Coaf: Bolsonaro assinou ontem(19) uma MP que vincula o órgão ao Banco Central (Marcos Corrêa/Agência Brasil)
Estadão Conteúdo
Publicado em 20 de agosto de 2019 às 15h53.
Última atualização em 20 de agosto de 2019 às 17h14.
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, procurou garantir que a reestruturação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) não coloca em risco a atividade do órgão de inteligência na prevenção e combate à lavagem de dinheiro.
Medida provisória assinada pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, transfere o órgão ao Banco Central e altera o nome para Unidade de Inteligência Financeira (UIF). "Quero destacar que há uma série de receios a meu ver infundados em relação a essa MP", disse Moro, em um evento em Brasília.
"Foi dada uma boa formatação à Unidade de Inteligência Financeira." O argumento de Moro é que a própria medida provisória garante a manutenção da estrutura de cargos que vinha sendo reforçada no Ministério da Justiça e Segurança Pública. Os atuais setenta servidores do Coaf migrarão para o BC.
A transferência dos atuais integrantes da área técnica foi bem-recebida pela cúpula do Coaf. Havia uma preocupação de que, no processo de definição da MP, isso fosse alterado. "Algumas modificações tiveram de ser realizadas, mas não existe nenhum receio sobre Coaf com este novo nome. Vai continuar realizando seu trabalho de inteligência com independência e autonomia, embora agora vinculado ao Banco Central. Faço essa referência porque tenho visto algumas manifestações um pouco equivocadas sobre o tema", afirmou o ministro, durante evento em Brasília.
Na nova estrutura, o presidente Roberto Leonel, indicado por Moro para o órgão, ficou de fora. Auditor fiscal, ele dá lugar a Ricardo Liáo, que era diretor na gestão Leonel. Ele recebeu a missão do ministro da Economia, Paulo Guedes, e do presidente do BC, Roberto Campos Neto, para fazer uma transição suave do quadro de funcionários. O governo sustenta que não haverá ruptura e nada muda nos procedimentos do órgão, que hoje conta com diversos servidores da Receita Federal.
Em sua fala, Moro frisou que havia defendido, junto ao Congresso a permanência do Coaf dentro do Ministério da Justiça e Segurança Pública. "Infelizmente, o Congresso acabou tomando outra decisão", disse Moro, que se desgastou politicamente enquanto tentava impedir a mudança. "Não estando aqui, tenho certeza que está em boas mãos junto ao atual presidente do Banco Central, o senhor Roberto Campos Neto."
Os comentários foram feitos durante a entrega das primeiras ferramentas do projeto Big Data e Inteligência Artificial, promovido pelo Ministério da Justiça, a cinco Estados que participarão de um projeto-piloto de enfrentamento à criminalidade violenta. O Projeto Em Frente Brasil será lançado pelo governo federal nas próximas semanas.
Sindicatos que representam os Delegados de Polícia Federal no Estado de São Paulo (SINDPF-SP) e os Delegados de Polícia do Estado de São Paulo (SINDPESP) estão se posicionando contra a transferência do Coaf para o Banco Central.
Em nota, as direções dessas entidades alegam que a medida adotada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro "é mais um duro golpe no combate a crimes de corrupção e lavagem de dinheiro", e destacam o papel fiscalizador e de inteligência financeira do órgão na prevenção desses delitos, com autonomia para emitir alertas a outros órgãos fiscalizadores, como as Polícias Federal ou Civil, Receita Federal e os Ministérios Públicos Estadual e Federal.
Para a presidente do SINDPESP, Raquel Kobashi Gallinati, o presidente Jair Bolsonaro "vem tentando intimidar instituições como a Receita e a Polícia Federal, que deveriam estar livres de ingerências políticas, interferindo em seus comandos e quebrando todas as promessas de endurecer o combate à corrupção".
Na mesma linha, a presidente do SINDPF-SP e diretora regional da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal (ADPF) em São Paulo, Tania Prado, diz que "é de se estranhar que um governo eleito com a bandeira do combate à corrupção adote medidas que visam enfraquecer instituições que desempenham um papel de excelência".
"Em um momento sensível como o que vivemos hoje, com pressões e tentativas reiteradas de interferência política na atuação de órgãos fiscalizadores, essa mudança pode atrasar e atravancar investigações de crimes de corrupção e lavagem de dinheiro, além de abrir uma brecha para indicações políticas dentro do órgão", reitera Tania.
As entidades destacam ainda que este é "o segundo golpe que o Coaf recebeu este ano", pois no dia 17 de julho, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, determinou a suspensão de todos os processos judiciais em que dados bancários de investigados tenham sido compartilhados pelo Coaf sem autorização prévia do Judiciário.