O ex-presidente Lula: ele já foi da aceitação à negação da existência do mensalão. E já foi acusado e inocentado de envolvimento no esquema inúmeras vezes (Ricardo Stuckert/Instituto Lula)
Da Redação
Publicado em 11 de dezembro de 2012 às 12h50.
São Paulo – Com o novo depoimento de Marcos Valério à Procuradoria Geral da República em setembro, revelado hoje pelo jornal O Estado de S. Paulo, volta a pergunta que todos têm feito desde a revelação do esquema do mensalão, em 2005: Lula sabia ou não sabia? E mais: participou ou não participou?
Há argumentos para todos os gostos, e testemunhos também. Veja abaixo os momentos em que Lula foi incluído ou excluído do “maior escândalo de corrupção da história”, nas palavras do Ministério Público.
1) Novo depoimento de Marcos Valério
Não é a primeira vez que Lula é colocado no centro do mensalão (veja abaixo). Mas é a primeira em que é acusado de maneira mais detalhada tendo papel de protagonista.
Em depoimento dado no dia 24 de setembro para obter os benefícios da delação premiada – o que não foi concedido – o empresário Marcos Valério fez algumas graves acusações ao Ministério Público, já depois de condenado a 40 anos de prisão pelo Supremo Tribunal Federal. Segundo o Estado de S. Paulo, foram as seguintes:
- Que Lula usou o mensalão para pagar despesas pessoais. Um desses repasses teria sido de 100 mil reais, pago a uma empresa de Freud Godoy, na época conhecido como “faz tudo" do ex-presidente. As tais “despesas pessoais”, no entanto, não são detalhadas.
- Que Lula teria dado autorização para o esquema de empréstimos fraudulentos que alimentou o mensalão. Depois de acertar os detalhes com José Dirceu e Delúbio Soares, no Palácio do Planalto, em 2003, Marcos Valério e a dupla subiram ao gabinete de Lula, que teria dado “ok” ao acordo.
- Que Lula teria atuado também para conseguir dinheiro da Portugal Telecom para o PT, uma das fontes de financiamento do mensalão. Ou seja, também Lula teria se reunido com o então presidente da empresa para que uma fornecedora da Portugal Telecom repassasse o dinheiro ao partido.
2) “Só não sobrou para o Lula porque eu, o Delúbio e o Zé não falamos”
Reportagem da revista Veja de setembro deste ano apontava que Marcos Valério queria ampliar o escopo de suas revelações.
“Só não sobrou para o Lula porque eu, o Delúbio e o Zé (Dirceu) não falamos”, disse à revista. Segundo a matéria, Lula teria se empenhado na coleta de dinheiro para o esquema, ponto que foi reforçado no novo depoimento ao Ministério Público.
Disse ainda que Dirceu era o braço direito de Lula. “Um braço que comandava”. E embora não tenha fornecido detalhes, foi claro: “Lula era o chefe”.
3) Roberto Jefferson e Lula
Os ministros do Supremo Tribunal Federal foram taxativos: sem o depoimento do então deputado Roberto Jefferson, é possível que não houvesse julgamento do mensalão.
Muito do que disse o então deputado federal do PTB foi depois confirmado pela investigação do Ministério Público e, agora, pelo Supremo.
Mas já a posição de Jefferson diante do envolvimento de Lula variou no período.
- Em 2005, ao dar a famosa entrevista à Folha de S. Paulo em que revelou o esquema de pagamento de propina a parlamentares, foi claro ao dizer que Lula não sabia do mensalão, embora tivesse sido avisado por ele no início daquele ano. Adotou até um tom heroico: “O presidente Lula chorou. Falou: "Não é possível isso". E chorou”, disse Jefferson, sobre o suposto dia em que contou tudo ao então presidente.
- Mas em agosto deste ano, o advogado Luiz Francisco Barbosa, que defende Jefferson perante o STF, foi bem taxativo ao dizer que Lula deveria ser incluído no processo. “Mas é um pateta. Tudo isso acontecendo nas suas barbas e nada”, disse o defensor.
- O mesmo advogado havia apresentado pedido de igual teor ao Supremo dois anos antes. Como não há advogado que dure ao lado de seu cliente adotando estratégia em que este não esteja de acordo, pode-se supor que Jefferson tenha mudado de ideia em relação à inocentar Lula de qualquer envolvimento com o mensalão.
- Hoje, no entanto, o ex-deputado saiu em defesa do ex-presidente Lula. "A história contada por Marcos Valério às procuradoras não me pareceu crível. Ele pode provar o que disse? Além do mais, delação premiada para salvar o próprio coro é coisa de canalha", postou em seu blog.
4) Marconi Perillo
É fato notório que o tucano Marconi Perillo e Lula não se bicam.
E a origem de tudo foi quando o governador de Goiás afirmou, logo após a eclosão do escândalo, em 2005, que já havia avisado Lula bem antes de Roberto Jefferson, ainda em 2004.
"O que foi revelado hoje pela Folha de S. Paulo foi dito por mim, pessoalmente, ao presidente da República um ano e meio atrás", disse Perillo em discurso a uma plateia de empresários.
Lula, que confirmou em depoimento ao STF ter recebido a informação de Roberto Jefferson, negou ter sido avisado por Perillo. Se foi, tal informação seria relevante, já que o esquema do mensalão funcionou durante o ano de 2004.
5) Lula por ele mesmo
Lula teve reações diversas em relação ao mensalão, embora sempre negando qualquer participação ou mesmo conhecimentodo esquema. Nestes sete anos, foi da aceitação à negação.
- Reconheceu o mensalão em 2005: primeiro, quando disse, no mês seguinte à denúncia de Jefferson, que “o que o PT fez do ponto de vista eleitoral é o que é feito no Brasil sistematicamente”; depois, ao pedir desculpas ao Brasil, dizendo-se traído. "Quero dizer a vocês, com toda franqueza, que me sinto traído. Eu não tenho vergonha nenhuma de dizer ao povo brasileiro que nós temos de pedir desculpas”, afirmou em transmissão nacional.
- O então presidente também reconheceu o esquema em 2006, em entrevista ao Fantástico. Disse que o "PT errou" e que se ele tivesse condições de saber, "não teria acontecido. No momento em que eu soube, as providências foram tomadas", defendeu.
- Mas em 2012, ano eleitoral, o ex-presidente mudou completamente de ideia, negando a existência do esquema confirmado posteriomente pelo STF. Chegou a dizer que o mensalão foi uma tentativa de golpe e, ao jornal The New York Times, que “nunca existiu”.
Resta saber agora se o Ministério Público vai dar continuidade às novas denúncias de Marcos Valério, cuja credibilidade não é das maiores entre os agentes diretamente envolvidos no processo. A visão de ministros do Supremo e do Procurador Geral da República, Roberto Gurgel, é de que se trata de um “jogador” cujas cartas têm de ser avaliadas com muita, muita cautela.
Atualizado às 13h45 para colocar comentário de Roberto Jefferson em seu blog.