Luís Roberto Barroso: "esta matéria é uma jurisprudência ainda em construção. Espero que, nesta questão de renúncia, se consiga padronizar uma posição geral", disse (Gervásio Baptista/STF)
Da Redação
Publicado em 21 de fevereiro de 2014 às 18h14.
Rio - Relator do processo do mensalão mineiro, o ministro Luís Roberto Barroso defendeu nesta sexta-feira, 21, que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre a instância que julgará o ex-deputado Eduardo Azeredo (PSDB-MG) crie um padrão para casos futuros de políticos que renunciam ao mandato para escapar do julgamento na mais alta corte do País.
Denunciado pelo procurador geral da República, Rodrigo Janot, pelos crimes de peculato e formação de quadrilha, Azeredo renunciou na última quarta-feira, 19, ao mandato na Câmara. Os ministros do Supremo decidirão se o processo será transferido para a primeira instância da Justiça mineira ou se continua no Supremo. Janot pede de Azeredo seja condenado a 22 anos de prisão.
"Esta matéria é uma jurisprudência ainda em construção. Espero que, nesta questão de renúncia, se consiga padronizar uma posição geral. A discussão é precisamente saber até que momento é legítima a renúncia e a partir de qual momento deve ser tratada como manobra inaceitável", afirmou Barroso, depois de dar a aula inaugural para alunos de Direito da PUC-Rio.
Se for transferido para a Justiça comum, o processo pode se arrastar por anos e evitar o desgaste do PSDB em ano eleitoral. Os tucanos negam que a renúncia de Azeredo, ex-governador de Minas Gerais e ex-presidente do PSDB, seja uma manobra para tirar o caso do Supremo, onde a previsão é de julgamento este ano.
Dois casos semelhantes tiveram decisões opostas no STF. Em 2010, o Supremo entendeu que a renúncia do então deputado Natan Donadon (sem partido-RO) não o livrava do julgamento naquela corte e rejeitou o pedido de transferência para a primeira instância. Donadon foi condenado pelo STF por peculato e formação de quadrilha e cumpre pena da Penitenciária da Papuda, em Brasília.
Em 2007, o ex-governador e então deputado Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB), acusado de tentativa de homicídio qualificado contra o ex-governador da Paraíba Tarcísio Burity (PMDB), escapou do Supremo ao renunciar ao mandato poucos dias antes do julgamento. O processo foi transferido para a Justiça da Paraíba. Cunha Lima morreu em 2012 sem ser julgado.
"O julgamento de parlamentares é um fenômeno relativamente recente no Supremo, porque anteriormente tinha que haver licença da Casa Legislativa e normalmente a licença não vinha. Não há grande massa de precedente. Nos debates internos no Supremo há referências a não se reconhecer a renúncia após o início do julgamento, há manifestações de não se reconhecer a renúncia depois que o processo tenha sido pautado e há manifestações no sentido de não se reconhecer após o final da instrução (fase anterior ao julgamento). É sobre isso que estou refletindo", disse Barroso.
O relator reiterou a decisão de não anunciar a decisão sobre o futuro de Azeredo antes da conclusão do processo do mensalão do PT, que iniciou a fase de apreciação dos recursos contra condenações por formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Na aula inaugural, Barroso disse que tem "obsessão" pela reforma política. "Vivemos um momento de escassez da boa política. Essa é a marca da atualidade do Brasil. Precisamos romper a inércia, há necessidade urgente de reforma política. Vivemos hoje um descolamento entre a classe política e a população", afirmou o ministro, que, no Supremo, votou contra a possibilidade de doação de empresas a políticos nas campanhas eleitorais. "O dinheiro é o grande eleitor do Brasil", afirmou. "Se (uma empresa) apoia três ou quatro (candidatos), ou está sendo achacada ou visa vantagens futuras e indevidas".