Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) (Carlos Moura/SCO/STF/Flickr)
Agência de notícias
Publicado em 17 de maio de 2024 às 16h50.
O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu de forma liminar a resolução do Conselho Federal de Medicina que proíbe a utilização de uma técnica clínica (assistolia fetal) para a interrupção de gestações acima de 22 semanas decorrentes de estupro.
O ministro determinou a análise da liminar pelos demais ministros e o processo foi incluído na sessão do plenário virtual que começa no dia 31 de maio. A suspensão da norma valerá até o julgamento final do tema pelo Supremo, em data que ainda não está definida.
Moraes atendeu a um pedido feito pelo PSOL, que pede a declaração de inconstitucionalidade da resolução do CFM que proíbe a utilização da assistolia fetal exclusivamente nos casos de aborto decorrente de estupro. A técnica utiliza medicações para interromper os batimentos cardíacos do feto, antes de sua retirada do útero, e é considerada essencial para o cuidado adequado ao aborto.
De acordo com o partido, a proibição restringiria, “de maneira absolutamente discricionária”, a liberdade científica e o livre exercício profissional dos médicos. Argumenta, ainda, que a resolução, na prática, submete meninas e mulheres à manutenção de uma gestação compulsória ou à utilização de técnicas inseguras para o aborto, “privando-as do acesso ao procedimento e à assistência adequada por vias legais, submetendo-as a riscos de saúde ou morte”.
O PSOL também aponta que, como a resolução não proíbe a técnica nos outros dois casos em que o ordenamento jurídico permite o aborto – risco à vida da gestante e anencefalia –, o ato do CFM é discriminatório. Ressalta, também, que o procedimento é um cuidado médico crucial para a qualidade da atenção em aborto depois das 20 semanas, tal como recomenda a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo).
Na decisão, Moraes diz ter verificado "a existência de indícios de abuso do poder regulamentar" por parte do Conselho Federal de Medicina ao expedir a Resolução 2.378/2024, por meio da qual fixou condicionante que ultrapassa a lei "para a realização do procedimento de assistolia fetal na hipótese de aborto decorrente de gravidez resultante de estupro".
O ministro lembra que a legislação atual estipulou duas excludentes de ilicitude para a conduta, quando praticada por médico: o aborto necessário, realizado quando não há outro meio de salvar a vida da gestante; e o aborto no caso de gravidez resultante de estupro, caso em que se exige o consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.
"Nessa última hipótese, portanto, para além da realização do procedimento por médico e do consentimento da vítima, o ordenamento penal não estabelece expressamente quaisquer limitações circunstanciais, procedimentais ou temporais para a realização do chamado aborto legal, cuja juridicidade, presentes tais pressupostos, e em linha de princípio, estará plenamente sancionada", explica Moraes.
Na avaliação do ministro, ao limitar a realização de procedimento médico reconhecido e recomendado pela Organização Mundial de Saúde, o Conselho Federal de Medicina "aparentemente se distancia de standards científicos compartilhados pela comunidade internacional", e transborda do poder regulamentar "inerente ao seu próprio regime autárquico, impondo tanto ao profissional de medicina, quanto à gestante vítima de um estupro, uma restrição de direitos não prevista em lei, capaz de criar embaraços concretos e significativamente preocupantes para a saúde das mulheres".
"Com base nessas razões, portanto, compreendo presentes a probabilidade do direito alegado pelo requerente, bem como, e sobretudo, o perigo de dano decorrente do não acautelamento das situações fáticas relacionadas à controvérsia constitucional submetida à apreciação do tribunal", conclui Moraes.
Por isso, o ministro determinou que o CFM cumpra a decisão e solicitou informações que devem ser prestadas em até 10 dias. Depois desse prazo, a Advocacia-Geral da União e o Procurador-Geral da República, sucessivamente, terão cinco dias para manifestação definitiva sobre a controvérsia.