos."
Segundo dados do Ministério da Saúde divulgados no domingo, o novo coronavírus já matou 136 pessoas no Brasil, e foram registrados 4.256 casos da doença. São Paulo é de longe o estado com maior número de casos e óbitos devido à doença.
De acordo com a OMS, existem quase 700.000 casos de covid-19 em 202 países e a doença já matou mais de 33.000 pessoas em todo o planeta.
O Ministério Público Federal no Rio de Janeiro pediu que a Justiça determine o pagamento pela União de multa de 100.000 reais após o presidente divulgar vídeos em suas redes sociais em que caminha por cidades-satélite no Distrito Federal provocando aglomerações e contrariando orientações de isolamento social para conter o avanço do coronavírus.
No pedido, o procurador Julio José Araujo Junior cita decisão judicial que determinou que a União se abstivesse de "adotar qualquer estímulo à não observância do isolamento social recomendado pela OMS Organização Mundial da Saúde (OMS)".
Para o procurador, a postura de Bolsonaro no fim de semana contraria a determinação da Justiça. "Ao agir dessa forma, a União, por meio da Presidência da República, incorreu em descumprimento da decisão judicial, devendo incidir a multa de 100.000 reais prevista na decisão", afirmou no pedido.
O MPF também pediu que a multa por descumprimento seja elevada para 500.000 reais diários. Em resposta, o juiz Márcio Santoro Rocha deu 24 horas para que a União se manifeste sobre o pedido do Ministério Público Federal no Rio.
No domingo, Bolsonaro divulgou vídeos em suas redes sociais nos quais visita um supermercado e conversa com um vendedor ambulante em cidades-satélite de Brasília. Nos vídeos ele defende a necessidade de se abandonar medidas de isolamento horizontal e a volta das pessoas ao trabalho.
Ex-candidatos à Presidência da República, presidentes de partidos, ex-governadores e um governador da oposição divulgaram manifesto em que pedem a renúncia de Bolsonaro para evitar o agravamento da crise do coronavírus.
PSB, PDT, PCB, PT, PSOL e PCdoB, além dos ex-candidatos à Presidência Ciro Gomes (PDT), Fernando Haddad (PT), Guilherme Boulos (PSOL) e as candidatas a vice Manuela D'Avila (PCdoB) e Sônia Guajajara (PSOL) argumentam, no texto, que o planeta e o país passam por uma "emergência sem precedentes na história moderna", agravada por Bolsonaro.
"Jair Bolsonaro é o maior obstáculo à tomada de decisões urgentes para reduzir a evolução do contágio, salvar vidas e garantir a renda das famílias, o emprego e as empresas. Atenta contra a saúde pública, desconsiderando determinações técnicas e as experiências de outros países", diz o manifesto.
Ao afirmar que o presidente é, além de um problema político, uma questão de saúde pública, a oposição defende que ele não tem condições de seguir à frente do governo para enfrentar a crise, acusando-o de cometer crimes, fraudar informações, mentir e incentivar o caos.
No domingo, a despeito de orientação do Ministério da Saúde para que as pessoas permaneçam em casa, Bolsonaro passeou pelas ruas de Brasília e de cidades do Distrito Federal. O presidente vem insistindo, desde a última semana, na flexibilização do isolamento.
"Precisamos de união e entendimento para enfrentar a pandemia, não de um presidente que contraria as autoridades de Saúde Pública e submete a vida de todos aos seus interesses políticos autoritários. Basta!", afirma a carta.
"Falta a Bolsonaro grandeza. Deveria renunciar, que seria o gesto menos custoso para permitir uma saída democrática ao país. Ele precisa ser urgentemente contido e responder pelos crimes que está cometendo contra nosso povo."
O manifesto pontua ainda que o Congresso Nacional tem a "obrigação" de legislar na emergência da pandemia, diante de um "governo que aposta irresponsavelmente no caos social, econômico e político."
Afirma também que governadores e prefeitos devem zelar pela saúde pública de forma coordenada e lembra que Ministério Público e Judiciário também têm o papel de "deter prontamente as iniciativas criminosas de um Executivo que transgride as garantias constitucionais à vida humana."
Assinado também por ex-governadores, como Tarso Genro e Roberto Requião (MDB), e pelo governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), o manifesto sugere ações a ser tomadas em um plano de emergência nacional.
Entre as sugestões estão a manutenção e a qualificação das medidas de isolamento social, a partir de critérios científicos, a criação de leitos de UTI provisórios, e a importação massiva de testes e equipamentos de proteção para profissionais e para a população.
Também defende a implementação de uma renda básica permanente para desempregados e informais nos moldes do auxílio de 600 reais aprovado pela Câmara na última semana, assim como a suspensão de cobrança das tarifas de serviços básicos para os mais pobres durante a crise e a proibição de demissões.
Neste último caso, a carta prega que o Estado deverá assumir o pagamento de salário aos setores mais afetados, além de propor financiamento subsidiado a médios, pequenos e micro empresários.
Outros temas como a tributação de grandes fortunas, o empréstimo compulsório pelos bancos privados, a utilização de recursos do Tesouro Nacional para a saúde e a área social, também são listados no manifesto, que recomenda ainda a "revisão seletiva e criteriosa das renúncias fiscais quando a economia for normalizada".