São Paulo - Para Renato Janine Ribeiro, professor de ética e filosofia política da USP, o apoio de Marina Silva (PSB) ao candidato à presidência Aécio Neves (PSDB) é incoerente e enfraquece o discurso da necessidade de uma terceira via na política brasileira, pautada há décadas pela polarização entre PT e PSDB.
Derrotada no primeiro turno, Marina declarou apoio ao tucano no último domingo. “Se ela quer ser uma terceira força política, a melhor coisa é ficar neutra”, afirmou Ribeiro em entrevista à EXAME.com.
O apoio ao tucano gerou desentendimentos internos na Rede Sustentabilidade, grupo político liderado por Marina. Nesta segunda-feira, sete lideranças da Rede em São Paulo deixaram suas atribuições na Executiva Estadual do partido.
Parte da Rede também coleta assinaturas em um manifesto que rejeita o apoio ao tucano, de acordo com o G1. Até a publicação da reportagem, o partido não havia confirmado a informação.
A inclinação da Rede em direção a Aécio, no entanto, ocorreu antes da declaração de apoio de Marina Silva. O partido se reuniu na última quinta-feira (9) e indicou a seus militantes voto branco, nulo ou em Aécio Neves para o segundo turno.
Na opinião do professor, é impossível saber que consequências esse apoio terá numa possível candidatura de Marina à presidência em 2018. Segundo Ribeiro, Marina pode tanto sair fortalecida, como ser relegada a um papel de referência moral.
Para ele, a situação da ex-candidata se assemelha à de Lula antes da eleição de 2002. “Essa referência moral era um pouco o que Lula estava se tornando antes de ser presidente. Muita gente achava besteira ele concorrer em 2002, e Marina se assemelha muito nisso.” Leia os principais trechos da entrevista:
EXAME.com - A posição de Marina Silva de apoiar Aécio é coerente?
Renato Janine Ribeiro - Não é coerente. Se ela quer ser uma terceira força política, a melhor coisa é ficar neutra. Se ela vai para um lado, perde a importância de haver uma terceira via. Quando você faz uma aliança, você se torna assessório. O problema é que, com isso, acaba-se voltando à dicotomia criticada por ela, estrategicamente falando.
No caso do conteúdo das propostas dos dois candidatos, a aliança também não faz sentido. Há hoje no país várias agendas simultâneas que são questões complexas. Na agenda econômica Marina está com Aécio. Boa parte da equipe dela é de economistas ex-tucanos, como Eduardo Giannetti e André Lara Resende. Com essa aliança, ela acabou priorizando a agenda econômica, mas esse não é único ponto em discussão.
O que esse apoio pode significar para o futuro político dela?
É difícil saber. Temos que ver que existe também o PSB. Esse partido tinha um líder que morreu, tanto que fez a coisa mais absurda que foi terceirizar a candidatura. Não estou dizendo que foi errado, não tinha outra possibilidade, mas foi estranho. Se Marina tivesse sido eleita, ela ficaria numa situação muito complicada. Ela seria um corpo estranho no partido e, ao mesmo tempo, líder. Agora, se ela for coerente, vai sair do partido.
O que isso pode significar para a Rede?
A Rede tem um problema parecido com o do PSB. Ela só tem uma líder, não tem substituição. Marina teve uma exposição notável, muita gente ficou simpática a ela. Aí ela subiu rapidamente, teve que assumir compromissos do Eduardo e depois veio toda essa turbulência de apoiar o Aécio. Isso cria divergências dentro da Rede.
Se existe um propósito coeso dentro da Rede, a decisão do partido tem que ser coesa. Falta integração entre eles, inclusive uma coisa democrática, de que eles dialoguem entre si. Com tudo isso, a marca da Rede ficou um tanto comprometida. Não muito, mas ficou. Há quatro anos, Marina foi a campeã moral da eleição. Hoje ela sai mais normalizada.
Ainda é possível falar em nova política?
A questão da velha politica surge quando ela decide apoiar um dos dois candidatos. Quatro meses atrás, ela disse que não subiria no palanque de Aécio. Marina não é pior que os outros. Mas ela colocou um patamar alto para si mesma, e isso gerou cobranças. Algo semelhante aconteceu com o PT, que também se colocava como consciência ética do país.
Como o senhor avalia o cenário para Marina em 2018?
