Hospital no Rio de Janeiro: além da falta de respiradores, profissionais denunciam escassez de remédios (Alessandro Dahan/Getty Images)
Agência O Globo
Publicado em 4 de maio de 2020 às 21h11.
Última atualização em 4 de maio de 2020 às 21h12.
Não bastasse a falta de respiradores e profissionais para o funcionamento de leitos, pacientes de coronavírus também vêm sofrendo com a escassez de remédios essenciais para seus tratamentos. Recentemente, profissionais de saúde passaram a acusar a falta especialmente de sedativos e antibióticos usados para tratar e intubar as pessoas nos hospitais no Rio de Janeiro.
Após denúncias da falta de fentanil e medazolam — os dois principais sedativos utilizados nas intubações — no Hospital municipal Ronaldo Gazzolla, a prefeitura respondeu que vai abrir sindicância para investigar se mortes neste domingo na unidade tiveram relação com essa falta de medicamentos. Segundo relatos, o problema é em toda a rede pública.
Neste domingo, sete pessoas (inicialmente a equipe da unidade havia citado seis) faleceram no Hospital Ronaldo Gazzolla, diz o médico Alexandre Telles, presidente do Sindicato dos Médicos do Rio (Sinmed RJ). Ele afirma que chegou a ver uma evolução médica (parecer com atualizações do estado do paciente) com a informação de que não havia fentanil para ser usado.
A TV Globo teve acesso a uma troca de mensagens entre dois diretores da unidade em que um deles defendia o fechamento do serviço, no domingo, por causa da falta de medicações essenciais para o tratamento.
O outro respondeu: “Neste momento nosso Hospital Ronaldo Gazolla está sem Midazolam e sem Fentanil. Drogas imprescindíveis para a sedação de pacientes no CTI e que está em ventilação mecânica”, afirmou. Parte dos medicamentos havia sido transferido para o hospital de campanha do Riocentro, de acordo com as mensagens.
Assim como Telles, diversos profissionais das redes municipal, estadual e federal relatam a falta de medicamentos. Os principais são os sedativos fentanil e midazolam, além do antibiótico azitromicina, o antiviral tamiflu e o remédio para controlar pressão noradrenalina (nerepirefrina).
Todos esses são usados no tratamento para Covid-19. Um dos problemas é que esses sedativos não eram muito necessários nos atendimentos, mas a sua demanda explodiu com a pandemia, por causa da alta quantidade de pessoas intubadas diariamente.
— A falta de insumos e remédios na rede é comum, principalmente antibióticos. Mas, com o aumento da demanda por esses insumos, a crise se agravou — afirmou Telles, que reclama da falta de planejamento do poder público. — Um tempo precioso foi perdido, a pandemia já era anunciada desde novembro de 2019 na China e deveríamos ter nos planejado desde então. Agora é lutar contra o tempo e aumentar a compra.
Um outro médico da rede municipal, que pediu para não se identificar, afirmou que o fentanil é a maior escassez hoje. Por isso, em muitos casos ele respondeu que os pacientes acabam sendo intubados mesmo sem esse medicamento.
— O fentanil e o midazolam são usados juntos, mas a maioria dos pacientes agora está sendo sedada só com o midazolam. Isso é muito ruim, pacientes acabam acordando e não ficam em condições de transporte — respondeu o médico, que está atuando no hospital de campanha do Riocentro, e cita outros remédios em falta. -- atracur, azitromicina e tamiflu. Todos usados no tratamento de coronavírus. Noradrenalina e midazolam também estão em escassez, mas esses a prefeitura está repondo.
Para Alexandre Telles, é possível um paciente vir a óbito pela falta de fentonil.
— Intubar sem ele não é o desejado, porque essas intubações precisam ser rápidas e não ter ou fentonil ou midazolam, que são os principais usados, é muito prejudicial. Às vezes usam um composto chamado alfafentanil como substituto, mas não é a mesma coisa. É possível que não consiga intubar, porque o paciente fica brigando com o tubo, retirando como reflexo —- explicou o médico.
No Hospital municipal Souza Aguiar, a maior emergência do Rio, uma enfermeira disse que estão em falta azitromicina e atracurio, antibióticos usados para pacientes de coronavírus.
Em entrevista à TV Globo, o representante do gabinete da prefeitura e subsecretário de Saúde Alexandre Campos confirmou a escassez de medicamentos essenciais, mas negou que o estoque esteja zerado. Ele disse que uma sindicância será aberta para investigar as mortes no Ronaldo Gazzolla neste domingo.
— A dificuldade é geral, em todas as redes. Mas todos os dias, ainda que em quantidade pequena, recebemos os medicamentos. O sistema de saúde vai claudicar muitas vezes nessa crise, vai ter dia sem insumo, sem leito, sem EPI, mas a rede não vai colapsar porque vamos nos virar para fazer funcionar.