Transformadores de energia elétrica da AES Eletropaulo: a propina teria sido paga em espécie, entre 1998 e 2002 (Marcos Issa/Bloomberg News)
Da Redação
Publicado em 24 de março de 2014 às 10h53.
São Paulo - O ex-diretor financeiro da antiga Eletropaulo, professor Henrique Fingermann, será um dos alvos de ação civil do caso Alstom que o Ministério Público vai apresentar à Justiça de São Paulo.
A ação está em fase de conclusão. Promotores que investigam a contratação da multinacional francesa no âmbito do projeto Gisel (Grupo Industrial para o Sistema Eletropaulo), em 1998 - governo Mário Covas (PSDB) -, estão convencidos que Fingermann foi um dos beneficiários de propina paga por coligadas da Alstom.
A investigação mostra que Fingermann teria recebido 1,5% do valor do contrato, o que representaria, à época dos fatos, R$ 780 mil. A propina teria sido paga em espécie, entre 1998 e 2002. A ação civil que o Ministério Público paulista vai entregar à Justiça visa obter a condenação de Fingermann à devolução desse montante, atualizado.
Documentos de posse dos promotores do Ministério Público de São Paulo indicam que Fingermann "também atuou na realização do contrato de financiamento com o banco francês Société Générale". Ele nega enfaticamente ter sido contemplado com recursos ilícitos.
Em fevereiro, Fingermann escapou de processo criminal na Justiça Federal no caso Alstom amparado em uma regra básica do Código Penal, artigo 115 - ao completar 70 anos de idade, em setembro de 2013, ele se viu beneficiado pela prescrição, que é quando se esgota o prazo para o Estado punir um acusado.
Mas da ação civil ele não irá escapar, segundo promotores de Justiça que o investigam. "A situação de Fingermann é muito delicada porque as provas são contundentes", afirmam os promotores. Além de Fingermann será apontado como "recebedor de propina" o conselheiro do Tribunal de Contas do Estado, Robson Marinho, ex-chefe da Casa Civil de Covas.
O Ministério Público de São Paulo praticamente fechou a investigação civil sobre o caso pois considera já ter identificado núcleos de investigados com funções diferentes. Segundo a promotoria, um grupo atuou como "pagador de propinas", outro como "recebedor de propinas".
A ação civil só vai ser levada à Justiça quando a Suíça enviar todos os documentos bancários relativos a Robson Marinho e a outros investigados - o conselheiro recebeu pelo menos US$ 1,1 milhão em uma conta secreta no Credit Agricole de Genebra.
Fingermann ocupou o cargo na Eletropaulo entre 1996 e abril de 1998. Ele atuou na coordenação das negociações para por em vigência o 10.º aditivo ao contrato Gisel, firmado com a Alston sem licitação. Depois, assumiu a presidência da Empresa Paulista de Transmissão de Energia (EPTE).
Em inquérito criminal, a Polícia Federal juntou um ofício, de 24 de agosto de 1998, de Fingermann para Thierry Charles Lopez de Arias, ex-diretor financeiro da Alston na ocasião, apontado como integrante do grupo dos "pagadores de propinas". Nesse documento, Fingermann, já presidente da EPTE, enviou à empresa francesa cópia do Termo de Aditamento ao Aditivo X do contrato Gisel.
O aditivo representou custo de US$ 45,7 milhões ao Tesouro. Para o Ministério Público, a Alstom e a Cegelec (do grupo francês) pagaram "vantagens indevidas para servidores públicos do Estado em valores de até 16,5% do valor total do aditivo".
Os promotores avaliam ter em mãos um rol de provas para imputar a outros três personagens do caso o papel de "pagadores de propinas": os executivos Jonio Kaham Foigel, da Cegelec (coligada da Alstom) e Thierry Charles Lopez de Arias, além do lobista Romeu Pinto Junior.
Os três já são réus em processo criminal do caso Alstom, aberto pela 6.ª Vara Criminal Federal em São Paulo.
Neste processo, Thierry e Jonio são acusados de corrupção ativa e lavagem de dinheiro. Romeu Pinto Junior foi denunciado por lavagem de dinheiro.
Na investigação de natureza civil, o Ministério Público paulista deverá incluir no quadro de "pagadores de propinas", o empresário Sabino Indelicato e o lobista Cláudio Mendes - ambos também já denunciados pelo Ministério Público Federal por corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
COM A PALAVRA, A DEFESA
Quando a Procuradoria da República, em fevereiro, excluiu o professor Henrique Fingermann da denúncia criminal no caso Alstom por causa da prescrição que o beneficiou, a advogada criminal Carla Di Domênico, que representa o ex-presidente da Eletropaulo, afirmou.
"Não há nenhuma prova de qualquer recebimento de valores por parte do sr. Fingermann. Muito pelo contrário, ele sempre trabalhou para obter uma condição melhor no financiamento. Já havia aprovação do Conselho de Administração da Eletropaulo, faltava simplesmente implementar o financiamento. Mas o sr. Fingermann, preocupado em alcançar uma condição melhor para a empresa, foi renegociar as cláusulas do contrato."
O criminalista Alberto Zacharias Toron, que defende o ex-executivo da Cegelec Jonio Foigel, foi enfático. "Jonio Foigel nega peremptoriamente qualquer relação com o pagamento de propinas. Ele nunca pagou ninguém e tampouco sabia de esquemas. Não bastasse isso, saiu da Cegelec em 1999."
O advogado Henrique Fagundes, defensor de Romeu Pinto Junior, afirma que seu cliente não praticou atos ilegais e que a inocência dele ficará demonstrada em juízo.
A criminalista Dora Cavalcanti, que defende o empresário Sabino Indelicato, diz que ele é sócio e amigo do conselheiro Robson Marinho. Ela afirma não ter tido acesso a documentos da Suíça.
O criminalista Celso Vilardi, que defende o conselheiro Robson Marinho, disse que não tem conhecimento sobre documentos da Suíça. "Robson Marinho não julgou o contrato Gisel, não recebeu propina nenhuma", rechaça Vilardi.
A Alstom destaca que está colaborando com as investigações.
Thierry Lopez de Arias, engenheiro elétrico, mora atualmente na França.