Isso é imprevisível. O fato de ela colocar a questão do fim da reeleição para Aécio é um indício do que ela quer. Mas a gente não sabe o que está mudando na cabeça das pessoas. Não sabemos se as pessoas vão ver Marina como um grande referencial moral, que será levada à presidência nos braços do povo, ou se ela sairá totalmente desarticulada.
Muito dificilmente alguém consegue destruir totalmente um candidato. Nesse sentido, Marina continua. Mas não sei se continua como presidenciável viável ou como referência moral. Essa referência moral era um pouco o que Lula estava se tornando antes de ser presidente. Muita gente achava besteira ele concorrer em 2002, e Marina se assemelha muito nisso.
Mas Lula é melhor do que ela em muitos aspectos, ele tem mais carisma, por exemplo. Nesse sentido, é muito interessante ela comparar Aécio com Lula no episódio da carta dos compromissos. Na realidade não é Aécio que se assemelha com Lula, é ela que quer ser Lula, obviamente.
As exigências de Marina para Aécio envolviam reforma agrária, questão indígena, não redução da maioridade penal. Não seria mais fácil conseguir estais posições da candidata Dilma Rousseff (PT)?
Provavelmente, seria mais fácil conseguir da Dilma. Mas aí entra o ódio dela pela Dilma. Tem um lado de querer tirar o PT do governo e, no caso da Marina, tem um elemento de aversão profunda a sua colega de ministério. Nesse cenário, é mais fácil lidar com Aécio. O problema é que ele não se comprometeu objetivamente com quase nada.
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1. O importante é competir...
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1/21 (Vagner Campos/MSILVA Online)
São Paulo - E
Marina Silva acabou entrando na lista de derrotados do primeiro turno. Além dessa grande surpresa, outras viradas e resultados inesperados marcaram as vitórias e derrotas no primeiro dia de eleição. Veja a seguir quem foram os principais derrotados da noite:
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2. Marina Silva
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2/21 (Sergio Moraes/Reuters)
Marina Silva, quando entrou na disputa no lugar de
Eduardo Campos, parecia que seria a próxima presidente do País. Ela incorporou uma imagem quase santa. As pesquisas mostravam um empate com
Dilma no primeiro turno e uma vitória no segundo. Mas, alguns debates e muitos ataques do
PT depois, Marina despencou. Alguns dias atrás, Aécio Neves parecia estar delirando quando disse que tinha certeza de que iria para o segundo turno. Só parecia. Ela conseguiu pouco mais de 22 milhões de votos (21,3%).
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3. Rui Costa Pimenta
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3/21 (Divulgação/Facebook/Rui Costa Pimenta)
O candidato à presidência do PCO teve de se conformar com a lanterninha da corrida presidencial. Ele obteve pouco mais de 13 mil votos (0,01%).
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4. Alexandre Padilha
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4/21 (Paulo Pinto/Fotos Públicas)
O ex-ministro da Saúde se mostrou, aos olhos do PT, um candidato correto e firme para tirar o monopólio do
PSDB em São Paulo. Mas
Alexandre Padilha não teve um apoio forte da máquina governamental do PT na campanha - como era esperado - e nunca chegou perto de incomodar
Geraldo Alckimin na disputa. Acabou ficando em terceiro, com 18,22% dos votos.
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5. Paulo Skaf
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5/21 (Ayrton Vignola/Skaf 15/Divulgação)
O candidato do
PMDB ao governo de São Paulo também nunca chegou perto de Geraldo Alckmin na disputa. Ficou em segundo lugar com 21,53% dos votos - bem mais perto do terceiro colocado que do topo.
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6. Gleisi Hoffmann
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6/21 (Antonio Cruz/Agência Brasil)
A ex-ministra-chefe da Casa Civil deixou o cargo para se candidatar ao governo do
Paraná, mas não obteve sucesso. Ficou em terceiro lugar na votação, com 14,87% dos votos - e bem longe de Beto Richa, reeleito.
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7. Eduardo Suplicy
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7/21 (Fábio Teixeira/ EXAME.com)
Eduardo Suplicy vai sentir saudades de seus discursos e cantorias no Senado Federal. Desde 1991 no cargo, o candidato do PT perdeu a vaga para
José Serra. Suplicy ficou em segundo lugar, com 32,53% dos votos.
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8. Gilberto Kassab
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8/21 (José Cruz/ABr)
O ex-deputado federal e ex-prefeito de São Paulo não repetiu suas vitórias anteriores dessa vez. Candidato ao Senado do
PSD, partido do qual é presidente,
Kassab ficou apenas em terceiro, com 5,94% dos votos.
