Nefi Cordeiro: ministro tem 57 anos e poderia permanecer no tribunal por mais 18 anos até atingir a idade de aposentadoria compulsória, que ocorreria em 2038 (Agência Brasil/Reprodução)
Estadão Conteúdo
Publicado em 2 de março de 2021 às 17h26.
Última atualização em 2 de março de 2021 às 19h20.
O ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, anunciou nesta terça, 2, que solicitou a aposentadoria, surpreendendo os integrantes da Corte. O ministro que atua na Sexta Turma, responsável por processos criminais, avisou no início da sessão que já encaminhou o pedido ao presidente do tribunal, ministro Humberto Martins, e aguarda a oficialização do ato.
"Colegas, a vida nos leva a contínuos momentos de repensar. Refleti muito e decidi requerer a aposentadoria. Fiz o melhor que pude em 30 anos de magistratura", afirmou Cordeiro. "Sempre zerei processos e procurei concretizar justiça em cada feito a meu cargo. Se consegui, não sei, fiz o meu melhor".
Ao Estadão, Nefi Cordeiro afirmou que tomou a decisão 'após sucessivas intercorrências médicas e novos eventos'. "Repensei os caminhos", disse o ministro. Nefi Cordeiro tem 57 anos e poderia permanecer no tribunal por mais 18 anos até atingir a idade de aposentadoria compulsória, que ocorreria em 2038. O ministro fez recentemente uma cirurgia de hérnia.
A saída de Cordeiro abre a segunda vaga no STJ que poderá ser preenchida por indicados do presidente Jair Bolsonaro — desta vez, para uma turma criminal. O ministro ocupa a cota de indicações que vêm da Justiça Federal e assumiu o cargo em 2014. A primeira vaga — ainda não preenchida pelo Planalto — é a do ex-ministro Napoleão Nunes, que atuava na Primeira Turma, responsável por casos de Direito Público.
Cordeiro foi um dos votos do julgamento unânime da Sexta Turma do STJ que concedeu habeas corpus ao ex-presidente Michel Temer em 2019, preso no âmbito da Operação Descontaminação, desdobramento da Lava-Jato que atribuiu ao emedebista o papel de líder de organização criminosa que teria desviado pelo menos 1,8 bilhão de reais em 30 anos de atuação.
Na ocasião, Cordeiro afirmou que 'não se pode prender porque o crime é revoltante, como resposta a desejos sociais de justiça instantânea'.
"Manter solto durante o processo não é impunidade como socialmente pode parecer, mas sim garantia, só afastada mediante comprovados riscos legais", observou Cordeiro. "Juiz não enfrenta crimes, não é agente de segurança pública, não é controlador da moralidade social ou dos destinos da nação. Deve conduzir o processo pela lei e a Constituição, com imparcialidade e somente ao final do processo, sopesando as provas, reconhecer a culpa ou declarar a absolvição. Juiz não é símbolo de combate à criminalidade".
No mesmo ano, Nefi Cordeiro deu entrevista ao Estadão no qual defendeu maior controle sobre a utilização das delações premiadas, tanto por parte dos juízes — que homologam os acordos — quanto do Ministério Público e de delegados de polícia — que acertam a negociação com os delatores. "Como seres humanos, todos precisamos de limites e controles", afirmou. "Temos situações de benefícios exagerados, e outras em que foi negociada pena mais alta do que aquela pessoa teria se fosse condenada sem qualquer benefício. Isso é uma aberração", criticou na ocasião.
O ministro é autor do livro Colaboração premiada — Caracteres, limites e controles. Natural de Curitiba, Nefi Cordeiro é também professor universitário, mestre em direito público e doutor em direito das relações sociais pela Universidade Federal do Paraná. Antes do STJ, atuou como promotor de Justiça, juiz de direito e juiz e desembargador federal.
O anúncio da aposentadoria de Nefi Cordeiro surpreendeu os integrantes da Sexta Turma na sessão desta terça. O presidente do colegiado, ministro Antônio Saldanha, deixou escapar um "que isso?!" no momento que o colega avisou que deixaria o tribunal. Para ele, o colega era um 'companheiro tão positivo, tão elegante, com tanta leveza e humanidade'. "Um julgador em sua excelência", homenageou Saldanha.
O ministro Sebastião Reis afirmou que Nefi Cordeiro era 'uma voz serena, sensata'. "Eu, que especialmente vim ser juiz no tribunal, acho que só posso agradecê-lo. Agradecer esse tempo que dedicou ao tribunal, mas àquilo que nos ensinou, não apenas no jurídico mas também como um juiz deve se portar, como deve atuar", afirmou. "O ministro Nefi é um exemplo e não tenho dúvidas que ele fará muita falta à magistratura como um todo".
O ministro Rogerio Schietti Cruz disse que foi 'tomado pela surpresa' do anúncio da aposentadoria e que o colega era um 'exemplo de ser humano'. A ministra Laurita Vaz também homenageou o colega, afirmando que 'em todo o lugar que for, vai fazer sucesso'.
A ex-procuradora-geral da República Raquel Dodge, que acompanhava a sessão, também homenageou o ministro, relembrando que acompanhou sua posse no STJ em 2014. "Eu pude testemunhar como o senhor sempre se excedeu no propósito de realizar Justiça sempre com muita sensatez, muita firmeza, muita inteligência", elogiou.