Distribuição de cestas básicas para população carente: famílias das classes D e E perderam mais da metade da renda desde o início da crise do coronavírus (Luis Alvarenga/Getty Images)
Estadão Conteúdo
Publicado em 11 de junho de 2020 às 17h00.
Última atualização em 12 de junho de 2020 às 15h23.
Mesmo após o segundo mês consecutivo de deflação, pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a alta dos preços dos alimentos — de 0,24% em maio, vindo de um aumento de 1,79% em abril — indica que as famílias mais pobres terão a renda ainda mais comprometida pela pandemia.
Quando os alimentos sobem em um momento de alta de salários, esse gasto acaba amortecido pelo ganho de renda. No cenário atual, no entanto, a perda de dinheiro das famílias, sobretudo para as de menor renda, é expressiva e a alta dos custos de alimentação pesa ainda mais.
De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as famílias mais pobres gastam cerca de 22% do orçamento com alimentação. E uma outra pesquisa, do Instituto Plano CDE, aponta que 50% das famílias das classes D e E, de baixa renda, perderam mais da metade da renda desde o início da crise causada pela pandemia do novo coronavírus.
"A crise, do ponto de vista de desigualdade de renda, é catastrófica. Muitos profissionais, ainda com redução de salário, puderam se adaptar para trabalhar em casa. Para os mais pobres, só restou tentar o auxílio emergencial", diz o economista da Universidade de Brasília (UnB) José Luis Oreiro.
Especialista em inflação, o economista da Universidade de São Paulo (USP) Heron do Carmo lembra que há um problema de oferta de alimentos, por causa do clima mais seco, e muitos produtos estão sujeitos a choque de preços. "Pesou mais para as famílias mais pobres. Como é um gasto básico, não há uma queda abrupta do consumo, mas o consumidor procura, na medida do possível, racionalizar as compras."
Pelo IPCA, itens como frutas (-2,10%) tiveram queda de preços, mas houve altas de produtos, como cebola (30,08%), batata-inglesa (16,39%), feijão carioca (8,66%) e carnes (0 05%).
André Braz, coordenador do Índice de Preços ao Consumidor (IPC) do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV), concorda que a alta dos alimentos, apesar de destoar dos demais preços, vem em um momento cruel. "A alta de 0,24% poderia parecer pouco, se a renda tivesse se mantido estável. O problema é quando a renda desaparece, por conta da pandemia, e comer fica mais caro."
Ele avalia que os preços dos alimentos devem ter uma nova alta em junho, por causa de um aumento da demanda por carnes por parte da China, que já começou o processo de reabertura após a quarentena. "Essa nova alta dos alimentos, porém, ainda não deve ser suficiente para que a inflação como um todo suba, devemos ter mais um mês de deflação em junho."