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9. Paulo Bauer
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9/21 (Diego Redel/Divulgação/Paulo Bauer)
Paulo Bauer (atualmente no PSDB) sempre sentiu o gosto da vitória em
Santa Catarina. Mas o ex-senador não obteve sucesso ao tentar impedir a reeleição do governador Raimundo Colombo. Com 29,9% dos votos, não conseguiu nem levar a disputa para o segundo turno.
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10. Roberto Requião
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10/21 (Valter Campanato/AGÊNCIA BRASIL)
Roberto Requião (PMDB) já obteve muitas vitórias nas urnas do Paraná: duas vezes como senador, três vezes como governador e também como deputado estadual. Mas, em 2014, teve de encarar a derrota: ficou em segundo lugar na disputa pelo governo do Paraná e ainda perdeu no primeiro turno. Obteve 27,65% dos votos.
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11. Anthony Garotinho
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11/21 (Bloomberg News)
O ex-governador do
Rio de Janeiro chegou a liderar as pesquisas para o governo, mas despencou em poucos dias. No fim, o candidato do PR ficou de fora do segundo turno, que será disputado entre Luiz Fernando Pezão e Marcelo Crivella. Obteve 19,73% dos votos.
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12. Pimenta da Veiga
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12/21 (Pedro Paiva/Agência de Notícias PSDB-MG)
Ex-deputado federal e ex-prefeito de
Belo Horizonte e uma das lideranças do PSDB, o candidato Pimenta da Veiga não correspondeu às expectativas e saiu derrotado das urnas na disputa pelo governo de
Minas Gerais. Conseguiu uma votação expressiva (41,89% dos votos, mais de 4 milhões), mas seu adversário Fernando Pimentel (PT) conseguiu mais da metade dos votos.
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13. Edison Lobão Filho
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13/21 (Wilson Dias/Abr)
O senador pelo
Maranhão não obteve sucesso ao tentar ser governador do estado. Foi derrotado ainda no primeiro turno, apesar de ter levado 33,69% dos votos.
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14. Agnelo Queiroz
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14/21 (Beto Oliveira/ Câmara dos Deputados)
Governador em exercício, do partido da posição e ainda em pleno
Distrito Federal. Nenhuma dessas vantagens (teoricamente) foi capaz de ajudar o candidato do PT Agnelo Queiroz. Ele não conseguiu se reeleger, ficando fora do segundo turno. Obteve apenas 20,07% dos votos.
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15. Cesar Maia
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15/21 (Márcio José Moraes/Divulgação)
O ex-prefeito do Rio de Janeiro não conseguiu derrotar o campeão da Copa de 94. O candidato do
DEM obteve apenas 20,51% dos votos e perdeu a vaga no Senado para
Romário.
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16. Yeda Crusius
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16/21 (JEFFERSON BERNARDES/Divulgação)
A ex-governadora do
Rio Grande do Sul conseguiu um resultado pífio em seu estado. Candidata do PSDB para ser deputada federal, obteve apenas 71.794 votos, 1,22% do total.
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17. Armando Monteiro
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17/21 (Pedro França/Agência Senado)
O senador por
Pernambuco não conseguiu se eleger governador. O candidato do PTB obteve menos da metade dos votos do seu adversário, Paulo Câmara - este eleito em primeiro turno.
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18. Cândido Vaccarezza
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18/21 (Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
Citado em um suposto esquema de corrupção envolvendo a
Petrobras, o deputado federal por São Paulo do PT não conseguiu se reeleger. Vaccarezza obteve apenas 50 mil votos, 0,24% do total.
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19. Heloísa Helena
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19/21 (Lailson Santos/VEJA)
A candidata do
PSOL ao Senado por Alagoas perdeu para um nome bem polêmico:
Fernando Collor. O ex-presidente-deposto foi reeleito. Helena obteve um bom resultado, 31,76%, mas não o suficiente.
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20. Angela Portela
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20/21 (Wikimedia Commons)
A senadora por
Roraima tinha a força do PT ao seu lado na disputa pelo governo do estado. Mas Portela perdeu ainda no primeiro turno para Chico Rodrigues, com 30,82%.
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21. Agora conheça os deputados mais atuantes
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21/21 (Pedro França/Agência Senado)